É a primeira exibição pública da Conchita artista. Apesar de curta temporada (até 2 de fevereiro), a mostra merece uma visita. Primeiro, para descobrirmos a existência de uma mulher artista nesse império masculino das artes pernambucanas, ainda mais sendo alguém acima dos 80 anos e às "sombras" de um nome associado imediatamente ao ceramista da Várzea – quando não ao colecionador de armas e obras de arte das terras adjacentes. Segundo, para conhecermos, enfim, o trabalho de Conchita Brennand, que resolveu traçar seu caminho de vida particular, à margem dos holofotes.
Movida pela inquietude, evidente no próprio fato de seguir desenhando diariamente, a artista parece buscar, ela mesma, se descobrir de suas amarras criativas, produzindo um trabalho bonito, telúrico, honesto e simples. Outro adjetivo poderia ser surpreendente, ainda que haja em suas obras uma aproximação estética com algumas das conhecidas formas orgânicas do irmão Francisco. Difícil evitar a comparação, afinal está na sua formação a convivência com o seu parente, mas também com o meio no qual ambos foram criados, a Várzea, da qual carrega muito dos "mistérios de suas matas", como diz Raul Córdula. O curador escreve o seguinte:
É claro que Conchita participa desde sempre do mesmo mundo que Francisco, da mesma história repleta de símbolos e miragens que seu irmão mais velho, do ambiente tropical das matas da Várzea e do Capibaribe donde existem lagos, açudes e aguadas, dos animais, pássaros especialmente, entre solos argilosos, troncos e galhos, folhas e frutos. O espírito da mata se revela em tudo, nas figuras sensuais, nos animais fantásticos e na flora, das raízes às folhas, que se constitui em tramas, malhas e tecidos que envolvem seus tantos corações abertos para o mundo.
Além dos elementos enumerados acima, responsáveis por compor um “figurativismo abstrato” peculiar, Conchita Brennand traça, em seu arsenal imagético, mulheres de personalidade própria – e homens também. No geral, são lânguidas, porém nunca objetificadas; por vezes, idealizadas em meio à natureza, por outras sugestivas, como no gesto acima de haver o bico de um pássaro prestes a beliscar a boca de uma delas. Interessante notar a escolha da artista em usar além de tinta, caneta Bic, caneta Posca, hidrocor e outros materiais menos sofisticados, normalmente utilizados pelos artistas mais jovens, contemporâneos, para realizar seus trabalhos. Há também pinturas em cerâmica, mas tudo resultado de um experimento recente que ela aprendeu com a artista Amélia Córdula, não com o irmão. Nesse caso, a cerâmica em si não se aproxima à dele.
Um sinal de que há aí muita vida e disposição, capaz de gerar em nós um olhar de expectativa, curiosidade. Há muita cor, isso também atrai. Talvez seja por isso que ela só use roupas pretas, pois assim costuma dizer: “Minhas tripas já são coloridas”.
OLÍVIA MINDÊLO é jornalista da área de arte e cultura e editora da Continente Online.