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Segundo dia de debates do CIJI

3º Congresso Internacional de Judaísmo e Interculturalidade: História e Transculturalidade chega ao seu segundo dia, com programação extensa

26 de Maio de 2025

Na mesa

Na mesa "Expansão Atlântica", Francisco de Sales Gaudêncio, Mario Helio Gomes, Rosa Ludermir e Luiz Feldman

Foto Divulgação

O 3º Congresso Internacional de Judaísmo e Interculturalidade: História e Transculturalidade (3º CIJI) vai começar seu segundo dia de programação com o tema “Judaísmo, resistência e identidade: da perseguição na Europa aos Bnei Anussim do Recife”. A abertura será às 8h30 desta terça-feira (27).

A primeira rodada de debates terá como moderador o professor Daniel Valério (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia) e como debatedores os também professores Ángel Baldomero Espina Barrio (Universidade de Salamanca) e Renato Athias (Universidade Federal de Pernambuco).

Em torno do tema sugerido, ambos vão abordar as seguintes subtemáticas: Angel Baldomero falará sobre os “Aspectos antropológicos e históricos da perseguição aos judeus na história do Ocidente”, enquanto Renato Athias vai explanar sobre "A Sinagoga Kahal Zur Israel e a questão dos Bnei Anussim no Recife”.

Renato Athias vai explanar sobre a Sinagoga Kahal Zur Israel
Foto: Leopoldo Conrado Nunes

A abordagem de Athias vai se centrar na Sinagoga Kahal Zur Israel, um dos marcos mais importantes da presença judaica no Brasil Colônia. Mas, principalmente, no comportamento dos Bnei Anussim, ou seja, dos “filhos dos forçados”, como eram chamadas pela comunidade judaica, as pessoas obrigadas pela Inquisição a abandonarem suas religiões e se converterem ao cristianismo. Na sua fala, ele também incluiu um tema atual: como, no decorrer dos séculos, os Bnei Anussim foram e continuam retomando suas identidades e religião originais, voltando às práticas do judaísmo, às vezes de forma convencional, outras não.

“Na realidade, a identidade Bnei Anussim não pode ser compreendida apenas como uma tentativa de 'retorno' ao Judaísmo histórico, mas como uma expressão contemporânea, situada entre a memória coletiva do trauma (imposta pela conversão forçada e pelo apagamento identitário) e a agência individual, que busca reconstruir sentidos no presente”, diz Athias.

O espanhol Ángel Baldomero, por sua vez, vai abordar os “Aspectos Antropológicos e históricos da perseguição aos judeus na história do Ocidente”, ressaltando que há milênios o povo judeu sofre castigos, vive diásporas forçadas, é alvo de perseguições, desqualificações e execuções. Ele chega a citar o historiador Caio Cornélio, que, no final do século I D.C, chega a falar bem dos alemães, inimigos de Roma, mas desfere grandes ofensas contra os judeus.

Ainda na manhã da terça, na segunda mesa de debate do 3º CIJI, o tema “Interseções místicas, míticas e identitárias na construção do pensamento religioso" terá como moderador Geraldo Pieroni, da Universidade Tuiuti do Paraná. Os palestrantes da vez serão Marcelo Guimarães, do Museu da História da Inquisição, de Belo Horizonte, que abordará o tema “Padre Vieira: raízes judaica: verdade ou mito?”; e Caesar Sobreira, professor da Universidade Federal de Pernambuco que abordará “Ciência mística das letras no Judaísmo e no Islã: por uma hermenêutica intercultural e supraconfessional.”

Caesar Sobreira vai abordar as convergências entre Judaísmo e Islamismo
Foto: Leopoldo Conrado Nunes 

No caso de Caesar Sobreira, ele vai destacar as convergências, as semelhanças e as equivalências de cosmovisão na mística muçulmana e na mística judaica, identificando pontos de interlocução entre sufismo e a cabala. “Temos a esperança de proporcionar pautas para um diálogo entre as metafísicas islâmica e judaica, ponto de partida para a compreensão mútua e a cooperação entre o Islã e o Judaísmo”, diz o pesquisador e professor.

Marcelo Guimarães, por sua vez, abordará um tema curioso: descorrerá se o famoso padre Vieira, enviado ao Brasil por Dom João IV na época dos holandeses, tinha ou não̎ sangue judeu.

O religioso chamava atenção pelos seus discursos eruditos, pela defesa dos indígenas, escravos e dos judeus novos. O que o levou a ter problemas com a Inquisição e a ficar preso durante quatro anos, apesar de jurar não ter antepassados judeus. O palestrante afirma que Vieira era um homem à frente do seu tempo, e que muitos dos seus discursos e teses visionárias, não eram compreendidas pelos inquisidores.

PROGRAMAÇÃO
No início da tarde, a partir das 14h, nova mesa de debates, desta vez com o tema “Judeus e criptojudeus: trajetórias e identidades judaicas no espaço ibero-americano”, que terá como mediador Luiz Nilton Corrêa, do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina. Na ocasião, Jacques Ribemboim, da Academia Pernambucana de Letras vai abordar a “Cronologia da presença judaica e cristã-nova no Brasil”. Ele falará sobre os estágios iniciais da prática judaica em Pernambuco, que remontam ao período de 1502 a 1535, constituindo-se num dos mais relevantes capítulos da história judaica das Américas.

Essa importância, segundo Ribenboim, se deve não somente pelo fato de o Brasil ter sido arrendado ao grupo mercantil liderado pelo cristão-novo Fernão de Noronha como também pelos indícios de que possuísse conexões com instituições israelitas no sentido de ajudar na transferência de famílias para fora de Portugal, com especial atenção para Pernambuco. Projeto que, nos séculos seguintes, teve desmembramentos bem diferentes.

O professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Jorge Martins, vai compor a mesa. E abordará “Judeus e Criptojudeus em Portugal: presença e identidade”. Na ocasião, ele demonstrará que a presença judaica no país ibérico é bem mais antiga do que se pensa. Em Coimbra, no século X, ̛ano de 950, foi encontrado um documento que comprova que existiam naquela cidade algumas famílias de judeus. E, em 1147, quando D. Afonso Henriques conquistou a cidade de Santarém aos mouros, já existia ali uma comunidade judaica. “Qualquer que seja a data adotada como fundadora do reino de Portugal – 1139, quando Afonso Henriques se autoproclamou rei, 1143, quando seu primo D. Afonso VII de Leão, o reconheceu como tal, ou 1179, quando o papa Alexandre III reconheceu a independência do reino de Portugal –, não restam dúvidas de que, para haver uma comunidade organizada em Santarém em 1147, esta não poderia ter surgido espontaneamente naquela data.” Ou seja: “Os primeiros reis portugueses, tal como os dos restantes reinos da Península Ibérica durante o período da Reconquista, serviram-se dos judeus para a povoação, defesa e desenvolvimento económico das terras que iam sendo conquistadas aos mouros.”

Na segunda metade da tarde, o 3º CIJI terá um debate que vai discutir o tema “Saberes e tradições: do papel à cura pelas plantas”. Com mediação de Jorge Martins, Adélio Amaro, do Centro do Patrimônio da Estremadura, em Portugal, falará sobre "A judiaria de Leiria e sua influência no primeiro moinho de papel em Portugal". Outro tema a ser abordado pelo diretor do Museu Municipal de Penamacor, André Oliveirinha, será “Aroma, ritual e terapia: as plantas na religião mosaica: um projeto comunitário da Casa de Memória Sefardita Ribeiro Sanches.”

No caso de André Oliveirinha, ele vai desdobrar-se em torno de plantas medicinais, cujas propriedades foram estudadas e são citadas na Bíblia ou em obras de médicos judeus/cristãos-novos, nomeadamente de António Nunes Ribeiro Sanches. “Procura-se, desta forma, relacionar dois conceitos distintos: a etnomedicina, isto é, o ramo que se dedica ao estudo de formas e práticas de cura e terapias de determinado grupo étnico – e a etnobotânica, ou seja, sobre as plantas usadas para fins iátricos. Ambos os conceitos se encontram ligados ao estrato etnorreligioso judaico, cristão-novo e/ou descendentes de judeus sefarditas”, segundo explica Oliveirinha.

No encerramento do dia, a partir das 17h45, o evento terá encerrado com a exibição do documentário Lembrar-se para não esquecer: a saga dos judeus no Nordeste brasileiro, que terá a participação do diretor Leo Crivellare.

SERVIÇO

3º Congresso Internacional de Judaísmo e Interculturalidade: história e transculturalidade
Quando: De 26 a 28 de maio. Das 8h30 às 19h (segunda e terça). Das 8h30 às 12h30 (quarta-feira)
Onde: Local Expo Center Recife (Cais de Santa Rita, 156 - São José)

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