Entrevista
Paulo Henriques Britto
Professor, poeta e tradutor fala sobre literatura e sua experiência como tradutor e docente
Quando fechamos esta edição da Continente, o mundo estava girando de modo inédito. Itália, Espanha, EUA, Alemanha, Brasil e nações mundo afora adotavam medidas que restringem a circulação de pessoas e impõem a todos os seus cidadãos isolamento social. Agora, precisamos ficar em casa para evitar a disseminação do coronavírus. Uma atitude empática, para que possamos proteger a todos.
Porém, o tema sobre o isolamento de pessoas já rondava nossa redação há alguns meses, quando definimos a pauta da reportagem de capa deste mês sobre o encarceramento em massa. As estatísticas sobre o sistema prisional brasileiro já eram muito alarmantes, antes da pandemia chegar. Somos a terceira população carcerária do mundo, com mais de 770 mil pessoas vivendo em condições desumanas em unidades prisionais superlotadas. Em menos de duas décadas, o número de detentos aumentou 232%. No caso do Brasil, esse contingente tem cor: a maioria dos encarcerados é negra, pobre e periférica.
Não por acaso, muitas das fontes ouvidas pela repórter especial Luciana Veras para compor a reportagem de capa desta edição usaram uma metáfora brutal: as prisões são a senzala contemporânea. Ou, ainda, os navios negreiros da atualidade, a transportar negros e negras para um inferno onde a ressocialização aparece menos como uma possibilidade concreta e mais como uma expressão esvaziada.
Por que, afinal, se prende tanto no nosso país? A partir das engrenagens de uma sociedade racista, machista e contraditória, vemos que as nossas desigualdades e nossos preconceitos alicerçam também a vida no cárcere, onde o Estado se exime de suas responsabilidades e a convivência segue um código de conduta de leis estabelecidas pelos próprios detentos.
Apesar da gravidade do assunto, longe de uma solução, nesta edição, trazemos também leveza para os dias difíceis que se anunciam. Na seção Depoimento, o jornalista, curador e artista visual Jurandy Valença faz um relato da sua convivência com a escritora Hilda Hilst, que faria 90 anos neste abril de 2020. Entre 1991 e 1994, ele morou com Hilda na Casa do Sol. No texto, Jurandy traz trechos do diário que escreveu durante o período, que pretende lançar ainda este ano.
Que nosso tempo de isolamento possa tornar-se de reflexão, sobre esses e tantos outros temas que nos açoitam. E que nos transformemos positivamente a partir dessa experiência.