Um dos destaques da programação, Luzir é negro é solo autobiográfico do performer Marconi Bispo, que, a partir de memórias pessoais e familiares, investiga o racismo e suas manifestações na vida de um homem negro, gay, candomblecista e periférico.
Em busca de entender como o racismo afeta as relações íntimas, desde os primeiros elos dentro da família até as escolhas e não escolhas que determinam os relacionamentos na fase adulta, o ator Marconi Bispo procurou o diretor do Teatro de Fronteira para darem segmento à pesquisa a partir do biodrama e do teatro documental. “Para mim, era importante saber se o fato de ser candomblecista, por exemplo, e externar isso das mais variadas formas – deixar minhas guias de orixás aparentes, assumir nas redes sociais etc. – estava determinando o fato de estar sem ‘namorar’ há mais de 10 anos”, conta Marconi Bispo.
Em um vídeo-teaser divulgado na página do Teatro de Fronteira, Bispo dá uma mostra do que o público pode esperar do espetáculo. “Entendi que eu era negro quando uma chefe minha me chamou à sala dela e disse que eu não podia mais usar camisas que deixassem as minhas guias de orixás aparentes. Eu lembro que, do lado de cá da mesa dela, entendi que eu era negro”, compartilha, em trecho do vídeo.
E aprofunda o debate, ao falar sobre as relações de discriminação sobre o homem negro e gay: “Entendi, também, que eu era negro quando ia à boate Metrópole e não era paquerado por gays brancos, principalmente. Mas, entendi também que era negro quando, às 4h da manhã, já em desespero, querendo pegar alguém, eu tirava a camisa. Aí chegava alguém, mas antes de perguntar meu nome e me pedir um beijo, me perguntavam se, como todo negro, eu era bem-dotado. Mas o que acho engraçado é que o volume da minha autoestima nunca foi igual ao volume que se supunha ter embaixo da minha calça. Entendi que ser negro poderia ser, simplesmente, uma questão de volume”.
Na narrativa, as memórias de Marconi são cruzadas com fatos recentes do país, observando como o negro aparece em diversas dramaturgias – a exemplo de Os negros, de Jean Genet; Arena conta Zumbi, de Guarnieri e Boal; e Gota d’água, de Chico Buarque e Paulo Pontes – e em outras matrizes documentais, como as redes sociais, matérias e artigos de jornal e documentos históricos.