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Praticando a não violência

TEXTO Guilherme Carvalho

01 de Março de 2012

Guilherme Carvalho

Guilherme Carvalho

Foto Divulgação

O princípio básico do consumo consciente sugere que o modo de cada cidadão usar o seu dinheiro pode direcionar a maneira pela qual o mercado opera. É simples: se você compra roupas de uma certa marca, estimula a produção e a cadeia de fornecimento de roupas daquele tipo. E isso vale para qualquer produto ou serviço que alguém seja capaz de imaginar.

Entretanto, o consumidor brasileiro ainda se preocupa pouco com as potenciais implicações éticas das suas compras. Ser um consumidor mais responsável não é muito difícil. Basta um mínimo de pesquisa e, acima de tudo, honestidade consigo mesmo.

Em linhas gerais, devemos fazer a nós mesmos algumas perguntas simples para averiguar quais os possíveis envolvimentos morais em adquirir um bem ou serviço. Uma das mais importantes é: “Alguém foi submetido à violência para que eu pudesse adquirir isso?”

Seduzidos pelo preço, pela aparência e pelo desejo de tornar nossas vidas mais fáceis e prazerosas, tendemos a nos abster de tal responsabilidade. Mas não podemos pular esse passo nas nossas decisões de compra; isso significa resignar-se à ignorância e recusar-se a tentar corrigir hábitos de consumo de forma a torná-los mais coerentes com os nossos princípios e valores. Uma verdadeira covardia.

Ao passar displicentemente no caixa, confirmando tal recusa, tomamos decisões que podem financiar a violência. Nesse momento – o da compra –, o cidadão inocente e bem-intencionado torna-se aquele que violenta, bate, escraviza, devasta, confina, explora e mata. Seja com uma peça de roupa produzida com trabalho escravo, um pedaço de carne animal produzido com crueldade ou um móvel fabricado a partir de desmatamento ilegal, o consumidor torna-se o mandante do crime.

Evidentemente, o consumo ético e não violento pode encontrar limitações. Um consumidor consciente poderia, por exemplo, buscar e não encontrar informações confiáveis sobre determinada cadeia produtiva. Em outro caso, alguém poderia alegar que é difícil escolher, porque todas as empresas realizam algo de errado. No entanto, tais limitações não nos eximem da responsabilidade de fazer o possível para minimizar nossa contribuição financeira a processos injustos ou violentos.

Se, de fato, pretendemos construir um mundo menos violento nas próximas décadas, não basta que se evitem guerras entre nações e que conflitos pessoais sejam resolvidos pacificamente. Precisamos também – para ontem – promover a não violência através das relações de mercado, escolhendo conscientemente o que comemos, o que vestimos e a quem compramos. 

GUILHERME CARVALHO, biólogo e gerente de campanhas da Humane Society International (HSI) no Brasil.

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