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“Se o ator não está bem, toda a magia some”

A atriz Maeve Jinkings, nascida em Brasília, atualmente é um dos rostos mais presentes na filmografia pernambucana. Em entrevista, ela comenta seu momento profissional e projetos

TEXTO André Dib

01 de Novembro de 2013

Maeve Jinkings

Maeve Jinkings

Foto Antonio Melcop/Divulgação

[conteúdo vinculado à reportagem de "Claquete" | ed. 15 | novembro 2013]

Sem dúvida, a atriz Maeve Jinkings vive uma ótima fase.
Ela, que estreou no cinema dirigida por Carlos Reichenbach, atua em importantes filmes da recente safra pernambucana, um deles, O som ao redor, o indicado brasileiro ao Oscar. Não bastasse, acaba de ter o seu trabalho reconhecido em um dos festivais mais conceituados do país. Antes de se mudar para o Recife, viveu em Brasília, Belém e São Paulo. Entre os novos projetos, estão atuações em Loja de répteis, curta de Pedro Severien, e Seu Cavalcanti, curta de Leonardo Lacca. Além disso, ela se lança como preparadora de elenco em Animal político, de Tião e Nara Normande. Maeve conversou com a Continente sobre seu atual momento e sobre os novos projetos.

CONTINENTE Seu primeiro prêmio como atriz foi oferecido em Brasília, sua terra natal. O que significou esse momento?
MAEVE JINKINGS Foi muito bonito porque é o festival que mais admiro, o mais antigo e mais político do país, não consigo imaginar prestígio maior. Falei isso no palco, que levava muita gente dentro do peito. Em milésimos de segundos passa um filme na cabeça, sobre as dificuldades de ser ator no Brasil. Mas, afinal, estava ali celebrando nosso ofício, no meio de pessoas que admiro. Além disso, Brasília foi o lugar onde estreei meu primeiro filme, Falsa loura, de Carlos Reichenbach, que foi uma espécie de pai. Ele me pariu no cinema. O prêmio também foi importante pra minha família que, às vezes, tem dificuldade de entender minhas escolhas, mas que sempre me apoia muito.

CONTINENTE Seu trabalho em Amor, plástico e barulho confere profundidade dramática na representação de artistas do brega. Como foi o processo para chegar à Jaqueline?
MAEVE JINKINGS Do ponto de vista dramático, até aquele momento, foi a personagem mais exigente que já tive a chance de viver. Então, estudei muito. Foi um amadurecimento em meu processo de trabalho. Além de todo nosso estudo com Amanda Gabriel (preparadora de elenco), fiz aulas de canto com Pedro Martins e de dança com o elenco. Mas tinha um elemento que me preocupava, a relação de Jaqueline com o álcool. Como tratar disso com humanidade, sem cair em clichês? Fui conversar com mulheres dos Alcoólicos Anônimos e do Narcóticos Anônimos, que me contaram detalhes de suas vidas, do impulso autodestrutivo, de suas lutas contra si mesmas. Também me ajudou muito a proximidade com a cantora Michelle Melo, que foi supergenerosa, me levando a seus shows, trocando torpedos e e-mails, me dando um acesso muito pessoal ao universo da mulher no brega. Os personagens nascem aí, nessa ponte com pessoas, inclusive com a gente mesmo, enquanto ser no mundo.

CONTINENTE Que qualidades específicas o cinema exige na ação dramática?
MAEVE JINKINGS Deixar-se afetar pelo mundo, pelas pessoas. Gente é bicho, então, biológica e culturalmente, tentamos esconder nossas fragilidades, pois nos deixam vulneráveis. O ator precisa ser forte o suficiente para estar completamente sem defesa para os vetores que afetam o homem no mundo. Ao mesmo tempo em que, como artista, consciente desses vetores, perceber qual a melhor forma de desenhar isso no corpo e na subjetividade do personagem.

CONTINENTE Qual a relação entre o trabalho feito em Falsa loura com tudo que veio depois?
MAEVE JINKINGS Continuo fazendo um cinema muito autoral, com pessoas apaixonadas. Houve um período de quatro anos entre Falsa loura e O som ao redor. Nesse período, fiz muito teatro de grupo, um pouquinho de TV, mas acho que o mais importante foi ser a fase da minha vida em que mais me preocupei em pensar as minhas escolhas, o ofício do ator, a condição solitária do artista e de que forma quero lidar com isso.

CONTINENTE O que o trabalho nos filmes pernambucanos acrescentou à sua percepção sobre cinema?
MAEVE JINKINGS Posso dizer que o cinema pernambucano me formou como atriz de cinema. Tem sido uma segunda faculdade: na prática, com escolhas que ficam eternizadas. Porém, mais do que como atriz, o cinema de Pernambuco me afeta como cinéfila, como agente do cinema. Tive a sorte de chegar aqui e conhecer uma galera que pensa o cinema de forma muito ativa, dialogando com o que está sendo feito no mundo.

CONTINENTE Você estudou Comunicação e, quando criança, queria ser veterinária. Quando surgiu a vontade de ser atriz?
MAEVE JINKINGS Eu era ainda criança, aos 10 anos. Não lembro exatamente quando isso surgiu, mas foi na relação com cinema e TV, pois em Belém não havia um movimento muito forte de teatro. Gosto de pensar que sou atriz para ser um tipo de bióloga, antropóloga, musicista, desenhista, fotógrafa... Tudo que me provocou durante a vida, mas que por alguma razão não realizei profissionalmente. Aí, juntei tudo num só ofício, o do ator.

CONTINENTE Como lida com a possibilidade de O som ao redor ser indicado ao Oscar?
MAEVE JINKINGS Honestamente, tenho crises de riso. Pode ser nervosismo, ou simplesmente a imagem de Kleber Mendonça andando sobre o tapete vermelho usando um smoking, cheio de flashes. Pode ser bobo de minha parte, mas acho muito engraçada essa imagem. Fora isso, fico muito feliz (já estou), porque dá outra camada de visibilidade para o filme, que foi feito sem contar com essa possibilidade de promoção.

CONTINENTE Em Brasília, dos 10 prêmios concedidos a filmes pernambucanos, três foram para atrizes: Maeve Jinkings, Nash Laila e Rita Carelli. Como vê esse reconhecimento?
MAEVE JINKINGS Vejo sempre o trabalho do ator como o ingrediente final e sutil de uma química que precisa dar “a liga”. Às vezes, assisto a filmes com roteiro, fotografia e direção de arte incríveis. Mas, se o ator não está bem, toda a magia desaparece e começo a “ver” a maquinaria atrás da câmera. Estamos todos amadurecendo juntos, produzindo mais e nos desenvolvendo a cada novo trabalho. E isso acontece em todas as funções. Também tenho a sensação de que estamos conseguindo fazer um trabalho colaborativo no qual o ator tem espaço para, dentro dos limites de seu ofício, propor mais dentro do set. Uma relação onde nos sentimos parte do processo e assim podemos ousar mais como artistas do corpo. 

ANDRÉ DIB, jornalista e crítico de cinema.

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