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Morre Jards Macalé aos 82 anos

Cantor e compositor carioca, que trabalhou ainda com cinema, televisão, teatro e artes plásticas, faleceu nesta segunda-feira (17), enquanto tratava de uma broncopneumonia

17 de Novembro de 2025

Foto Leo Aversa/Divulgação

Jards Macalé, de 82 anos, morreu nesta segunda-feira (17), de uma parada cardíaca. O cantor e compositor estava internado em um hospital na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, tratando uma broncopneumonia. 

"Cante, cante, cante. É assim que sempre lembraremos do nosso mestre, professor e farol de liberdade. Agradecemos, desde já, o carinho, o amor e a admiração de todos. Em breve informaremos detalhes sobre o funeral", diz a mensagem nas redes sociais do artista, acrescida com frases do próprio artista: “Nessa soma de todas as coisas, o que sobra é a arte. Eu não quero mais ser moderno, quero ser eterno.”

Nascido em 3 de março de 1943, na Tijuca, Zona Norte do Rio, Jards Anet da Silva veio de uma família ligada à música. Morava na vizinhança de cantores como Vicente Celestino e Gilda de Abreu. Sua mãe, Lígia, tocava valsas e modinhas ao piano, e o pai executava acordeom nas festas que promoviam em casa.

Ainda criança, Jards mudou-se com a família para o bairro de Ipanema, onde ganhou o apelido de "Macalé" – em referência ao pior jogador do Botafogo. Na adolescência, formou seu primeiro grupo musical, o duo Dois no Balanço. Posteriormente, integrou o Fantasia de Garoto, que tocava jazz, seresta e samba-canção.

Jards estudou piano e orquestração com o maestro Guerra Peixe, violoncelo com Peter Dauelsberg, violão com Turíbio Santos e Jodacil Damasceno e análise musical com Esther Scliar. Começou a carreira profissional em 1965, como violonista nas produções do Grupo Opinião. Na mesma década, fez a direção musical dos primeiros espetáculos de Bethânia, tendo também suas primeiras composições gravadas por Elizeth Cardoso e Nara Leão. Compôs para exibições de Helio Oiticica, Xico Chaves e Lygia Clark. Destacou-se em 1969, no Festival Internacional da Canção, com a canção “Gotham City”. Teve como parceiros musicais José Carlos Capinam e Waly Salomão, com quem compôs Vapor barato, sucesso na voz de Gal Costa. Em 1972, produziu Transa, obra-prima do período de Caetano Veloso no exílio, em Londres.

Em 60 anos de carreira, Jards Macalé lançou 13 álbuns de estúdio. Dentre os mais recentes, Besta Fera, de 2019, retratou o governo Bolsonaro como um período de trevas. Em 2021, lançou Síntese do Lance, em parceria com João Donato. Em 2023, o músico lançou Coração Bifurcado, com 12 canções que tratavam das diferentes formas do amor. Era uma tentativa de pacificar o país. “As pessoas começaram a brigar, o ódio foi plantado, filho não falava com mãe, sobrinho não falava com amigo, amigo não falava com professora, começaram todos a se xingar na internet, então eu digo: ‘ALERTA MÁXIMO!’. Só ouço falar de ódio, não ouço falar de amor? Até que o Lula, num dos seus primeiros discursos, lá em São Bernardo do Campo, começou a falar: ‘O que nós precisamos é de AMOR’. Aí, eu acordei! Ele disse 23 vezes a palavra ‘amor’! Então, nesta hora, o amor é um gesto político”, conta Jards, em entrevista à Continente.

No ensaio biográfico Eu só faço o que quero, o professor da PUC-Rio Fred Coelho assinala que, em diversos momentos da carreira, Macalé andou em grupos, mas nunca fez parte deles, porque estava preocupado em criar sua própria linguagem artística. "Para quem imaginava um Macalé ‘doidão’, vai se surpreender com sua disciplina trabalhadora, sua visão politizada do Brasil e outros elementos. Em artistas como Jards Macalé, precisamos entender a fina fronteira entre a doideira e o delírio. O delírio tem bases profundas nessa geração como discurso transformador da realidade estética e política do país.", afirmou o pesquisador à Continente.

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