“Não ia contratar um modelo quando me tenho a mim no atelier. A tela sou eu. A imagem do meu corpo não é a minha imagem”, declara a artista no livro Helena Almeida, fotografia habitada (136 páginas, R$ 154,50), organizado pela crítica e curadora portuguesa Isabel Carlos. A publicação é fruto da exposição Fotografia habitada, antologia de Helena Almeida, 1969-2018, instalada no Instituto Moreira Salles de São Paulo até 25 de setembro. Trata-se da primeira individual da artista em solo brasileiro.
Fotografia habitada, diz a curadora, não poderia ser mais preciso para a antologia inédita, pois descreve liricamente o trabalho de Helena com a fotografia, habitada pela pintura, desenho, escultura, performance, corpo e sentidos. Uma tela vira roupa em Tela rosa para vestir (1969). Um fio de crina em lugar do risco tridimensionaliza a fotografia na obra Desenho habitado (1977). Em Tela habitada (1976), a artista parece ter sido colocada dentro de uma tela de pintura.
Filha do notório escultor português Leopoldo de Almeida (1898-1975), autor do famoso conjunto escultórico do Padrão dos Descobrimentos, Helena herdou a função vital de exorcizar através da arte, nos mais diversos códigos artísticos: desenho, cinema, pintura, HQ, escultura, arquitetura, performance e fotografia são utilizados como ferramentas de subversão da imagem. Sendo cada uma delas pensada e desenhada como um storyboard.
Dentro de mim, 2018. Acrílica sobre fotografia, tríptico, 134 x 86 cm (cada). Cortesia Galeria Francisco Fino, Lisboa. Foto: Divulgação
Mirem-se no último trabalho de Helena, Dentro de mim (2018), que a curadora chama de anti-retrato, onde a artista surge vestida de preto com um saco na cabeça. “Um corpo que está impedido de ver, como os prisioneiros e as vítimas de sequestro. E nós espectadores olhamos, mas não a vemos e nos ocorre a célebre frase do [psiquiatra martinicano] Frantz Fanon ‘todo o espectador é um covarde e um traidor’”, escreve Isabel sobre a obra.
No livro, além da biografia e dos trabalhos que permeiam 55 anos de carreira da artista, são revelados trechos de diálogos entre Isabel e Helena, ao longo de uma relação muito próxima, iniciada em 1996. Publicados originalmente em 2007, esses diálogos ganham agora edição exclusiva para o Instituto Moreira Salles.