De carona nesse sentimento, Karim fez um filme marcado por uma atmosfera de fascínio e estranhamento, própria do ponto de vista estrangeiro, mais ligado à leveza, à intuição e ao descompromisso do que à cartilha do cinema convencional.
Em termos práticos e econômicos, o filme é uma coprodução oficial Brasil/Alemanha (a primeira dentro de um novo acordo de cooperação estabelecido entre os dois países). No entanto, em sua essência, Praia do Futuro não tem lugar definido, ao menos, não geograficamente.
A beleza plástica, garantida pelo fotógrafo Ali Olay Gözkay, é mais um ponto forte. A luz, ora buscada em ambiente tropical, ora na neblina invernal do Mar do Norte alemão, torna o filme uma peça única na filmografia de Karim, que já trabalhou com Walter Carvalho em Madame Satã e O céu de Suely, Heloísa Passos, em Viajo porque preciso, volto porque te amo, e Mauro Pinheiro Jr., em Abismo prateado.
De origem turca e formação cinematográfica alemã, Ali acrescenta a esse trabalho uma experiência anterior marcada pela poesia e pelo existencialismo, o que lhe confere uma nova e poderosa dimensão. Por exemplo, na segunda sequência subaquática, feita em domo cilíndrico de 30 metros de altura e elevador panorâmico, um rigoroso movimento vertical seduz e confunde a percepção de tempo e espaço, dando início ao bloco mais intenso e dinâmico do longa.
Fazendo jus à fama de extrair ótimas performances dos atores, Karim dessa vez foi além com Jesuíta Barbosa, talento premiado pelo papel do soldado Fininha, em Tatuagem, atualmente popularizado pelo trabalho na TV. No papel de irmão abandonado, Jesuíta cumpre a função de catalisar uma trama, acima de tudo, existencial.
Como nos quadrinhos de super-heróis, nos quais busca inspiração pop (além da boa trilha sonora, que inclui Heroes, de David Bowie), Praia do Futuro compõe um universo predominantemente masculino, em que as poucas mulheres são coadjuvantes (a colega de trabalho, a balconista) ou ausentes (a mãe). Por outro lado, ao contrário das aventuras de Aquaman e Speed Racer, em Praia do Futuro não existem vilões definidos. “Não acredito em vilões”, diz Karim. Se existem inimigos, eles são internos.
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