Aureliano também discute a diversidade de gênero através de seus personagens, principalmente identidades LGBTQIAP+. Isto, com narrativas que superam clichês comuns a abordagens desse tipo de personagem, numa postura crítica em relação a preconceitos como homofobia e racismo. Madame Xanadu levanta, junto a essas questões, temáticas da vida comum, como amizade, luto e crise de identidade. Por conta da sua contemporaneidade, surgiu o convite para que compusesse o acervo da tradicional Editora Nacional, criada pelo hoje polêmico Monteiro Lobato. Assim, o relançamento de Madame Xanadu (2021) se insere na reestruturação da linha editorial da empresa, em celebração ao seu centenário em 2025, em que buscou trabalhar com novos autores, como forma de reparação mediante a obra de Lobato, alvo de críticas de racismo no contexto da sociedade brasileira atual.
CIDADE NATAL
O elemento geográfico é central em Madame Xanadu. Na primeira edição, Aureliano abordou de forma melancólica a cidade, ao não explorar Natal como cenário de seu romance e não trabalhar a afetividade que os espaços da capital potiguar são capazes de promover. Hoje, o autor compreende a importância de valorizar sua cidade, como nos momentos em que traz o Café Salão como cenário; cenário que deve ser utilizado na adaptação para o cinema, contribuindo com um sotaque local.
“É uma cidade com pouca memória. O livro e o filme não poderiam se passar em outro lugar senão aqui, pois me sinto na responsabilidade de criar lembranças da cidade, caso contrário, tudo acaba virando farmácia”, comenta o autor, referindo-se à especulação imobiliária que engole a cidade e apaga os espaços de convívio social, cultural e histórico.
Na transposição do texto para o cinema, Aureliano conta que será dado tratamento especial às referências ao tarô, sobretudo a partir das três cartas de arcanos maiores que Madame puxa em jogo no fim da narrativa. O longa-metragem será, assim, segmentado em três tempos: A Imperatriz, O Enforcado e A Estrela, que tratam do passado, do presente e do futuro da protagonista.
A cronologia fragmentada do livro, que flui entre o passado e o presente, deverá ser mantida no longa; ela brinca com a ordem dos acontecimentos, ao iniciar o romance com o fim da história, assim como acontece em filmes hollywoodianos como Garota interrompida (1999), forte inspiração de Aureliano.
Ainda, a personagem Madame Xanadu fará participação especial em Reinventando Denise, próximo livro de Aureliano, previsto para ser lançado em abril deste ano. Novamente situada na cidade de Natal, a narrativa aborda a volta da protagonista Denise à sua cidade de origem e a excessiva tentativa de reatar antigas relações, após cinco anos distante. Aureliano afirmou que Madame aparecerá de forma ainda mais fantasiosa nessa nova história e que, por meio de uma espécie de táxi lunar, levará os personagens a viajar no tempo.
MAYARA MOREIRA MELO é jornalista em formação pela Unicap e estagiária da Continente.