Curtas

Chromatica

Em 2020, a cantora, compositora e 'performer' Lady Gaga está de disco novo

TEXTO Erika Muniz

03 de Agosto de 2020

Imagem do videoclipe 'Stupid love', com o qual Lady Gaga lançou seu novo álbum, 'Chromatica'

Imagem do videoclipe 'Stupid love', com o qual Lady Gaga lançou seu novo álbum, 'Chromatica'

Imagem Reprodução

[conteúdo na íntegra | ed. 236 | agosto de 2020]

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The world rots in conflicts.
Many tribes battle for dominance.
While the Spiritual ones pray and sleep for peace,
the Kindness punks fights for Chromatica
(Chromatica, de Lady Gaga | leia ouvindo o disco aqui)

Num cenário desértico, conhecido de filmes sci-fi, uma heroína cyberpunk e seus seguidores vão em busca dos guardiões das cores e sons que existem no planeta. Ela, cujo poder é o amor – representado pela cor rosa –, precisa intervir quando, à medida que esses diferentes elementos vão se fundindo, surgem os conflitos. O caminho utilizado para essa união é a música, pois todos compartilham de um objetivo comum, que é gerar movimento e dança. Assim, uma sequência cromática nasce. Essa é uma síntese do videoclipe Stupid love, primeiro single que integra o mais novo trabalho da cantora Lady Gaga. Divulgado meses antes das outras 15 faixas, foi através dele que o público pôde experimentar o que viria a seguir em Chromatica (2020), seu sexto álbum de estúdio.

Lady Gaga deu início às gravações de Chromatica, com produção musical assinada por Bloodpop e equipe de peso, pouco após o lançamento de Joanne (2016), o anterior, e a produção do filme Nasce uma estrela (2018), dirigido por Bradley Cooper, que lhe rendeu um Oscar na categoria Melhor Canção Original, pelo sucesso de Shallow. Diante da pandemia do novo coronavírus, o lançamento do álbum, que estava previsto para o início do ano, foi adiado. No mês de abril, Gaga se juntou à Organização Mundial da Saúde (OMS) para organizar a One world: together at home, uma live gigantesca com artistas de diversos países para arrecadar fins e enviar mensagens positivas ao público e aos profissionais na linha de frente da crise.

Em um momento como este, no qual muitos estão em suas casas, há meses, a chegada de Chromatica às plataformas digitais e playlists pelo mundo parece ser um convite a, através dos fones de ouvido ou caixinhas de som, imaginar o calor que as pistas de dança nos oferecem. Não é de hoje que a música eletrônica e a dancefloor são esses lugares de compartilhamento e suspensão, enquanto as luzes néon e os hits estão rolando. Por enquanto, porém, dançar ao som das faixas Alice, Free woman, Stupid love ou Rain on me, com participação de Ariana Grande, só é possível – e seguro – no aconchego dos lares mesmo.

Neste novo trabalho, Lady Gaga retorna ao eletropop, house e disco music, bases musicais que, junto à sua atitude transgressora, têm encantando sua legião de fãs pelo mundo, conhecidos como little monsters. Já nos primeiros álbuns, The fame (2008), The fame Monster (2009), Born this way (2011), com sucessos como Just dance, Paparazzi, Judas, Bad romance e Telephone, além do Artpop (2013), a Mother Monster foi se consolidando como uma das grandes compositoras do pop. Desde o início, sua performance ficou conhecida, inclusive, por tensionar os arquétipos que costumam ser associados às estrelas da indústria da música e as fórmulas de que o gênero musical se vale ao longo das décadas.


Capa do disco Chromatica (2020). Imagem: Reprodução.

Em 2014, por uma necessidade de experimentar outros caminhos sonoros e estéticos – sendo essa postura inventiva constante em sua trajetória artística –, Stefani Germanotta (nome de batismo de Lady Gaga) arriscou mergulhar pelo jazz, lançando Cheek to cheek (2014) em parceria com o músico Tony Bennett. No seguinte, Joanne (2016), foi a vez de trazer mais da cultura country e explorá-la a partir de temáticas recorrentes em sua obra: as desilusões amorosas, a música como alternativa de refúgio diante das dificuldades e as memórias familiares. Isso, sem exatamente abandonar a relação com a cultura pop, que é a matéria-prima de todos os seus trabalhos.

Cada vez mais, as produções musicais têm considerado a importância do audiovisual nos lançamentos. No caso de Chromatica, essa característica circunscreve não apenas o conceito criado por Lady Gaga e sua equipe, mas também é uma espécie de narrativa paralela às faixas. Para citar alguns trabalhos importantes que também valorizam as potências que os signos audiovisuais trazem, alguns exemplos são: The wall (1979), do Pink Floyd; Discovery (2001), do Daft Punk; Lemonade (2016), de Beyoncé; no Brasil, o rapper Baco Exu do Blues, com seu premiado Bluesman, e a carioca Letrux, com os clipes de Em noite de climão (2017) e Aos prantos (2020). À medida que os vídeos vão sendo disponibilizados, entre intervalos de semanas ou meses, novas camadas vão sendo acrescidas ao mosaico referencial que os discos trazem.

Composto por três interlúdios que remetem às sinfonias das trilhas sonoras de ficção científica, Chromatica tem uma cronologia bem-definida. No entanto, as faixas também funcionam de maneira singular. A partir da abertura, intitulada Chromatica I, e seguida pela canção Alice, a primeira referência já se apresenta imediata: a obra literária de Lewis Carrol, Alice no País das Maravilhas (1865). Daí por diante, quando se aperta o play, o prisma que o álbum apresenta incorpora novas sonoridades, cores, contornos e sensações.

ERIKA MUNIZ é jornalista e tem graduação em Letras.

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