'Máfia, poder e antimáfia'
O ‘modus operandi’ da máfia italiana e seus tentáculos
TEXTO Paulo Cezar Soares
03 de Abril de 2023
Imagem reprodução
[conteúdo na íntegra | ed. 268 | abril de 2023]
Em maio do ano passado, o atentado que ocasionou a morte do juiz Giovanni Falcone e mais quatro pessoas completou 30 anos. Falcone ficou conhecido em todo o mundo pelo seu trabalho de combate à máfia italiana Cosa Nostra. Em Máfia, poder e antimáfia – Um olhar pessoal sobre uma longa e sangrenta história (Unesp), de Wálter Fanganiello Maierovitch – primeiro lugar do Prêmio Jabuti 2022 na categoria Ciências Sociais – há o relato da dinâmica desse atentado e de alguns outros assassinatos que vitimaram combatentes de estirpe da luta antimáfia. São os cadaveri eccellenti – os cadáveres de excelência, expressão cunhada pelo escritor e jornalista siciliano Leonardo Sciascia. A ousadia dos criminosos para impor o terror aos seus opositores tem como base a omertà – a lei do silêncio.
No prefácio, escrito por Fernando Gabeira, o leitor tem um perfil do autor, seu vasto conhecimento sobre o tema, pesquisas e sua participação nos encontros da ONU sobre Máfia e crime transnacional.
Além de jurista, Maierovitch é professor, foi desembargador, fundador do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone de Ciências Criminais e o primeiro secretário nacional para o fenômeno das drogas ilícitas no governo de Fernando Henrique Cardoso, já atuando como observador das Nações Unidas para a Convenção de Palermo, primeiro e único instrumento jurídico sobre criminalidade organizada transnacional. Contribuiu com Falcone na década de 1980, quando este esteve no Brasil para extraditar Tommaso Buscetta, um dos nomes mais importantes da Cosa Nostra.
A rotina da máfia para manter os seus negócios é baseada na intimidação e na violência de todos os matizes, com ênfase para os seus ambíguos códigos de ética. O livro relata o caso do soldado mafioso e o seu amor correspondido por uma mulher casada. Foi advertido que sua conduta violava o código de ética, jamais formalmente escrito, mas difundido por tradição oral. O soldado ficou abatido e não mais servia como antes à organização. Para solucionar, o capo (chefe) autorizou que ele matasse o marido e depois se casasse com a viúva.
A máfia “exportou” sua estrutura organizacional, seus métodos intimidatórios e violentos para impor seu poder e arrecadar dinheiro mediante a extorsão, o pizzo, cujas vítimas são os comerciantes e industriais, compelidos a pagar à Cosa Nostra uma “taxa” de proteção e, assim, garantir a segurança do ponto onde desenvolvem seus trabalhos.
O procedimento foi adotado por diversas organizações criminosas em todo o mundo. É o caso, por exemplo, das milícias que dominam vários bairros do Rio de Janeiro – formadas por PMs, militares do Corpo de Bombeiros, policiais civis e também expulsos das suas corporações – que exploram comerciantes nas periferias e nas favelas e impõem a lei do silêncio. O mesmo ocorre com o Primeiro Comando da Capital (PCC) que, na opinião do autor, “continua em expansão e poderá, se não for enfrentado corretamente, transformar-se e em organização mafiosa transnacional e não mais transfronteiriça”.
PAULO CEZAR SOARES, jornalista.