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Galo de Souza

Ao grafite, com êxito

TEXTO Olivia de Souza

01 de Outubro de 2012

Assim como outros grafiteiros, Galo já impõe sua marca

Assim como outros grafiteiros, Galo já impõe sua marca

Foto Otavio de Souza

Ainda garoto, José Cordeiro de Melo Neto acreditava que a arte não podia ir mais além do que alguns dizeres pichados na parede. Porque, para um jovem da periferia, que cresceu entre as comunidades de Piedade, Várzea e Roda de Fogo, e se revoltava com qualquer manifestação artística exposta em museus e galerias, a adrenalina que lhe proporcionava o anonimato de pichar paredes às escondidas, durante as madrugadas, era muito mais excitante e parte de seu mundo. Os primeiros contatos com a cena hip-hop da década de 1990 deram a ele o entendimento de que poderia sair daquele anonimato para atuar como sujeito, alguém que poderia modificar a própria realidade e a de seu entorno. Hoje, com trabalhos reconhecidos no Brasil e no mundo, Galo de Souza – nome adotado dentro da cena – trabalha mais a partir de convites e encomendas para pintar (como ele chama o grafitar) do que pela própria iniciativa, e compreende a arte como algo muito maior, não apenas como mero objeto de decoração, mas de comunicação, intervenção urbana, educação e direito.


Desenho produzido pelo artista para o Parque Dona Lindu. Foto: Otavio de Souza

“Foi a música que me transformou”, declara o grafiteiro de 33 anos, 20 dedicados aos muros e paredes, incluindo a pichação. “Foi uma época em que o grafite era um negócio muito fechado, difícil de alcançar. O rap me deu essa possibilidade de entrar para o universo da arte, de entender que era possível pensar além”, conta Galo, que, a partir de então, passou a buscar informações para ampliar seu repertório cultural, investindo em estudos sobre artes plásticas, muralismo mexicano, Cubismo e Expressionismo. O interesse pela situação política de países como Cuba, Nigéria, Jamaica e o próprio Brasil deu forte carga política ao seu trabalho. “A partir desse ponto, quis deixar de pichar, para pintar, escrever.”


Grafite marca presença em galeria de arte. Foto: Divulgação

Sua personalidade pacífica lhe rendeu sabedoria e paz de espírito suficientes para não terminar como outros companheiros de jornada. “Já vi muita gente morrer por se envolver com coisa errada”, comenta Galo, que acredita na salvação pela arte. Essa experiência de quem veio da clandestinidade lhe deu a vivência necessária para ir quebrando barreiras. Ele é um dos responsáveis por criar e fomentar um movimento que se sobrepôs à própria pichação, hoje vista em menor quantidade no Recife. Isso se deve, principalmente, à criação do coletivo Êxito D’Rua, projeto social desenvolvido pelo grafiteiro, que atua em quatro linhas: educação, música, produções independentes e intervenções urbanas. O projeto, que já completou 10 anos, possibilitou a criação de uma rede de grafitagem na cidade.

 


Desenho Rimador foi feito em rua de Fortaleza. Imagem: Divulgação

O estilo adotado é o freestyle, de quem pega o spray e cria na hora, sem rascunho - porém sem abrir mão da técnica. Hoje em dia, Galo viaja por todo o país, mostrando o seu trabalho e trocando experiências com outros artistas. Recebe convites para pintar obras públicas, como o Parque Dona Lindu e o Centro de Artesanato – novo equipamento de cultura do Recife.


Grafite colore muro lateral do Aeroporto Internacional do Recife. Foto: Divulgação

Para quem já foi considerado vândalo, sendo por vezes punido pela polícia com o rosto todo pichado, esse reconhecimento da grafitagem como arte resulta de esforço e dedicação. “Algumas pessoas estão tendo sensibilidade suficiente para abrir as portas, isso faz com que o grafite tenha mais autonomia. O artista tem a liberdade de criar e dialogar com os sentimentos, o resultado do que ele faz é um pouco dessa carga toda, é a nossa história, e consequentemente, a história da nossa cidade.” 

OLIVIA DE SOUZA, estudante de Jornalismo e estagiária da Continente.

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