Curtas

Camarão na Alemanha

Selo alemão Analog Africa se interessasse pela obra do mestre sanfoneiro para a coletânea 'The imaginary soundtrack to a Brazilian western movie', lançada este ano

TEXTO Erika Muniz

05 de Março de 2018

Mestre Camarão em foto trabalhada pelo selo Analog Africa

Mestre Camarão em foto trabalhada pelo selo Analog Africa

Foto Rostand Costa/Divulgação

[conteúdo na íntegra | ed. 207 | março 2018]

No documentário Milagres de Santa Luzia, do cineasta Sérgio Roizenblit, cuja narrativa apresenta um mergulho em histórias de diversos sanfoneiros brasileiros, o saudoso Mestre Dominguinhos declara, com a afetividade e admiração que lhe eram características: “Um velho amigo de muitos e muitos anos, Camarão tinha uma banda que já tocava em ritmo de baião e forró músicas dos Beatles e um bocado de coisa que esse povo pensa que está inovando hoje em dia”. Não por menos, Reginaldo Alves Ferreira, o Mestre Camarão, foi considerado Patrimônio Vivo até 2015, quando faleceu. Toda a importância de suas criações para a música brasileira, principalmente em se tratando de forró, fez com que o selo alemão Analog Africa se interessasse pela obra do artista para a coletânea The imaginary soundtrack to a Brazilian western movie, lançada este ano.

Nascido no município de Brejo da Madre de Deus, mais precisamente na região de Fazenda Velha, Reginaldo, filho de Antônio, que era sanfoneiro, começou sua trajetória com a sanfona de oito baixos ainda criança, pois aos sete anos já tocava. “Era tradição entre os agricultores festejar, uma coisa bem interiorana mesmo. Meu avô e bisavô eram muito envolvidos com as questões agrícolas e comemoravam tocando nas festas e nos sambas. Meu pai foi criado no meio de sanfonas, violeiros e repentistas e tinha uma ligação forte com o instrumento dele”, afirma o professor, historiador e músico Salatiel D’ Camarão, filho do Mestre. Mais tarde, na década de 1960, foi para Caruaru integrar a banda como sanfoneiro da Rádio Difusora de Caruaru, onde conheceu com Luiz Gonzaga, Sivuca e Onildo Almeida.

-------------------
EXTRA:

-------------------

Responsável pela curadoria do selo Analog Africa, o DJ e pesquisador tunisiano-alemão Samy Ben Redjev começou a enveredar pelo mercado da música como um hobby ainda nos anos 1990, quando trabalhava no Senegal e conheceu diferentes instrumentistas e ritmos do continente que até então pouco circulavam na Europa. “À medida que eu tinha férias, viajei para outros países e pensei que seria uma boa ideia abrir um selo para mostrar essa diversidade. Comecei a trabalhar no projeto em 2001. O primeiro disco foi em 2006, de um grupo do Zimbábue que se chama The Green Arrows”, explicou Ben Redjev.

Em 2013, convidado para discotecar no Brasil, aproveitou a oportunidade para visitar o estado do Pará, onde pesquisou carimbó, siriá, lundum, e depois viajou para o Recife, onde já se apresentou no palco do Rec-beat. “Meu projeto com Mestre Camarão começou em 2013, quando um amigo, chamado Carlos Javier, fez uma grande entrevista com ele para ver se haveria a possibilidade de sair um disco. Foi assim que começou essa história”, explica.

Com acesso a quase todos os discos do Mestre Camarão, fez uma seleção de 30 músicas para escolher as 16 que compunham o repertório dos CDs e vinis, entre elas as versões de Retrato de um forró, composição de Luiz Gonzaga e Luiz Ramalho, Você passa, eu acho graça, de Ataulfo Alves e Carlos Imperial, e Canto da sereia, que já foi sucesso pelo grupo Orquestra Contemporânea de Olinda no álbum homônimo, lançado em 2008.

O responsável por apresentar a música aos outros componentes da OCO foi o percussionista Gilú Amaral. “Sempre ouvi muito forró e ele é um ícone, quem é forrozeiro o conhece. O disco dele com Canto da sereia conheci através de um amigo que era colecionador. Achei supermoderno, ainda acho. Uma coisa diferente. Logo quando apareceu a Orquestra, pensei em colocar no repertório. Inclusive, gravamos mais de uma música, teve também Não interessa não”, explica Gilú, que, por volta de 2005, chegou a trabalhar com Camarão em um projeto da Prefeitura do Recife nas escolas públicas. Na ocasião, durante dois anos, ele fazia a mediação entre o Mestre e os alunos.

Os interessados na versão digital, CD ou vinil da coletânea, podem adquiri-la através da plataforma BandCamp do selo Analog Africa no endereço analogafrica.bandcamp.com.

veja também

Pernambuco Meu País inicia em Taquaritinga

Maracatu rural viaja a Portugal

Duda Rios: Um artista de multipotencialidades