A sobrevivência na irmandade de “Paraíso em chamas”
Longa da cineasta Mika Gustafson venceu o prêmio de melhor direção na mostra Orizzonti do Festival de Cinema de Veneza e chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (25)
TEXTO Laura Machado
25 de Setembro de 2025
As irmãs Laura, Mira e Steffi são as protagonistas do filme
Foto Pandora Filmes/Divulgação
A partir desta quinta-feira (25), o primeiro longa-metragem de ficção da diretora sueca Mika Gustafson, Paraíso em chamas, chega aos cinemas brasileiros pela Pandora Filmes. Vencedor do prêmio de melhor direção na mostra Orizzonti do Festival de Cinema de Veneza, o filme é um retrato onírico da irmandade como forma de sobrevivência.
Com roteiro assinado por Gustafson em parceria com Alexander Öhrstrand, Paraíso em chamas acompanha uma família formada pelas três irmãs, Laura (16 anos), Mira (12 anos) e Steffi (7 anos). Com o pai sequer mencionado na trama e a mãe sumida, algo que parece acontecer com frequência, o trio vive em meio a uma bagunçada ordem criada por elas como forma de seguir sem serem separadas pelos serviços sociais.
Se precisam de assinaturas de um responsável em documentos, as falsificam com agilidade, quando precisam realizar as compras do mês, já possuem um esquema certo para roubar o mercado local e quando são surpreendidas com a falta de algum item pessoal, pedem ajuda a uma vizinha. A rotina estabelecida faz a irmã mais velha crer estar no controle de tudo, mas por um descuido, esquece de entregar uma autorização de falta no colégio e acaba chamando atenção das autoridades, que marcam uma visita a casa. A partir desse momento, Laura busca encontrar uma mulher adulta capaz de interpretar o papel de mãe durante a visita da assistente social.
Terminando a escola e já carregando o peso de ser a responsável pela dupla de irmãs mais novas, a personagem Laura é interpretada pela atriz Bianca Delbravo e é responsável por grande parte da carga emocional da obra. Através de uma atuação sóbria, os sentimentos difusos da personagem para com a situação de total independência em que está se materializam em olhares certeiros, cheios de emoção.

Foto: Pandora Filmes/Divulgação
Em sua jornada para cuidar das irmãs e ainda seguir experienciando a adolescência, Laura aproveita os momentos sozinha para invadir casas e apartamentos desocupados temporariamente e por algumas horas, vivenciar uma realidade de conforto que não é sua. Envolta nessa realidade, ela conhece Hanna (Ida Engvoll), uma mulher adulta que, de sua maneira própria, também parece desejar escapar do seu meio.
Aos seus modos, Mira (Dilvin Asaad) e Steffi (Safira Mossberg) também percorrem as suas próprias jornadas de descobrimento e experimentação durante o filme. A primeira menstruação, brigas na escola e o acolhimento entre amigas são temas que, apesar de não aprofundados por Gustafson, são fatores contribuintes para a formação das meninas.
Paraíso em chamas bebe de obras aclamadas como As virgens suicidas, de Sofia Coppola, e Projeto Flórida, de Sean Baker, na forma como retrata o cotidiano e a irmandade entre as suas personagens. A beleza da obra está justamente na relação entre Laura, Mira e Steffi, que ainda tão jovens, precisam encontrar seus lugares dentro da família assim como seus lugares dentro de si mesmas. O trio é uma representação das tantas crianças que, abandonadas por aqueles que deveriam prestar o papel de cuidadores, encontram os próprios meios de sobrevivência.
LAURA MACHADO, jornalista das revistas Continente e Pernambuco