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Seleções vão à mesa

Os oito países já definidos para passar pelo Recife durante evento esportivo trazem uma bagagem rica de sabores e aromas

TEXTO Eduardo Sena

01 de Junho de 2014

Prato típico italiano é tão querido no Brasil, que faz parte da cesta básica oficial

Prato típico italiano é tão querido no Brasil, que faz parte da cesta básica oficial

Foto Alexandre Morais/Divulgação

Rua Prudente de Morais, nº 358, Sítio Histórico de Olinda. Verde, vermelho e branco nas paredes; nelas, além de alguns bibelôs, um mapa em forma de bota. Do corredor, observa-se uma cozinha de onde saem, sobretudo, massas e alguns molhos – entre os quais, o de tomate. No quintal, a brisa agita os pés de manjericão. Alguns gritos são ouvidos, não de discussão, voz alta mesmo. Já não se tem mais dúvidas de que se está em um pedaço da Itália nos trópicos. Trata-se da Don Francesco Trattoria, típica cantina da mamma de Francesco Carreta, italiano da cidade de Pádua, 53 anos, sendo 16 deles cozinhando em Olinda.

O reduto promete, como nunca antes, se encher de pares de pátria durante a Copa do Mundo, que tem início no próximo dia 12, com direito a jogo do Brasil na data, em São Paulo, e com partidas em Pernambuco a partir do dia 14 – um total de cinco certames, que serão disputados na Arena Pernambuco, em São Lourenço da Mata.


Tacos recheados com fajitas (carnes grelhadas), chilli (pasta de feijões que pode ser misturada com carne moída) e molhos como guacamole, tudo apimentado.
Foto: André Nery/Divulgação

Croácia, Costa do Marfim, Costa Rica, Alemanha, Estados Unidos, México, Japão e Itália são as seleções que desembarcarão por aqui, na primeira fase. E, muito além do toque de bola, essas nações visitantes trazem também temperos, aromas e sabores de suas terras.

A Itália, por exemplo, que para os brasileiros é no gramado um rival histórico, na mesa, possui uma afinidade inquestionável. Macarrão está na lista da cesta básica oficial do Brasil. E pouco importa se ele nasceu na China ou lá no “país da bota”, são os italianos que dominam sua arte com perfeição. Em tempo, vale pontuar que macarrão “é o nome genérico, em português, para os diversos tipos de pastas italianas”, como nos informa a escritora Maria Lúcia Gomensoro, em Pequeno dicionário de gastronomia (Objetiva).


Gallo Pinto é uma espécie de baião de dois com cebola, coentro, pimentão e especiarias, como cominho, da Costa Rica. Foto: André Nery/Divulgação

Em princípio, é fundamental saber que existem quatro famílias de massa: frescas e secas, com e sem ovos. E, a partir daí, nasce uma infinidade de tipos. Fettucine (fitas), orecchiette (orelhinhas), os maltagliati (pedaços malcortados), pappardele (fitas largas), os linguine (tipo de espaguete achatado) e o clássico espaguete (que, aliás, se divide em spaghettini, mais finos, e spaghettoni, mais grossos). E, para não limitar aquela nação apenas à massa, vale destacar entre os potenciais gastronômicos do país europeu a trufa branca da região de Alba (que chega a custar R$ 7 mil, o quilo) e o vinho espumante prosseco feito a partir da uva glera.

A propósito, a bebida tem denominação de origem controlada. Ou seja, só pode ser chamado de prosseco o vinho espumante feito com a uva glera, produzido nas vilas de Valdobbiadene e Conegliano, na região do Vêneto. A mesma regra vale para o queijo parmesão, típico de Parma.


Os frutos do mar são comuns no menu principal dos croatas.
Foto: André Nery/Divulgação

PARA OS FORTES
Igualmente gentílica é a tequila, destilado feito a partir de uma planta chamada agave azul com selo de município homônimo, no estado de Jalisco, do México, bebida que propicia um mergulho na alma dessa civilização vibrante, de personalidade que não passa despercebida.

O receituário mexicano pede estômagos fortes, pois é um dos países mais reputados pelo uso extensivo de pimenta. E do milho. “O cereal é base para muitas receitas típicas. Vai no preparo da tradicional tortilla – aquela massa redonda – transformada em burritos (enrolada como panqueca) e nachos, que são as tortillas crocantes e cortadas como triângulos”, explica o chef guatemalteco Fernando Escalante, que, depois de uma temporada naquele país, abriu no Recife o Escalantes, especializado em comida mexicana. Os carboidratos mexicanos ainda podem ser recheados com fajitas (carnes grelhadas), chilli (pasta de feijões que pode ser misturada com carne moída), molhos como o guacamole, de abacate, e creme azedo. Os tamales também são populares por lá e consistem numa parente da nossa pamonha, só que salgada. Além da pimenta, coentro e alho são abundantes nessa vívida gastronomia.


Na Alemanha, os melhores acompanhamentos para a linguiça são o chucrute e a batata. Foto: Divulgação

Falando em coentro, ele também não pode faltar na culinária da Costa Rica, país situado na América Central, tendo ao seu leste o mar caribenho, que ostenta o fato de estar entre as 22 democracias mais antigas do mundo. A coentro e arroz com feijão preto estão nas três refeições principais. “Não à toa, o prato nacional de lá atende pelo nome de gallo pinto, uma espécie de baião de dois com bastante cebola, coentro, pimentão e especiarias, como cominho”, explica Claudio Manoel, que oferece fortuitamente o preparo entre as sugestões do dia do seu Bistrot La Comédie, que funciona na Aliança Francesa do Derby, no Recife. Ou seja, combinação de temperos que o pernambucano não estranha – menos pelo fato de a receita ser servida no café da manhã dos costarriquenhos.

Literalmente na outra costa, a africana, a Costa do Marfim, fincada na África Ocidental, tem rotina alimentar baseada em ingredientes também recorrentes nas panelas brasileiras: mandioca, milho, amendoim, especiarias e muito pimentão. De lá, os pratos mais tradicionais são o maffè, que traz carne picada cozida com verduras e molho de amendoim. E o boarake, espécie de ensopado com peixe, folha de mandioca e óleo de dendê. No rol das sobremesas, um bolinho feito com farinhas de milho e amendoim é bastante comum nas mesas costa-marfinenses, ou, como preferem eles, ebúrneas.


A comida dos EUA inclui peixes, como o salmão, temperados no estilo americano.
Foto: Divulgação

E, se a ideia for buscar afinidades entre o país-sede da Copa e alhures, na hora de falar da Alemanha, tricampeã mundial de futebol, irá se esbarrar, ou melhor, brindar com cerveja. O país é o terceiro maior consumidor e produtor da bebida. Já no âmbito dos comes, um engarrafamento de clássicos: chucrute, joelho de porco, salsichas e pratos com batata-inglesa formam um retrato (ainda que incompleto) da cozinha alemã. “O chucrute nada mais é do que uma conserva de repolho fermentado, utilizado como acompanhamento nas refeições”, define o chef alemão radicado no Brasil, Heiko Grabolle. Os alemães também fazem fama com a charcutaria, com destaque para as salsichas, comumente servidas com mostardas. Entre as proteínas, a carne de porco se sobressai, uma vez que é mais barata e tem disponibilidade durante todo o ano.

REGRAS DO MAR
Na Croácia, as entressafras também não atingem a mesa. No sul do país, onde ficam as praias, a cozinha mediterrânea com frutos do mar frescos malcozidos ou grelhados rapidamente, temperados com azeite abundante e ervas é menu de ano todo. Nesse pedaço croata, o consumo de frutas in natura também é rotina. Já ao norte, durante o inverno, comida substanciosa e quente, como o sarma – um charutinho de repolho fermentado com carne de porco moída e arroz. Os croatas não dispensam preparos com batata-inglesa, sendo a versão predileta a assada no forno junto à carne. Combinação típica também é purica com mlinci, ou para brasileiro entender, peru assado com massa à base de trigo esticada. Já o strukli é a sobremesa obrigatória, um folhado com queijo fresco ou maçã.


O sushi é a iguaria japonesa mais famosa no Ocidente. Foto: Divulgação

A maçã, nos Estados Unidos, vira ingrediente para a salada típica. É misturada com batata, mostarda em grãos, vinagre, bacon, tomilho e cebola roxa, mix que é servido com o salmão assado em tábua de cedro na churrasqueira (o que faz uma defumação rápida), crosteado com semente de coentro, pimenta-do-reino, demerara, páprica doce, pimenta vermelha, alho, cebola e cominho – condimento usado amplamente na terra do Tio Sam. Segundo Carmen Dowling, cônsul interina de Diplomacia Pública, as influências na cozinha norte-americana são diversas, a mexicana é uma das mais fortes, mas ainda há regiões com sinais fortes da presença francesa; noutras, peruana, por exemplo.

Nas cidades do nordeste, o caldo/creme de batata com milho é receita que aquece o inverno pesado e pode ser acompanhada por salada. Já na Flórida, há grande presença de frutos do mar, apresentados com uma verve tropical: o camarão empanado em crosta de coco servido com molho de alguma fruta é símbolo. Igualmente, os pescados protagonizam os hábitos alimentares dos japoneses, que, por conta da religião budista, têm repulsa por carnes de animais e aves – ingredientes que só foram incorporados à cultura alimentar nipônica após a Era Meiji.

Por esse motivo, o peixe se tornou a mais tradicional fonte de proteínas da dieta nacional. E foi nessa circunstância que nasceu o sushi, provavelmente um dos maiores presentes que o Oriente deu ao Ocidente. “Su significa felicidade, shi, presidir; numa tradução literal, ‘presidir a felicidade’. Já em uma interpretação livre, pode soar como ‘comer peixe feliz’”, explica o chef e sushiman André Saburó, dos restaurantes nipônicos Quina do Futuro e Sumô. Os principais peixes utilizados por eles no preparo são o fugu, saiory, hirame e atum. Curiosidade: os restaurantes no Japão são especializados em um determinado tipo de cozinha, partindo do princípio de que um nível de excelência só pode ser atingido pela especialização. Assim, há casas especializadas em frituras (tempurá-ya), massas (soba-ya) e, claro, sushi

EDUARDO SENA, jornalista.

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