Discussão de gênero frente ao patriarcalismo
"O Clube das Mulheres de Negócios", novo longa-metragem de Anna Muylaert, aposta na comédia para questionar os papéis das mulheres e dos homens dentro da sociedade contemporânea
TEXTO Laura Machado
28 de Novembro de 2024
Parte do elenco de "O Clube das Mulheres de Negócios"
Foto Aline Arruda/Divulgação
O Clube das Mulheres de Negócios, novo filme da diretora paulista Anna Muylaert (Que horas ela volta?, Durval Discos) estreia nos cinemas de todo o Brasil nesta quinta-feira (28). Vencedor do Prêmio Especial do Júri na 52ª edição do Festival de Gramado, a obra reimagina os papéis de gênero na sociedade contemporânea através da inversão e faz uma crítica direta ao patriarcalismo e à violência que o acompanha.
No universo criado por Muylaert, as mulheres estão no poder. Elas são as provedoras primárias quando o assunto é dinheiro, mandam na casa e pensam em novas formas de escaparem de seus problemas com a lei, acumularem mais riquezas e darem escapadas sexuais com homens jovens e atraentes. Estes homens, por sua vez, têm seus valores e capacidades questionadas, são objetificados e deixados de lado em conversas de negócios.
Partindo dessa reimaginação, a trama começa a se desenvolver quando o jornalista Candinho (Rafa Vitti) e o renomado fotógrafo Jongo (Luis Miranda) se tornam responsáveis por entrevistar as mulheres que estão à frente de um clube de campo. A partir da chegada da dupla, situações de comicidade começam a desenrolar-se e, a partir da metade do filme, se tornam mais sombrias e explicitamente violentas.
Com um grande time de atrizes escaladas como as participantes da diretoria do clube (Cristina Pereira, Katiuscia Canoro, Louise Cardoso, Ítala Nandi, Polly Marinho, Irene Revanche, entre outras), as atuações são um ponto positivo da obra que, mesmo não sendo capaz de adentrar profundamente em suas construções, devido ao número extenso de personagens, apresenta ao espectador arquétipos muito visitados através de ironia latente.
Com uma imagética inicial colorida e vibrante, O Clube das Mulheres de Negócios adentra em uma pluralidade de temas pujantes que pouco a pouco se transformam, deixando de serem cenas apenas irônicas e absurdas para tocarem em atos reais de violência, que costumeiramente possuem as mulheres como vítimas, mas que, no filme, acontecem aos homens.
Anna Muylaert é uma diretora que já demonstrou grande interesse em explorar questões sociais e políticas em suas obras cinematográficas e aqui, essa intenção não se dispersa. Diante das telas, as personagens criadas pela cineasta são a mais pura representação de diferentes arquétipos masculinos observados nos cenários de políticos e empresários brasileiros. Tratados com o cinismo que merecem, as figuras desses homens são ridicularizadas na obra.
A personagem Zarife, muito bem interpretada pela comediante Katiuscia Canoro, é um excelente exemplo de arquétipo masculino: amante das armas de fogo e da caça de animais, constantemente rebaixa os homens com falas degradantes sobre seus corpos e personalidades, faz comentários sobre suas habilidades sexuais, é conservadora e patriota. Ao assistir O Clube das Mulheres de Negócios, sua imagem se torna indiscutivelmente viva.
Apesar da premissa bem executada, o longa-metragem se perde ao adentrar o suspense e a ação. Com muitas linhas de desenvolvimento em aberto até então, a obra tenta tratar de diversos pormenores das relações de poder e gênero, contudo, não consegue dedicar tempo suficiente para solucioná-las de maneira eficaz e acaba por cair em um lugar comum com a subexploração do tema e o final clichê.
Mesmo com falhas, O Clube das Mulheres de Negócios se constrói como uma obra cinematográfica repleta de ironia e personalidade, que questiona os moldes da sociedade brasileira e põe em cheque a fragilidade do patriarcado.