Arnaldo Antunes sempre deu movimento e pulsão às palavras. O músico e compositor paulista, conhecido artisticamente por cantar a poesia, revela uma outra faceta: a de transpor o verbo para as artes visuais. Nesses mais de 30 anos de carreira como ex-Titã e atual Tribalista, Antunes também produziu uma variedade de objetos poéticos, como colagens, esculturas, fotografias e vídeos que podem ser apreciados de perto pelo público pernambucano na mostra Palavra em movimento.
Premiada em 2015 pela Associação Paulista de Críticos de Artes como a melhor exposição daquele ano, Palavra em movimento tem a curadoria do produtor e gestor cultural baiano Daniel Rangel, com quem Arnaldo cultiva, há 10 anos, uma parceria na seleção e exibição de suas obras. Diferentemente de outras exposições apresentadas pelo artista, essa é a mais completa, pois reúne sua extensa trajetória criativa em variados formatos e suportes – que vão da reutilização de recortes de papel aleatórios ao uso de tecnologias – atrelada a épocas específicas de sua vida. Na década de 1980, Arnaldo produziu colagens; já durante os anos 1990, focou nas monotipias com tintas de carimbo. Assim, durante o processo curatorial, foram selecionadas mais de 60 peças que concretizassem a sua inquietude com as palavras, manifestada não apenas de forma visual e plástica, mas também a partir da multiplicidade de sentidos e de sons.
Essa composição entre imagens, ritmos e movimentos remete à estética da poesia concreta, uma das influências de Antunes. Nela, o poema é organizado através de elementos gráficos e fonéticos, de forma a explorar o âmbito verbivocovisual da palavra, expressão utilizada para referir-se à arte concreta brasileira feita pelos poetas Décio Pignatari, Augusto e Haroldo de Campos.
Além do Concretismo, a eclética produção artística de Arnaldo é marcada pelo movimento tropicalista, o rock’n’roll e o cancioneiro popular brasileiro das décadas de 1960 e 1970, tendo como referências figuras emblemáticas como Torquato Neto, José Carlos Capinan e Paulo Leminski. A cultura pop e o movimento punk na geração de 1980 também transparecem no trabalho do poeta, que consegue ultrapassar os limites entre as artes visuais e a literatura e aproximar, tanto na linguagem musical, quanto na visual, esses elementos e influências.
Em entrevista à Continente, o curador Daniel Rangel destacou que, embora haja um recorte cronológico nessas três décadas de produção de Antunes, é possível evidenciar uma unidade entre as peças: “Eu me surpreendo com a conexão entre a primeira série de colagens que ele produziu nos anos 1980, chamada Oráculo, e a sua mais recente produção em fotos, O interno exterior, de 2015. Ambas revelam a vontade dele em se conectar com o mundo ao seu redor através da palavra, independentemente do formato”.
Dessa forma, a montagem apresenta diferentes suportes para a poesia de Antunes, como ferro, alumínio, acrílico, adesivos e animações, que vão do minimalista Ovo vírgula, cuja casca de ovo preenchida com parafina ganha uma vírgula em seu centro, até a roda vermelha e amarela intitulada Alegria, uma das obras em que o público pode brincar com a formação de novas palavras. Mais de 200 mil pessoas já visitaram a Palavra em movimento nas cidades de Fortaleza, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. A exposição chegou ao Recife no mês de agosto e fica em cartaz até outubro na Caixa Cultural, com visitação gratuita e livre para todos os públicos.
PAULA MASCARENHAS é graduada em Letras pela UFBA, estudante de Jornalismo pela UFPE e estagiária da Continente.