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Surf em forma de som e imagem

O esporte se mantém como um poucos que têm desdobramento nas artes, além de gerar produtos na música, no cinema, na fotografia e na moda

TEXTO Marcelo Sá Barreto

01 de Setembro de 2012

Guitarrista e vocalista da Eddie, Fábio Trummer (à frente) tem a surf music como referência para compor

Guitarrista e vocalista da Eddie, Fábio Trummer (à frente) tem a surf music como referência para compor

Foto Divulgação

[conteúdo vinculado ao especial | ed. 141 | setembro 2012]

Fábio Trummer, líder da banda pernambucana Eddie,
não era ainda conhecido, quando se viu envolvido pela atmosfera do surf e suas trilhas musicais. Amante das pranchas e do mar, na adolescência, o caminho para a praia era uma diversão à parte, momento em que experimentava a mistura entre o esporte e as ondas sonoras. “Sem o som no toca-fitas do carro, o trajeto não era a mesma coisa”, lembra o vocalista.

A surf music inspirou o som da Eddie. “Somos uma banda de praia e esses elementos mexem com a gente. Tanto que várias de nossas letras falam sobre eles”, explica Trummer. Ele acrescenta que a música inspira o surfista e está ligada ao esporte de maneira única. “Cada um tem sua preferência. Nos vídeos e nos campeonatos, o som é importante. E isso liga o amante do esporte ainda mais à música.”

Surgida nos anos 1950, com Dick Dale, a surf music teve seu ápice com uma banda que até hoje é ícone: The Beach Boys, de som “praieiro” com levada rock’n’roll moderna para a época, e que em 1966 lançou seu principal álbum, Pet sounds, que imortalizou clássicos como Wouldn’t it be nice e Sloop John B. Ali nascia uma vertente que mais tarde seria o trampolim para a criação de grupos como Midnight Oil, Spy Vs. Spy e New Model Army. “A ligação entre o surf e a música é tão grande, que não são poucos os surfistas músicos, como Kelly Slater, Tom Currem, Rob Machado, Teco Padaratz, só para citar alguns”, comenta Trummer.


Kelly Slater é o surfista mais premiado da história do esporte. Foto: Divulgação

Na música, o surf situa-se num respeitado patamar; e, no cinema, o trabalho de anos foi o de reproduzir nas telas algo que pudesse ser fiel à cumplicidade resultante do íntimo relacionamento entre o surfista e a onda. A eterna busca pelas ondas perfeitas está na base de filmes como Endless summer, considerado um dos maiores clássicos da temática. “Bons filmes de surfe como Pacific vibrations, Five summer stories, Cristal voyager, Innermost limmits of pure fun, Evolution, Free ride, September sessions, Sons of fun e Endless summer são capazes de surpreender até o mais exigente diretor de fotografia”, comenta Júlio Adler, especialista no assunto e articulista da revista Hardcore, uma das maiores do segmento no Brasil.

Como, nas imagens, a vontade de impactar é maior que a de alisar o espectador, já na década de 1960, o diretor George Greenough foi celebrizado pela criação de uma grande-angular que permitisse filmar o surfista dentro de um tubo. “Nascia a primeira lente olho de peixe de que se tem registro”, diz o carioca. “Na literatura, o surf também é riquíssimo; pena termos pouca coisa publicada no Brasil. Mas destaco o escritor brasileiro Tito Rosembergue como obrigatório”, comenta. O norte-americano Matt Warshaw é considerado o maior historiador do esporte, autor das publicações The history of surfing e The encyclopedia of surfing, consideradas “bíblias” do gênero.

Com a força das redes sociais, e cada vez mais apreciado pela mídia não especializada, o surf tem sido projetado também entre o público leigo. Há quatro anos, uma série de fotos do surfista e fotógrafo Clark Little chamou a atenção do mundo. A concepção do artista de fotografar as ondas à beira-mar, com cores e texturas diferentes, gerou belas imagens, mudando conceitos estabelecidos há décadas. A resposta positiva impulsionou profissionais a expor fotografias até então desconhecidas, trazendo à tona uma produção rica de informação e beleza.


Teco Paradatz é um dos nomes que transitam entre o surf e a música. Foto: Divulgação

“A fine art, que hoje vemos com Clark, abre possibilidades para a fotografia de surf. Antes das digitais, com só 36 poses nas máquinas, tínhamos de cair na água para fotografar o surfista e sua manobra. Se sobrassem fotos, tentávamos algo mais artístico. Com as digitais e seus cartões de memória, temos mil e quinhentas oportunidades de fazer fotos nos mais diversos ângulos”, explica o fotógrafo pernambucano Clemente Coutinho. O ambiente ajuda. Na praia, há a possibilidade de 12 horas de claridade, entre o nascer e o pôr do sol do Brasil. É ali que o fotógrafo joga com a natureza e vários gráficos de luz no decorrer do dia.

“Isso faz com que o fotógrafo de surf seja uma fonte se inspiração permanente. Conseguimos inspirar quem não tem essa vivência. Eu tenho trabalhos ligados à fine art. E, certamente, profissionais como Clark Little, Sean Downey e Brian Bielmann guiaram-se por esse estalo, mostrando muita coisa nova”, diz Clemente. 

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