Simples, direto, cru. Todo pintor recita a seu modo o verso de Pablo Neruda “ponho minha alma onde quero”. E encontro-o, na visita que fiz ao seu atelier, ou para melhor dizer, retiro, no topo de um edifício bem no centro do Recife, num 12º andar da Av. Dantas Barreto, o que me lembrou o monte do beato Ubaldo, onde, diz a lenda, São Francisco domesticou o lobo, na cidade de Gubbio, e de fato ventava e fazia frio neste agosto de 2012, apesar de em pleno centro da capital pernambucana, de onde se tem uma vista única de mar e rio se entrelaçando, rara em qualquer lugar do mundo, creio, encontrando-o, como dizia, a folhear um livro do primo renascimento (primeiro renascimento), o Trezentos italiano, e justamente, tão encantado fiquei, pois também uma das minhas predileções, que de fato as primeiras notas para esta croniqueta tomei não dos quadros de Eduardo mas dos seneses Giovanni di Paolo, Taddeo di Bartolo, Sano di Pietro, Matteo di Giovanni, o sublime em arte, quando o renascimento ainda era estático, imóvel, a perspectiva ainda a servir o homem, antes de ficarmos dela escravos, preparação necessária para olhar os quadros de Eduardo. Você precisa olhar os quadros de Eduardo, nus, paisagens, o que seja, como visões celestiais, como seres que por condescendência se mortalizaram durante alguns instantes diante de quem acharam por bem considerar digno se mostrarem, deixarem-se ver sem reservas, ou melhor, contemplar. Eduardo não se vê, se contempla. Sua visão é sagrada.
Ao mesmo tempo, trazendo-nos para hoje, você tem que ver seu autorretrato, por exemplo, em presença de Cézanne, isto é, como se estivesse em presença de Cézanne. Aqui um parêntese. Eduardo participa da protogeometria de Cézanne, a geometrização que através de Picasso e Braque deu no cubismo, no abstracionismo geométrico, na pintura ótica. Mas isso é outra história. Eduardo precisa de um ordenamento feito por ele para entender a natureza, com frequência na disposição da pincelada nos grandes planos. É antes um pintor racional, isto é, clássico. Mas não que não seja emotivo. Quando falo do sublime, do sagrado, como se seus quadros estivessem parados, estáticos, contemplativos, fora do mundo e do tempo, quero salientar o seu sentimento profundo, sua religiosidade. Mas nada de espectros. Às vezes chega a uma carnalidade insuperável (Mulher na rede verde, Francisca). E, com ser analítico, não exclui a grandiosidade, a magnificência (Grande céu, Paisagem do sertão). Ou o flagrante (Banho de mar). E os mais altos acordes do lirismo (Paixão).
JOSÉ CLAÚDIO, artista plástico.