Em terras canarinhas, a pimenta é regra na culinária baiana. Acarajé, vatapá, cururu e abará parecem não funcionar, se não estiverem apimentados. Comidas herdeiras da cultura africana, uma boa parte vinda da cozinha dos baianos, mas hoje comum a todos, foram adaptações dos escravos trazidos ao Brasil colonial à comida de terreiro. Com poucos recursos, eles tiveram que se moldar a alguns costumes dos seus senhores para continuar a oferecer alimento aos seus deuses. Contudo, a pimenta nunca faltou e, assim, junto com o azeite de dendê, foi considerada por Gilberto Freyre uma das maiores contribuições africanas no regime brasileiro. A presença da pimenta é tão marcante na comida de terreiro, que, entre todos os orixás, apenas Oxalá rejeita o tempero.
BENEFÍCIOS
Há quem acredite ser mais forte por conseguir mascar pimenta como quem desfruta de um doce. Mas a verdade é que “estas pessoas não são melhores que as outras, apenas têm pouca sensibilidade à pimenta. Cerca de 50% da população possui um número menor de botões gustativos por cm3 em suas línguas”, garante o médico homeopata Marcio Bontempo, no livro Pimenta e seus benefícios à saúde.
Esse mito de resistência à pimenta é acompanhado de outros. À mesa, é comum ouvir comentários de que a pimenta pode causar gastrite, hemorroida e pressão alta. Uma grande injustiça, já que ela é classificada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como alimento funcional – aqueles que fazem parte da elite dos nutrientes e “contêm também componentes de ação protetora, medicinal, terapêutica e curativa especial”.
Não existem evidências que provem que a pimenta possa causar doenças como úlceras ou distúrbios digestivos, pelo contrário, estudos científicos e farmacêuticos no mundo inteiro vêm provando os benefícios que ela proporciona à saúde. Mas, claro, devem existir limites no consumo. “A pimenta não faz mal, se utilizada em quantidades sensatas. Ao contrário do que se propaga, em vez de irritar o estômago, a pimenta protege a mucosa estomacal, além de ser rica em propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias. No entanto, pessoas com problemas gastrintestinais devem consultar um médico experiente no assunto antes de consumir pimenta”, alerta Bontempo.
Versátil, a pimenta também se mostra eficaz em receitas doces. Foto: Divulgação
Por outro lado, é provado que a pimenta vermelha é uma fonte rica em nutrientes antioxidantes, principalmente as vitaminas A e C. “Apenas 30g de pimenta contêm 70mg de vitamina C, mais que 100% das necessidades diárias (RDA), bem como cerca de 70% da RDA para a vitamina A, sob a forma de betacaroteno. A pimenta tem também seis vezes mais vitamina C do que a laranja.” Ela também pode ajudar na redução de coágulos no sangue, por ser vasodilatadora; estimular a produção de endorfina no cérebro, hormônio que produz a sensação de bem-estar; e pode ser utilizada no tratamento para obesidade, já que é redutora de apetite.
Os estudos mais ousados sobre tratamentos médicos que usam substâncias presentes na pimenta apontam também para a prevenção no diabetes e câncer. Em 2002, pesquisadores da Universidade da Tasmânia, na Austrália, comprovaram, por meio de amostragem de sangue, que o consumo regular de um pimentão picante, parente próximo das pimentas, ajudou a equilibrar a insulina em 60% do grupo estudado, além de reduzir o nível de glicose e proporcionar uma menor secreção de peptídeo C (que elevado altera os níveis de glicose e de insulina). Já em Los Angeles, o doutor Akio Mori, da Universidade da Califórnia, publicou em 2006, no American Journal of Cancer Research, uma pesquisa que mostra os efeitos positivos da capsaicina (substância das pimentas vermelhas do gênero Capsicum) no combate ao câncer de próstata.
Com todos esses índices satisfatórios e valiosas propriedades, a pimenta mostra que sua exuberância visual e seu sabor marcante não são apenas truques para atrair a atenção dos comensais, mas são indícios de que vale a pena cair na sua tentação, por puro estímulo à boa saúde.
GABRIELA ALMEIDA, estudante de Jornalismo e estagiária da Continente.