Estar submersa também é símbolo de uma dualidade. A linguagem é aberta e confessional, mas envolve, ao mesmo tempo, um jogo de memórias estilhaçadas: os poemas também incluem uma mistura com a ficção, oscilando o percurso da leitura entre momentos de escuta, quando conseguimos vislumbrar a fala pessoal da escritora, e de espaço para a identificação de quem lê. Assim, o texto confunde e revela. Sobre isso, ela pontua: “Eu sempre tive muita dificuldade de ser direta e achava que ia conseguir na literatura: aí foi que me enganei mesmo. Então, congelo a memória e coloco um verso do que tem que ser lido, e depois é como se estivesse enganando, passando tempo, brincando com o leitor”.
Essa disputa é também característica de referências da autora, como a carioca Ana Cristina Cesar, que desmontava e remontava cartas e diários, tensionando os fios entre o real e o imaginado. A poeta marginal encontrou na literatura um local onde “o ‘inconfessável’ toma forma”, o que deixou claro quando, em Inéditos e dispersos (2001), escreveu: “Só de não ditos ou de delicadezas se faz minha conversa, e (para não ficar louca e inteiramente solta neste pântano), marco para mim o limite da paixão”. O mecanismo desse desmonte é parte de Penitência, onde trecho é dedicado a Ana. Nele, lemos: “não virás para me mostrar o caminho/ já o deixaste por inteiro na perpetuação/ do avesso”.
Algo de Adelaide Ivánova, Marília Garcia e Ana Martins Marques também foi deixado em Teresa, tendo as autoras inspirado nela uma poética da transparência ao abandonar o hermetismo narrativo em suas próprias obras. “Na literatura escrita por mulheres, essa questão da identificação está tão ali, na cara, que parece que você está beijando o papel, ao mesmo tempo em que aquilo está fugindo também. Porque é uma simplicidade tão bonita, que se estranha”, diz Teresa. “É uma observação que eu estou tentando acompanhar, e, nos últimos anos, comecei a me atinar: preciso ler mulheres vivas!”.
O livro iniciado com a banda Labaredas menciona também Kurt Cobain, Hilda Hilst e Letrux, influências contemporâneas com algo de um misticismo nostálgico, presente nos limites sobre os quais se equilibra Penitência. Um jogo de lembranças, sustentado pelo medo que sente quem permanece na fronteira entre o mergulho e o aterramento, é traduzido no trecho: “tu sabes que nunca deverias ter ido/ agora atravessaste/ e não há bandeira a ser erguida/ (...) naufragamos antes”.
MARINA PINHEIRO é jornalista em formação pela UFPE e repórter estagiária da Continente.