Toda a problemática social canalizada por Stênio e potencializada pelo seu dom de conversar com os mortos conduz o público a um acompanhamento quase dostoievskiano da construção de uma mente atormentada pelos seus erros e pela miséria que a cerca, seja ela sobrenatural ou não. A formação dessa tensão, atravessada pelas violências simbólicas conduzidas por Dennison Oliveira com ritmo único, culmina em reações físicas que vão além do susto, se tornando emocionais à medida que o filme nos aproxima do personagem de Daniel de Oliveira. A imersão na narrativa só é quebrada pela escolha técnica de computadorizar a atuação dos personagens falecidos nos rostos dos mortos, o que pode causar incômodo.
Encontramos em Morto não fala um filme de gênero que utiliza o terror como ferramenta de denúncia, e, nesse sentido, torna-se difícil medir até que ponto o incômodo da expressividade dos mortos é proposital. Pode-se notar, porém, que a atuação de Daniel de Oliveira impulsiona Stênio para um patamar expressivo que quebra o estereótipo do funcionário calejado e frio do Instituto Médico Legal. Destacam-se também as atuações de Fabíula Nascimento (Odete), Bianca Comparato (Lara) e Marco Ricca (Jaime).
VICTOR AUGUSTO TENÓRIO é estudante de jornalismo da Universidade Católica de Pernambuco e estagiário da Revista Continente