Curtas

Lianne La Havas

Cantora londrina interpreta o fim do amor em seu terceiro disco, que leva seu nome

TEXTO Taynã Olimpia

02 de Setembro de 2020

Terceiro disco da cantora londrina leva seu nome, Lianne La Havas

Terceiro disco da cantora londrina leva seu nome, Lianne La Havas

Foto HOLLIE FERNANDO/DIVULGAÇÃO

[conteúdo na íntegra | ed. 237 | setembro de 2020]

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(Please don’t make me cry, Lianne La Havas | leia ouvindo o disco aqui)

Uma montanha-russa de emoções. Talvez este seja o melhor clichê para descrever o término de um relacionamento. Com fraquejos e fortalecimento de autoestima, momentos de nostalgia, superação ou barganha por uma segunda chance... Em pequena ou larga escala, essa oscilação de humor ocorre. Sentimos aquele gosto agridoce da memória que continua a afetar o presente. A cantora londrina Lianne La Havas parece saber bem disso e decidiu abrir, não por acaso, seu terceiro álbum com a canção nomeada Bittersweet. O título da música dá o tom ao disco com 10 faixas, lançado em julho deste ano, em meio ao verão europeu.

, Lianne canta no refrão da faixa de abertura, funcionando quase como um mantra pessoal. O álbum, que recebe o nome da cantora e compositora, foi lançado após um intervalo de cinco anos sem novas produções. Esse período de maturação acabou por incorporar uma série de experiências e perdas vividas pela artista, passando não só pelo fim de um relacionamento de longa data, mas também experienciando a dor de dar adeus a familiares e ao seu mentor criativo, o cantor Prince, que faleceram em um curto intervalo de tempo.

Esse lançamento, cujas faixas foram produzidas por ela, é a reafirmação da sua essência criativa, um mergulho em memórias e sentimentos. “Este é o álbum que sinto mais verdadeiro à minha identidade”, disse, em entrevista ao jornal London Evening Standard, na época do pré-lançamento. O que acaba por atender aos pedidos do seu mentor que, antes de falecer em 2016, a incentivava sempre a criar “algo que a deixasse realmente orgulhosa”.

Não que seus primeiros álbuns, Is your love big enough? (2012) e Blood (2015), sejam menos relevantes que este. Muito pelo contrário, receberam aceitação positiva da crítica e do público, e reverberaram em muitos shows e festivais no mundo todo. A diferença no Lianne La Havas (2020) é o fato de estar menos preso às necessidades da gravadora (Warner), com maior liberdade criativa. A escolha da imagem de capa é representativa disso. Nela, a cantora aparece em uma foto em preto e branco, com sorriso largo e cabelos esvoaçantes, mostrando a leveza que está presente também em sua musicalidade.


Capa do disco. Imagem: Reprodução.

Com sua voz rouca, quase trêmula – ou como um murmúrio em alguns momentos, intercalada por pontos de potência vocal –, suas canções são dispostas no álbum de maneira a mimetizar os altos e baixos emocionais daqueles em processo de superar o fim de uma relação de amor. Essa estratégia está presente ao longo de todo o disco, mas fica mais perceptível na transição da faixa Seven times para Courage. Na primeira, ela canta, em ritmo animado, os versos , composição inspirada no grupo de R&B Destiny’s Child e no cantor brasileiro Milton Nascimento, trazendo a mescla de independência e empoderamento feminino com o groove da bossa nova e do samba. Já na faixa seguinte, adentra em momento autorreflexivo, mais sereno, em que pede por coragem para seguir adiante: .

Uma surpresa em Lianne La Havas (2020) é uma versão da música Weird fishes, da banda Radiohead, criada a partir das experimentações tocando o cover ao vivo nos palcos. O disco, de uma forma geral, foi gravado seguindo o modelo de tocar ao vivo no estúdio, como era comum nos anos 1970. E todas essas referências presentes – transitando entre rock, jazz, R&B, soul, folk e bossa nova – são uma das maneiras encontrada pela cantora, de ascendência jamaicana e grega, para deslegitimar a mídia, que tende a identificar seu estilo apenas como soul, usando como critério classificatório a cor da sua pele.

Algumas canções já receberam videoclipe e o destaque é para o da música Can’t fight, realizado com memes e cenas cotidianas de Lianne. A introdução é ilustrada pela montagem do seu rosto, com expressão séria, no corpo de um homem que caminha, de maneira determinada, em meio à multidão.

Essa cena age como síntese da mensagem do disco, que finaliza, estrategicamente, com a música Sour flower: , deixando um ar de esperança e autocuidado, como quem encara os problemas e segue em frente se respeitando. Lianne La Havas (2020) é uma colagem poética-sonora sobre a evolução pessoal e artística da musicista, que escolheu dar seu nome e rosto ao novo álbum.

TAYNÃ OLIMPIA é jornalista em formação pela UFPE e estagiária da Continente.

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