A história do casal superpoderoso é apresentada, sobretudo, pelo ponto de vista da personagem Wanda. Por conta disso, muito de sua bagagem cultural, interpretações e interesses participam ativamente de toda a trama. Isso não acontece por acaso, já que se relaciona à própria natureza da Feiticeira Escarlate, na qual a série é baseada. Entre seus vários poderes, um deles é justamente o de manipular e interferir na realidade ao seu redor e nas mentes dos outros. Constantemente, Wanda nos convida – ou talvez nos confunda – a questionar em torno de acontecimentos importantes na narrativa, a partir de sua visão de mundo. Por ela ser grande admiradora de sitcoms norte-americanos, em WandaVision, são inúmeras as alusões a programas do gênero que habitam a memória de gerações de telespectadores.
Outro ponto de destaque da série é a direção artística, que apresenta uma pesquisa detalhada a cada episódio. Nos primeiros disponibilizados, por exemplo, os anos 1950, 1960 e 1970, respectivamente, são reencenados de uma maneira bastante singular. As menções a essas décadas não se restringem a elementos da moda, penteados e cenários que marcaram as épocas, mas são trazidas enquanto agentes na trama, a partir de questões sociais e culturais que ascendiam em cada um dos momentos históricos revisitados. Em WandaVision, essas referências temporais recebem ora contornos de homenagem, ora aparecem pelos vieses da paródia e da crítica. Com certa frequência, o texto de Jac Schaeffer e a interpretação de Elizabeth Olsen despertam reflexões sobre os modos que as personagens femininas foram retratadas em diversas séries televisivas e na própria história da cinematografia hollywoodiana.
Dentre os sitcoms que serviram de referências para WandaVision, alguns são I love Lucy (1951), The Disck Van Dyke Show (1961), A Feiticeira (1964) – com direito à recriação da abertura em formato de desenho animado que marcou muitos telespectadores –, Jeannie é um gênio (1965) e Três é demais (1987). A atriz Julie Bowen, que interpretou Claire Dunphy, no seriado Modern family (2009), outra menção, chegou a declarar-se emocionada em suas redes sociais com a citação.
Para os que não costumam seguir as inúmeras sagas de super-heróis, WandaVision é um convite a perceber que eles talvez não sejam tão diferentes de nós, humanos, pois também têm seus conflitos e questões. Mas a nova série também consegue acessar memórias e sentimentos nostálgicos de programas que fizeram história na televisão. Após os nove episódios disponíveis de WandaVisison, quem quiser descobrir os desdobramentos da vida da protagonista terá que aguardar as próximas criações do universo da Marvel, cotadas para chegar no Disney +, ou somente quando elas puderem retornar às salas de cinema.
ERIKA MUNIZ é jornalista e bacharel em Letras.