Curtas

Semana Nacional de Museus 2021

Museus brasileiros convidam o público a imaginar possibilidades para o futuro em uma semana de eventos virtuais

TEXTO Marina Pinheiro

18 de Maio de 2021

Figuras do Entrudo de lazarim, manifestação tradicional de Portugal, no Paço do Frevo

Figuras do Entrudo de lazarim, manifestação tradicional de Portugal, no Paço do Frevo

FOTO Centro Interpretativo da Máscara Ibérica/ Divulgação

[conteúdo exclusivo Continente Online]

Um voo sobre o Recife partiu do Paço do Frevo no dia 15 de maio, às 14h30. Flutuando sobre pessoas que conversavam, em um outro tempo, nas ruas, os viajantes foram suspensos até alcançar uma visão do Oceano Atlântico, atravessando até Portugal. Tudo isso foi feito sem que qualquer um dos participantes colocasse em risco seus familiares, amigos ou a si mesmo, permanecendo em segurança, em suas casas. A revoada foi parte da atividade Abre-salas transatlânticas, realizada pela plataforma Zoom, que antecipou a 19ª Semana Nacional de Museus. O evento, coordenado pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), acontece este ano de 17 a 23 de maio e reúne atividades exclusivamente digitais feitas por instituições de todo o país para homenagear e repensar o futuro dos museus.

As portas do Paço permaneceram fechadas, mas o acervo foi visitado por muitos olhares. Através da plataforma Google Arts&Culture, Carlos Lima, Coordenador de Educação do centro, conduziu uma mostra do espaço físico, exibindo a entrada, os corredores e, após uma subida invisível pelo elevador, a Praça do Frevo com sua exibição de estandartes. Na parede, fotografias mostrando os mascarados em meio ao Carnaval, que convidaram a alçar voo até uma tradição distante, mas cheia de semelhanças: a do Entrudo de Lazarim, vila portuguesa que abriga o ritual da máscara ibérica, em que foliões desfilam cobertos por figuras em madeira confeccionadas por artesãos.

Depois de pousar, a imagem na tela é a do Centro Interpretativo da Máscara Ibérica (CIMI), onde os convidados conhecem, através de vídeos, o acervo de máscaras e trajes de festas tradicionais da região. São também tema de conversas as muitas outras tradições de mascarados brasileiros, como os caretas de Triunfo e os papangus de Bezerros. É nessa mistura que são esquecidas as barreiras físicas, enquanto o público faz perguntas e escuta histórias de artistas dos dois países, presentes nos vídeos reunidos pelo evento.

No dia 26 deste mês, fechando o calendário de celebrações museológicas do Paço, além da semana, o Observatório Digital do Frevo realiza encontro virtual (às 15h do Brasil, 19h de Portugal), promovendo diálogo inédito entre brasileiros dos caretas de Triunfo, de Pernambuco, e os portugueses dos caretos de Podence e as máscaras de Lazarin. É aberto ao público e as inscrições podem ser feitas aqui.

A travessia das distâncias diz tudo sobre o tema da semana deste ano: O futuro dos museus: recuperar e reimaginar. A apresentação digital é aberta por um trecho do poeta Miró da Muribeca, que alerta: "O amanhã não existe ainda!". Por isso mesmo, a proposta do Ibram é olhar para a transformação que os museus propõem hoje, em suas atividades e relacionamento com as pessoas e territórios ao redor. Com elas, é construído o amanhã não só dos profissionais que trabalham nos museus, mas das sociedades inteiras que participam da construção deles. Por isso, afirma: "O futuro está repleto de oportunidades e abraçá-lo requer coragem para transformar as instituições e construir novas relações".


O Paço do Frevo é um dos espaços que integram a Semana de Museus. Foto: Divulgação

Manter as portas fechadas trouxe dificuldades, como conta Edna Maria da Silva, Coordenadora de Ações Educativas e de Ações Comunitárias do Museu do Homem do Nordeste. "O Ibram, esse ano, incita a gente a entender o que o museu está fazendo: só sobrevivendo ou se reinventando?", diz. "Este mês, completa um ano que as atividades estão remotas. Para mim, o que mais conta é a ausência. No museu, daquele jardim lindo e pequeno; no engenho (Massangana), são 10 hectares de área externa. Não escutar a voz da criança, a dúvida da criança, o tocar, a curiosidade, a explicação que ela dá porque já viu aquilo em algum lugar, o silêncio..."

Na distância desafiadora, Edna encontrou o maior impulso para entregar em casa as atividades para os pequenos, através de qualquer equipamento que tenham disponível. E convida a todos: "A gente está pedindo licença, dizendo: 'Queremos entrar! Respeitando a sua solidão, a sua dor e dificuldades'", em referência aos impactos da pandemia vividos no ambiente familiar. Para acolher esse público, a instituição realizará atividades em todos os dias da semana, através das suas plataformas digitais.

Os eventos remotos integram pessoas de todos os cantos do Brasil, livres de restrições geográficas. Na comunidade de Chã do Esconso, em Aliança, na Zona da Mata, o Museu das Tradições do Cavalo Marinho foi inaugurado em plena pandemia, em novembro de 2020. Destinado a salvaguardar as tradições do Mestre Grimário e outros criadores, agora o centro trará eventos abertos a todos. Elinildo Marinho, turismólogo e cientista da informação que ministrará três das palestras oferecidas por meio do Instagram do museu, observa que apesar da importância da experiência presencial do brinquedo, "nesses lugares, a reflexão sobre os problemas da sociedade também nasce, também brota. E a partir dessa premissa, a gente achou interessante fazer as atividades de forma remota até, também, como uma forma de levar a conscientização às pessoas em relação a se cuidarem, estarem seguras em suas casas".

São muitas as atividades oferecidas pelos museus de Pernambuco. Entre eles, o Instituto Ricardo Brennand planeja uma oficina de modelagem 3D, além de uma palestra para estudantes, profissionais e interessados em turismo, incluindo também horários para visitas mediadas. Enquanto isso, o Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães convida o público a enviar produções autorais, como desenhos, poesias e textos, para compor uma cápsula do tempo virtual no dia 18, às 17h, e o Centro Cultural Cais do Sertão realiza, no mesmo horário do dia 19, uma entrevista com Mestre Biu do Coco a ser exibida pelo Programa Conexão Cais, no YouTube.


A Casa das Rosas, museus de São Paulo, discute a música
nordestina ao longo da Semana de Museus. Imagem: Divulgação

Cada estado é convidado a trazer à roda suas narrativas: o Museu de Imagem e Som do Ceará (MIS) discutirá as políticas de acervos, a aproximação e protagonismo de pessoas com deficiência na produção artística e as novas definições de museu. Já em São Paulo, o Memorial da Resistência propõe um diálogo nesta terça-feira (18), das 18 às 19h, com o artista Rafael Pagantini, sobre interpretações da história a partir da arte, partindo de representações da ditadura. Logo em seguida, das 19h às 21h, a Casa das Rosas discute pela plataforma Zoom o papel de Luiz Gonzaga para as tradições nordestinas. A programação segue ao longo da semana, incluindo eventos da Casa Mário de Andrade, do Museu Afro Brasil e do Museu Catavento.

É possível conferir o guia completo da programação no site do Ibram, onde estão registradas as datas e horários de centenas de atividades das instituições de todo o Brasil. A realização da semana abre caminhos para um grande encontro que homenageia as atividades dos museus, reimaginando, a muitas vozes, um novo futuro a partir do aqui e agora.

MARINA PINHEIRO é jornalista em formação pela UFPE e repórter estagiária da Continente

veja também

Pernambuco Meu País inicia em Taquaritinga

Maracatu rural viaja a Portugal

Duda Rios: Um artista de multipotencialidades