Curtas

Permanência

Livro recém-lançado de Paulo Malta traz as dores de uma separação amorosa em formato contemporâneo

TEXTO Olívia Mindêlo

07 de Março de 2019

O sentimento da perda move 'Permanência'

O sentimento da perda move 'Permanência'

Foto Not too bad/Divulgação

[conteúdo na íntegra | ed. 219 | março de 2019]

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Os enredos dos relacionamentos malogrados seguem nutrindo a arte incansavelmente. A busca pela forma também se mostra igualmente incansável, de modo que o tema da separação se atualiza em modo looping, ganhando seus contornos particulares a cada criação. Falemos de literatura. Dias de abandono (Biblioteca Azul), de Elena Ferrante. E lá estamos nós diante de uma mulher, dois filhos e um cachorro, largados por um marido que agora tem uma amante. Nada de novo sob o sol da Itália, onde se passa o rompimento. Contudo, ao nos fazer viver aqueles dias sob a perspectiva das entranhas de quem sofre – no caso, uma mulher à beira do suicídio –, a autora nos mostra que a questão está na forma. É ela quem muda o tema. Muda completamente.

Com Permanência, livro lançado recentemente no Recife, Paulo Malta se insere no meio literário pelo mesmo mote, entendendo também que é pela consciência do processo criativo, pela forma, portanto, que sua história pode se tornar peculiar. Opta pela estrutura fragmentada de uma narrativa na qual personagens e tempos se confundem – como é do feitio do amor –, assim como o próprio “narrador”, uma voz que alterna em primeira e terceira pessoa, referindo-se a Eu, Ele, Ela, Ausência, Sossego, Demônio sem hierarquias. Eis um livro para ser lido em uma hora, e tudo flui sem muito assombro ou reflexão.

Embora mescle suas formas de narrar, Paulo Malta também pesa para o lado da subjetividade, do olhar de quem acorda num dia de domingo com uma ausência na cama. As horas de domingo se arrastam, minuto a minuto; “domingo é um sentimento”, parafraseia a amiga. “… Um dia tão vazio de sentido, que vira as costas para qualquer tipo de justificativa.” Assim como o amor, a separação também é idealizada e nutre-se de lembranças incessantes, geralmente permeadas por referências como pinot grigio, Coltrane, Mondrian. “Às vezes, a memória parece aquela visita que não sabe a hora de partir”, registra o autor em sua primeira página.

Mesmo sendo um estreante, Paulo Malta escreve desde os 20 anos, mas só agora, aos 38, resolveu publicar. É advogado e fez sua obra por conta própria, sem editora ou apoio de fomentos. Cuidadosa sua edição de 72 páginas, em papel pólen, com ilustrações aquareladas de Guilherme de Moraes. E, ao contrário de Ferrante, não sofremos com o livro.

OLÍVIA MINDÊLO, jornalista e editora da Continente online.

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