Essa discussão na web foi impulsionada por episódio ocorrido no Itaú Cultural, em São Paulo, no ano passado, quando uma mãe foi expulsa do espaço por estar amamentando. Eduardo Saron, presidente da instituição, pronunciou-se sobre o caso, explicando que houve um mal-entendido, porque, como não são permitidos alimentos nas exposições, os funcionários incluíram a mulher e seu filho. Ele também se desculpou publicamente e abraçou o protesto envolvendo várias mães que defendem seu direito de exercer a maternidade e nutrir seus rebentos onde quiserem.
Fabíola Cassab, fundadora do Matrice, grupo de mães paulistas que refletem, apoiam e difundem informações sobre a amamentação, disse que, embora seja um tipo de expulsão incomum, não foi o primeiro caso no país. Embora esse tipo de rejeição seja menor no Brasil que nos Estados Unidos, por exemplo, ela aponta que, no nosso país, amamentar ainda é um tabu e que as campanhas de conscientização são importantes para quebrar essa barreira.
Na opinião da pesquisadora dos Estudos de Gênero, Natália Barros, vinculada à Universidade Federal Rural de Pernambuco, em se tratando da amamentação, além do enfrentamento do corpo feminino e da dificuldade em enxergá-lo para além do desejo sexual, ainda pesa a atual crise do espaço público: “Esse tipo de interdição parece-me uma oposição ao direito da maternidade e ao trânsito livre das mulheres. O espaço público é lugar de diferenças, de disputas. Nós lutamos para conquistá-lo e, agora, estamos lutando para reinventá-lo. É um caso para pensarmos sobre como o olhar transcende o ato estritamente físico, biológico, sendo carregado de sentidos, de valores, a ponto de discriminarmos um ser humano que alimenta outro”.
Além das campanhas governamentais de esclarecimento, o Mamaço, ação coletiva que leva mães às ruas para amamentar juntas, também contribui para um entendimento diferente dessa prática, que deve estar dissociada do moralismo. “Acho que o Mamaço é uma forma de expressar o direito de mamar do bebê. O Estatuto da Criança e do Adolescente garante que a criança pode mamar, não devemos esquecer isso. E as mães têm o direito de oferecer o peito ao seu filho”, afirma Fabíola Cassab. Segundo ela, o olhar censurador é ainda mais enfático quando a criança já anda e tem dentes.
Em maio deste ano, a revista Time gerou polêmica ao trazer em sua capa a imagem de uma mulher amamentando seu filho de três anos, o que foi chocante para os norte-americanos. O longo período de aleitamento materno é normal em vários países, como o Japão, onde é comum amamentar até cinco anos de idade; na Holanda, onde a prática dura, em média, dois ou três anos; e entre os esquimós, que mamam até os sete anos. A recomendação da Organização Mundial de Saúde é que ela siga até os dois anos, o que raramente ocorre no Brasil.
Do ponto de vista da exposição pública, a amamentação de crianças maiores é mais impactante, embora devesse ser encarada com a naturalidade que cerca a dos recém-nascidos, pois não existe idade máxima recomendada para interromper a prática. “Essa relação entre a mãe e o bebê é muito íntima e deve terminar quando a dupla bem entender. Hoje, já existem alguns estudos comprovadores de que a amamentação após os dois anos protege essa criança de doenças futuras, como obesidade e diabetes, males que se têm manifestado com mais frequência nos últimos anos. Portanto, o ato de amamentar o bebê nos seus primeiros meses salva vidas, e o amamentar de forma prolongada – após os dois anos – pode determinar uma saúde diferenciada a esse cidadão”, opina Fabíola.
GIANNI PAULA DE MELO, repórter da Continente Online.
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