Duda Rios: Um artista de multipotencialidades
Ator pernambucano brilha no palco como ator, diretor e dramaturgo, e na televisão, como Tobias, da novela “No Rancho Fundo”
TEXTO Márcio Bastos
28 de Junho de 2024
FOTO Ana Migliare / Divulgação
Ator, dramaturgo, diretor, músico, palhaço, jornalista, comunicador: são muitos os talentos de Duda Rios e, para ele, não há uma função que se sobressaia. Aos 35 anos, o pernambucano radicado no Rio de Janeiro há pouco mais de uma década está confortável em ser plural, experimentando diferentes funções (às vezes, simultaneamente), enquanto exercita sua criatividade e expande seu universo artístico. Atualmente em cartaz na novela No Rancho Fundo, exibida no horário das 18h da Rede Globo, seu trabalho também tem circulado os palcos do país através de duas peças aclamadas pelo público e pela crítica: Azira'i, protagonizado por Zahy Tentehar, e Jacksons do Pandeiro, da Barca dos Corações Partidos, grupo que integra desde 2012.
O interesse por diferentes áreas se manifestou cedo para Duda Rios (que no começo da carreira assinava como Eduardo Rios, antes de incorporar o apelido pelo qual era chamado pela maioria das pessoas). Ele mantém desde pequeno o hábito de escrever, começou cedo a experimentar com o violão e, na adolescência, iniciou o curso de teatro. Cursou Jornalismo na Universidade Federal de Pernambuco e, enquanto estudava Comunicação, também se aprofundava nas artes cênicas, flertando com a palhaçaria e outras linguagens.
“Sou de uma geração em que ainda imperava essa ideia de que você tinha que ser especializado apenas em uma área – e ser muito bom nela. É uma ideia piramidal de mundo que está em decadência porque está surgindo um mundo em rede, todo entrelaçado agora. Então, não importa tanto isso de você ser o melhor em apenas uma coisa. Acho que fui resolvendo essa minha inquietação naturalmente. Não tenho um processo de preparação introspectivo; gosto de me conectar com as várias áreas dos trabalhos. Quanto tentei me especializar em alguma coisa, a vida foi lá e me ‘desespecializou’. Lembro que me falavam para ter cuidado para não me tornar um pato – que nem nada, nem anda, nem voa direito; faz tudo, mas não faz nada com perfeição. Brinco que, com o passar do tempo, fui me reconhecendo como um pato, me assumi como um artista de multipotencialidades – e isso tem um preço”, refletiu o artista em entrevista à Continente.
O interesse por experimentar guiou Duda por caminhos inesperados. Em 2007, ainda na universidade, integrou o Grupo Quadro de Cena, junto a Samuel Santos, Andreza Nóbrega, Beatriz Lacerda, Milena Marques, Marcella Malheiros e Thomás Aquino. Eles operavam em uma dinâmica colaborativa, prática que viria a acompanhar o pernambucano nos seus trabalhos futuros.
Também no Recife, Duda fez parte da equipe dos Doutores da Alegria, como o palhaço Dr. Sibito, quando aperfeiçoou seus interesses circenses. Finalizado o curso de Jornalismo, em 2011, ele se mudou para a Inglaterra, onde estudou na London International School of Performing Arts, instituição inspirada no método do francês Jacques Lecoq, no qual a performance corporal tem um papel de destaque.
“Na escola, todo dia a gente tinha criações colaborativas para fazer. Cerca de três projetos por semana que corriam paralelamente. Às vezes, eu estava com um grupo, tinha que ensaiar com outro, além de fazer o meu projeto, no qual eu dirigia mais quatro atores. Era de uma maneira mais anárquica. Hoje, eu amo a criação colaborativa, mas gosto quando ela não é totalmente horizontal. Me interessa quando tem um processo diagonalizado, no qual hierarquias, mas existe uma troca entre essas funções. Quando eu cheguei no Rio, nosso primeiro espetáculo Gonzagão - A Lenda, João Falcão, que era o diretor, estava trabalhando muito na Globo, então a gente teve que ajudar muito e isso ficou no DNA da companhia”, explicou.
Por conta de Gonzagão, Duda passou a viver no Rio de Janeiro, onde até hoje desenvolve seus projetos artísticos. Seu currículo inclui ainda Suassuna - O Auto do Reino do Sol, pelo qual ganhou o Prêmio Bibi Ferreira de Melhor Ator Coadjuvante, e o monólogo Doideira de Amor, no qual venceu como Melhor Ator no Niterói em
Em Jacksons do Pandeiro, também com a Barca dos Corações Partidos, ele não só participou como ator, como também assinou a dramaturgia com Bráulio Tavares. O espetáculo tem direção da também pernambucana Duda Maia, que já trabalhou com o grupo em Auê. Jacksons do Pandeiro estreou em 2020, durante a pandemia, em formato online, chegando aos palcos apenas dois anos depois. No Recife, a peça ganha apresentações até o dia 30 de junho, no Teatro do Parque. No entanto, o artista fez questão de estar presente para acompanhar, ainda que nos bastidores, as apresentações na sua cidade natal.
Com a Barca dos Corações Partidos, que tem um trabalho muito ligado à música, Duda, que toca sanfona, sopros e pandeiro, lançou ainda as trilhas sonoras dos espetáculos Auê, Suassuna: o Auto do Reino do Sol e de Jacksons do Pandeiro. O ator conseguiu conciliar a agenda e participa das apresentações em sua cidade natal.
O trabalho por trás da cena, inclusive, tem ganhado espaço no currículo do pernambucano. É o caso da premiada Azira'i, solo da atriz Zahy Tentehar, que também está no ar em No Rancho Fundo. Duda assina com Zahy a dramaturgia, pela qual foram indicados ao Prêmio Shell de Melhor Dramaturgia, e a direção com Denise Stutz, pela qual concorrem a Melhor Direção no Prêmio da Associação dos Produtores de Teatro. Como dramaturgo, ele também já assinou os textos de Manoel, A Gaiola e Contos Partidos de Amor, dirigidos por Duda Maia.
Seu currículo inclui ainda os personagens Poeta Patativa, em Malhação - Viva a Diferença (2018), e o Ladrão Eduardo, no programa Louco por Elas (2012), no qual também teve um papel como autor. Como diretor, dirigiu os videoclipes Ali e Calcanhar, parceria da Barca dos Corações Partidos com Elba Ramalho.
“Fico muito feliz com o reconhecimento dos trabalhos porque há muita energia investida. É sempre uma tentativa, você não sabe o que esperar quando começa um processo, então é muito bonito quando o processo colaborativo acontece, quando você não sabe onde você termina e o outro começa. Acho que não tem uma fórmula para se chegar nisso. Eu tenho algumas ferramentas, mas é um mistério da criação teatral. Algumas coisas são necessárias: abertura, escuta e generosidade. Esses são princípios fundamentais da criação colaborativa”, enfatizou.
Enquanto brilha no papel de Tobias Aldonço, gerente do Grande Hotel Petersburgo, em No Rancho Fundo, Duda Rios começa a conceber um espetáculo solo, com expectativa de estreia em 2025. A obra terá um caráter mais reflexivo, com o artista investigando questões próprias, de cunho filosófico. Antes, porém, ele irá assumir a direção de um espetáculo da Dupla Companhia, de São Paulo, inspirado na obra de Nise da Silveira.
“De uns dois anos pra cá, eu estava querendo experimentar em outros lugares, como a direção. Normalmente eu estava sempre em cena, mesmo quando exercia outras funções. Tem sido ótimo poder olhar de fora, enxergar a criação de outro lugar. A novela também é instigante neste sentido porque me leva para o espaço do audiovisual. Vinha tentando semear isso e, agora, tenho colhido, o que me deixa muito grato”, enfatizou.
Márcio Bastos, jornalista, mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco e autor do livro Pernalonga: uma sinfonia inacabada (Cepe Editora)