Mas gosto também depende das circunstâncias (já, já li Ortega y Gasset: uma excelente vida de Velázquez, muito esclarecedora tanto da vida do pintor como dos rumos da pintura da Europa e logo do Ocidente, e um estudo sobre o amor, onde ele diz que a palavra “amor” foi tirada do etrusco e ninguém até hoje sabe o que significa). Maurício, casado com minha prima Jacira, filha da Maria José de que falo mais acima quando tratava de Garanhuns, nunca tinha gostado de farinha enquanto vivia aqui no Recife. Foi estudar nos Estados Unidos e depois de uns tempos ficou doido para comer farinha. Por falar em farinha, Toinho, pai de Ricardo marido de minha neta Emília, deve achar farinha uma das melhores coisas do mundo. E é. Nunca vou esquecer da farinha de paneiro, em Manaus, que trazia umas raspas de mandioca: misturada com o caldo do peixe cozido com muita água, “peixe na água grande”, como dizem no Ceará. Segundo Toinho, a melhor farinha do Brasil é a de Cruzeiro do Acre, de que ele tem fornecedor, e tem até me mandado. É perfeita, meio grossa, como prefiro, principalmente para botar num caldo na mesa, de peixe, de guisado de galinha, de cabidela, de pato no tucupi. Ou farofa matuta, ou de bolão, como também é chamada, para comer com o que você imaginar, charque, bacalhau assado na brasa. Bacalhau assado na brasa dizem que é bom com farinha mole, que comem nas casas de farinha, antes de a farinha estar completamente cozida. Mas nunca comi, embora insistisse, na casa de farinha de meu avô Pedro Taveira, mas ele não deixava porque, dizia, dava dor de barriga. E tem o capítulo à parte dos beijus, sendo um dos melhores o feito debaixo da farinha, jogando-se a farinha, enquanto cozinha, por cima dele. A mulher do escultor cearense do Crato Sérvulo Esmeraldo, Dôdôra, de Feijó, Acre, disse que todo dia vai um avião de Cruzeiro do Sul carregando farinha para Rio Branco. Aqui em Pernambuco há sempre algumas farinhas famosas, como as de Vitória de Santo Antão e Lajedo. Também designa sujeito que não presta: “farinha ruim” ou “farinha do mesmo saco”.
Ao começar esta croniquinha pensava em comentar as melhores coisas do mundo, ou ao menos citar um bocado delas. Mas mal deu para falar de quatro: água de coco, suspiro, mel de engenho e farinha. Pretendo voltar ao assunto.-----------------------------------------------------------------------------------
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