Amor e esperança marcam disco da Diablo Angel
A banda pernambucana lançou seu terceiro trabalho nas plataformas digitais, com distribuição do selo recifense Estelita
TEXTO AD Luna
11 de Setembro de 2023
A banda Diablo Angel
Foto KAMILA ATAÍDE/DIVULGAÇÃO
[conteúdo na íntegra | ed. 273 | setembro de 2023]
Durante os piores meses da pandemia da Covid-19, a arte serviu como refúgio e conforto para muita gente. Livros que dormiam empoeirados foram finalmente lidos, o desejo (e a necessidade) de se desligar do mundo resultou em maratonas de apreciação de filmes e séries, quem mal sabia cozinhar uma macaxeira acabou desenvolvendo valiosos dotes gastronômicos. Do outro lado do balcão, onde estão aqueles que produzem arte, novas ideias e criações surgiram ou ganharam impulso, culminando em novas obras.
A banda pernambucana Diablo Angel foi mais uma que vivenciou esse roteiro no período do isolamento social e recentemente, em agosto passado, lançou seu terceiro trabalho nas plataformas digitais, com distribuição do selo recifense Estelita. O álbum O que te dá prazer parece mesmo um recorte da realidade, transformado em uma história permeada por anseios de tempos auspiciosos. Na verdade, ele começou a ser idealizado em 2019, gerado durante os dias da peste e trazido ao mundo neste início de segundo semestre de 2023.
Mais do que um disco, é um “filme sonoro” a ser apreciado do início ao fim, da primeira à última canção, na ordem delineada pelo grupo, para que a criatura humana consiga vivenciar plenamente a experiência estética. “O disco começa, eu abro a porta, convido o ouvinte a entrar naquele universo. Depois digo que teremos mais um dia de sol. A inspiração é o amor pelas pessoas, o amor pela vida, a esperança”, descreve Kira Aderne, vocalista, guitarrista e principal compositora da Diablo.
“Em The sun is shining on me, que é a única música em inglês do disco, o sol está brilhando em mim, eu me sinto bem, o sol está batendo em mim, só em te ver, eu me sinto tão feliz. Ela fala de amor, dessa coisa tão bonita, que eu acho que é o que dá esperança pra gente”, discorre Kira, sempre com um sorriso também solar no rosto. A obra teve a colaboração de Vini Space, guitarrista do Mundo Bita.
O que te dá prazer é isto: um disco solar, porém denso, permeado por uma competente produção desenvolvida por P3dr0 Diniz, também atual e, logo em breve, ex-baixista da Mundo Livre S/A - pois está de mudança para os Estados Unidos. A mixagem ficou a cargo de Mathias Severien, do Estúdio Pólvora, e a masterização com Léo D, outro integrante da MLSA, com a qual toca teclados.
Todos os instrumentos estão muito bem timbrados, altos e nítidos. A gravação da bateria de Vitor Lima foge de uma tendência horrível - a qual, graças a Odin, parece já estar morrendo -, que é a de deixar o instrumento abafado, sem peso, muito atrás, com sons magros de tambores e pratos. Nívea Maria (teclados) e Tárcio Luna (guitarra) também se destacam na execução e bom gosto nas escolhas de texturas sonoras dos seus instrumentos. “Compus todas as nove músicas, sozinha, com minha guitarra ou com o sintetizador. Mas o trabalho coletivo, pra mim, é o que engrandece”, enfatiza Kira.
O álbum O que te dá prazer, da Diablo Angel.
Imagem: Divulgação
P3dr0 Diniz gravou alguns baixos no disco. Ele também foi responsável por introduzir bases eletrônicas e programações em faixas do álbum. “Houve músicas que foram transformadas completamente, elas eram de um jeito e foram para outro caminho”, conta a vocalista da Diablo Angel. Em casos como esse, nos quais o produtor ousa reconstruir composições alheias, há quem se sinta incomodado. Algo que não a acometeu: “De maneira nenhuma, até porque, se o objetivo final é transformar o trabalho, que ele fique o melhor possível. Não tenho vaidade nenhuma mesmo”.
O prazer ao qual o título do disco alude é, principalmente, o feminino. Aderne explica que quis abordar esse tema no álbum porque, para ela, a satisfação sexual da mulher ainda é colocado em segundo plano pela sociedade. Essa temática abre o álbum em Placere, com participação de Ju Orange, na qual há o sugestivo verso “abro a porta, te deixo entrar”. Algumas fotos de divulgação do novo álbum, produzidas por Kamila Ataíde, reforçam essa atenção à feminilidade ao apresentar Kira e Nívea juntas.
A dança também é outro prazer da líder da Diablo, uma faceta dela que muita gente desconhecia e revelada justamente durante a pandemia, quando Kira se apresentava executando movimentos corporais. Um desses passos, registrados por Tárcio Luna, também companheiro de vida da artista, tornou-se a linda capa de O que te dá prazer. A beleza da foto ganhará nova dimensão já que o álbum também será lançado, até o fim deste ano, em vinil.
Este é o mais pop e bem acabado disco do agora quarteto de rock indie pernambucano. Com Fuzzled Mind, de 2016 e todo cantado em inglês, a banda pernambucana passou por sete capitais do Nordeste. Em 2019, saiu Futuro, com o qual Kira passou a registrar mais canções compostas em português.
Além do sotaque caruaruense da cantora, outros elementos nordestinos estão presentes em O que te dá prazer. Lançado no dia 06 de março, coincidindo com a Data Magna de Pernambuco, o single A espera é uma celebração à terra dos altos coqueiros expressa em versos como: “Minha Pernambuco/ Me leve nos braços/ Me dá um abraço/ Me faz cafuné/ Minha Caruaru/ Cidade tão linda/ De gente querida/ Do meu coração”.
A vida chega mais tarde, faixa que encerra o trabalho, traz uma homenagem familiar. “Ela é muito especial para mim, pois tem participação do meu avô José Leite, de São José do Egito (cidade do interior de Pernambuco). Eu cresci ouvindo os cordéis que declamava. Ao fim da música, ele declama um cordel de Leandro Gomes de Barros. E, assim, o disco que começa mais moderno, eletrônico, termina abraçando nossas raízes”, orgulha-se Kira Aderne.
AD LUNA, jornalista.