A expansão do mercado editorial não se dá apenas com a abertura de novas livrarias – e várias abriram, incluindo as megalojas, notadamente em shopping centers, desde o ano 2000, no país. O impacto do consumo virtual também se vê na venda de livros, especialmente nas cidades de médio porte do interior, como Caruaru, Garanhuns, Petrolina, de acordo com o escritor e gestor público em cultura Wellington de Melo. “Levando-se em conta que, no interior, existem pouquíssimas livrarias, a internet se tornou o principal meio de adquirir títulos usados ou novos”, aponta Wellington.
Ainda no panorama do mercado virtual, o autor de Estrangeiro no labirinto acredita na tendência de maior consumo de livros digitais, que ainda representam uma parcela ínfima do mercado. “Isso depende da democratização e barateamento dos aparelhos leitores, da melhora das tecnologias e da ampliação dos acervos. Uma das barreiras, creio, também é o custo dos livros digitais. Embora sejam mais baratos que os de papel, o valor é muito alto para uma mídia que se reproduz infinitamente e cujos custos de produção e distribuição são irrisórios. As editoras precisam rever suas margens de lucros para que o e-book venha a deslanchar o mercado.”
Além disso, a chegada da Amazon, para vender livros de papel, também deve mudar o cenário no Brasil. “Mas não sei se para melhor. A forma predatória com que agem tende a sufocar as pequenas livrarias e mesmo as redes maiores. É uma tática usada por eles para esmagar a concorrência e poder garantir um monopólio posterior”, critica Wellington de Melo, que também é editor. “O consumidor pensa ganhar, mas, a médio prazo, pode se tornar refém da multinacional, que praticará seus preços sem concorrência, além da repercussão que isso trará para a geração de empregos locais”, pondera.
A pesquisa de Produção e Venda do Setor Editorial, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), encomendada pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) e pelo Sindicato Nacional de Editores (SNEL), revelou que o faturamento das editoras foi de R$ 5,36 bilhões em 2013, valor nominalmente 7,52% acima do obtido em 2012 – se considerada a inflação, o aumento real foi de 1,5%. O número total de exemplares comercializados foi de 479 milhões, com alta de 4,1%, levando em conta apenas o mercado, e mais de 20%, se computadas as aquisições de governo. O curioso é que a quantidade total de exemplares produzidos no país teve uma queda de 3,5%, de 485 milhões para 467 milhões de livros. Embora tenham sofrido uma variação positiva de 225% de um ano para o outro, as vendas de livros eletrônicos ainda são mínimas para os negócios do setor, com pouco mais de R$ 12 milhões de faturamento.
O aquecimento do mercado, no entanto, parece se reduzir a um limitado contingente de leitores. Segundo a pesquisa Públicos de Cultura, quase 60% dos entrevistados não haviam lido nenhum livro em seis meses. E, entre aqueles que leram, a média de leitura mal passou de um livro no período.
O consultor de políticas públicas para o livro e a leitura Felipe José Lindoso contesta o tom efusivo de editores e livreiros. “O crescimento da indústria editorial não acompanha o crescimento demográfico. O faturamento sequer nivela-se aos parcos índices de crescimento do PIB, descontada a inflação (sem falar que as medições são altamente duvidosas). Além disso, o peso das compras governamentais – que, sem dúvida é um fator positivo em si – também provoca distorções, pela dependência crescente disso para alguns segmentos editoriais”, afirma Lindoso. “Sempre critiquei a preguiça da indústria editorial na criação e ampliação do mercado. Além, e apesar das dificuldades de logística (você já se perguntou sobre o absurdo de serem necessárias frotas de caminhões para levar livros do Rio e São Paulo para o Recife, quando se poderia usar a tecnologia da impressão sob demanda?), tanto as editoras quanto as livrarias esperam os compradores. O marketing é voltado exclusivamente para os best-sellers. Pouquíssimo é feito para melhorar a distribuição por todas as áreas das capitais.”
O aumento na quantidade de livrarias também é refutado por Lindoso. “Isso de as livrarias estarem crescendo é pura balela: crescem algumas redes que se localizam nas grandes cidades, e a maioria dos quase seis mil municípios não tem nenhuma livraria, nenhuma sala de cinema e muito menos um teatro ou salas para espetáculos musicais. Novos formatos de livros e outros canais de distribuição não entram no radar das editoras como uma necessidade crucial para o desenvolvimento do mercado. Ainda assim, aumenta o número de leitores (não na proporção necessária), por força da inércia. E os editores e livreiros ficam felizes com isso. Não se dão conta do que falta para ser conquistado e pode ser conseguido. O aumento do número de estudantes conta, e medidas como o Vale-cultura podem se tornar progressivamente importantes. Mas, repito, é um crescimento inercial, não orgânico”, enfatiza, lamentando que o Brasil continua longe de estar no rumo de ser um país de leitores, como também de frequentadores de cinema e teatro.
A proliferação de feiras e festivais, entretanto, é uma fonte de otimismo, segundo Felipe José Lindoso, com as iniciativas de saraus e centros de produção de poesia e texto. Mas não é garantia de mais leitores, de acordo com Wellington de Melo, muito embora o fluxo de gente nesses eventos impressione. “Creio que os eventos literários, no geral, fortalecem a qualificação dos leitores existentes. A formação de leitores se dá muito antes, na escola, com os professores, mediadores de leitura, e em casa, com os pais. Quem vai para eventos literários, normalmente, já são leitores, com exceções. Naturalmente, há eventos que têm uma programação infantil, como a Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, e, nesse sentido, colaboram com a formação de leitores. Mas eventos com perfil adulto têm outra proposta”, avalia.
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