Curtas

Cine PE 2022

Em sua 26ª edição, festival resgata vários Brasis

TEXTO Laura Machado

01 de Dezembro de 2022

Mostra competitiva acontece, em parte, no Cine São Luiz

Mostra competitiva acontece, em parte, no Cine São Luiz

Foto Felipe Souto Maior/Divulgação

[conteúdo na íntegra | ed. 264 | dezembro de 2022]

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Entre os dias 9 e 14 de dezembro as portas douradas do cinema São Luiz, no Recife, se abrirão para recepcionar a 26ª edição do Cine PE – Festival do Audiovisual. Com um total de seis longas e 18 curtas, selecionados entre os mais de 730 inscritos, os filmes concorrem nas mostras de longas-metragens, curtas-metragens pernambucanos e curtas-metragens nacionais. Realizado com aporte financeiro público, via Prefeitura do Recife e Governo de Pernambuco, e privado, o festival conta com patrocínio master da Companhia Editora de Pernambuco – Cepe.

Nesta edição, as obras selecionadas que concorrem ao Troféu Calunga buscam, de maneira geral, olhar para dentro do Brasil atual, suas conjunturas e vivências diversas, apresentando-se como filmes atentos à realidade. A curadoria do festival é da jornalista e crítica de cinema Nayara Renaud e do crítico e programador do circuito Cine Materna Edu Fernandes, que destaca a pertinência dos filmes escolhidos.

“Vale a pena a gente entender que país nós temos e olhar para ele em sua totalidade. Trazemos resgates históricos, olhares de cantos mais profundos e acho que temos muitos debates com a realidade dos últimos anos. Temos também algumas coisas que vão além, mas que não deixam de estar conectadas com o que temos vivido”, comenta Edu.

Segundo ele, os filmes exibidos no Festival sempre possuem a característica de refletirem aspectos da realidade, como ocorreu em 2018, por exemplo. Naquele ano, o crítico explica que reviu o voto do atual presidente no processo de impeachment de Dilma Rousseff “várias vezes, porque muitos filmes usaram essa cena para marcar um momento histórico”.

Assim, em sua mais nova edição, o mergulho na atualidade e o cuidado em tratar temas pertinentes à sociedade não seriam diferentes. “A seleção acentua como diversos cineastas brasileiros têm traduzido o nosso país de forma poética e como, em conjunto, essas produções revelam questões que precisam ser discutidas mais a fundo. Dentro desse processo natural da curadoria ficamos muito felizes, por exemplo, em como os longas-metragens que estávamos selecionando voltam o seu olhar para o interior, ou melhor, para os vários interiores que habitam o país, sem perder de vista debates que são nacionais e internacionais”, explica Nayara Renaud.

Ela afirmou que, através desse tipo de relação, o Cine PE segue como um fomentador da diversidade da produção cinematográfica brasileira, além de trazer para as telas o olhar aguçado, ao observar os diversos “Brasis” que cabem em um só.

“Acredito que exista em todos os filmes, em menor ou maior grau, um sentimento de libertação pela via poética que o cinema lhes fornece, que alivia a sensação de “algo que estava preso na garganta” há séculos. São sentimentos, histórias, existências e sonhos que parecem guardados ou escondidos há muito tempo e que encontram diversas maneiras de ganharem vida ou sobrevida através da tela. O público pode esperar ver filmes que se conectam com a nossa realidade, em toda a sua diversidade regional e cultural, para se emocionar, rir, se revoltar ou se alegrar, enquanto reflete o seu próprio cotidiano, o Brasil e o mundo nos dias de hoje”, completou Nayara.


A vida secreta de Delly, de Marlom Meirelles, abre o festival. Foto: Divulgação

Diante da busca pela pluralidade de realidades brasileiras, a obra cinematográfica que abre o Festival é o documentário em curta-metragem A vida secreta de Delly, do cineasta pernambucano Marlom Meirelles. Seu filme conta a história de Edelfan Batista, presidente da Associação de Catadores de Materiais Recicláveis em Cabo de Santo Agostinho, e a sua jornada, até então nunca contada. Lidando com a situação de subalternização e com a descoberta de sua sexualidade, Edelfan passa a ser Delly e se dedica ao trabalho como catadora de materiais recicláveis em uma luta para fazer sua voz, representante de toda uma classe, ser ouvida.

De acordo com Marlom, produzir cinema no Brasil é uma representação de resistência. Para ele, “há histórias que precisam ser contadas. Quando um documentarista se depara com um relato tão profundo e impactante como encontrei em A vida secreta de Delly, existe uma necessidade de se registrar essa história por duas razões: para dar uma plataforma a alguém que historicamente viveu muitos processos de violências e silenciamentos, e por outro, para sensibilizar o público através de seu relato”. Sensível, a necessidade de olhar para os ignorados ainda se faz latente e, com o trabalho de Marlom, a força da resistência frente aos preconceitos e violências é acentuado.

Ainda no dia de abertura, o documentário de 1975 Leila para sempre Diniz será exibido como forma de homenagear o cineasta Sérgio Rezende e, dando início à Mostra de Longas-Metragens, o filme Vermelho Monet, de Halder Gomes, também terá sua exibição no histórico cinema.

Entre os filmes que concorrem na categoria de Longa-Metragem, um deles é Casa Izabel, do diretor Gil Baroni. Com temática LGBTQIA+, o filme busca naturalizar a presença das pessoas que fazem parte dessa comunidade nas produções culturais. Na trama, que se desenrola nos anos 1970, durante a ditadura militar no país, um retiro de crossdressers instala-se em uma casa antiga com histórico escravocrata.

“É cada vez mais importante a gente trazer esses personagens e provocar um pouco a estrutura heteronormativa, sexista, machista, branca, eurocentrada. Essas histórias que afrontam as estruturas de poder e opressão precisam ser contadas”, afirma Gil.


Vermelho Monet (acima) e Fantasma neon estão na programação do festival.
Imagens: Divulgação

Entre as premiações, os competidores da Mostra Competitiva de Longas-Metragens concorrem a melhor filme, direção, roteiro, fotografia, montagem, edição de som, trilha sonora, direção de arte, ator coadjuvante, atriz coadjuvante, atriz e ator, enquanto as obras das Mostras Competitivas de Curtas-Metragens Nacionais e Pernambucanos concorrem a melhor filme, direção, roteiro, fotografia, montagem, edição de som, trilha sonora, direção de arte, ator e atriz. A premiação de 2022 conta também com o Prêmio Canal Brasil de Curtas, que escolhe um dos filmes exibidos nas mostras, através de um júri de jornalistas e críticos de cinema, para ser o ganhador do prêmio, que também oferece R$ 15 mil ao vencedor.

Há 25 anos atuando como difusor da cultura audiovisual brasileira, o Cine PE – Festival do Audiovisual também visa fomentar a indústria do cinema. Neste sentido, oferece o Cine PE Seminários, encontros abertos ao público que visam à qualificação do debate pela discussão de temas referentes ao momento atual do Brasil.

LAURA MACHADO, estudante de Jornalismo e estagiária da Continente.

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