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O beabá dos processos criativos

Livro organizado pelo pesquisador Sebastião Pedrosa apresenta para professores a poética e o modo de produção de 33 artistas

TEXTO Mariana Oliveira

01 de Outubro de 2011

Imagem Montagem a partir de fotos de divulgação

Há algum tempo, a disciplina Artes faz parte do currículo obrigatório dos ensinos fundamental e médio das escolas brasileiras, devendo ser tratada com a mesma relevância que matérias como Matemática, Ciências e Língua Portuguesa. Porém, na prática, não é isso que se constata ao observar a carga horária destinada a essa disciplina e o tratamento que ela recebe na grade curricular. A aula de Artes funciona, quase sempre, como um espaço em que as crianças e adolescentes recebem material e vão, durante aquelas horas, produzir algo, pintar, modelar...

Contudo, também não é de hoje que se sabe que essa não seria a maneira ideal de trabalhar a arte. O Método Triangular, proposto pela pesquisadora em arte-educação Ana Mae Barbosa, e referendado em todo mundo, constata que, para se aprender arte, é preciso ver, fazer e contextualizar. Sem esses três pontos, a formação não ocorre de forma plena. A aplicação do método torna-se bastante difícil num cenário em que os professores de Artes são designados, muitas vezes, sem ter qualquer conhecimento no campo. Sem a formação adequada do professor, levar conhecimentos da arte para a sala de aula – de maneira reflexiva – é algo quase impossível.

Foi pensando em ajudar na formação desses professores que o também professor da graduação em Artes Plásticas da Universidade Federal de Pernambuco, Sebastião Pedrosa, concebeu o livro O artista contemporâneo pernambucano e o ensino da arte, patrocinado pelo edital da Petrobras Cultural. A ideia nasceu de uma espécie de projeto de extensão realizado pelo departamento de Teoria da Arte da UFPE, em parceria com o diretório acadêmico do curso de Artes Plásticas, que convidava artistas pernambucanos para ir à universidade e conversar com os alunos da graduação sobre seu processo criativo. “Tivemos uma quantidade enorme de artistas, e eu pensava: a gente traz essas pessoas aqui, mas não faz nenhum registro, esse material poderia ter uma utilidade ainda maior. Em 2007, a aluna Clarissa Diniz era a presidente do diretório acadêmico e intensificamos ainda mais essa atividade. Ela passou a registrar, via MP3, as conversas. Foi quando formatei o projeto e ele foi aprovado pela Petrobras em 2008”, explica o organizador Sebastião Pedrosa.

Após a aprovação, ele percebeu que boa parte dos registros havia sido perdida e que seria preciso retomar o contato com os participantes e coletar informações do zero. Como a Petrobras exigia de imediato o nome de todos os artistas que fariam parte do livro junto com uma carta de anuência, Sebastião Pedrosa começou sua busca. Essa exigência, de algum modo, serviu como um critério na seleção dos 33 artistas que compõem o volume. O primeiro requisito era ter participado das conversas na UFPE, entre esses, os primeiros que foram encontrados por Pedrosa compuseram a lista. “Por conta dessa pressão do patrocinador, alguns artistas que haviam participado não entraram no livro. Paulo Bruscky é um exemplo. Ficaram muitos de fora, daí o nosso desejo de que venha outro título”, conta Pedrosa.

Com os artistas definidos, foi formada uma equipe de trabalho com professores do curso de Artes Plásticas. Inicialmente, foi preciso amadurecer as ideias e definir o formato da edição. “Havia a clareza de que resultaria num produto para ajudar o professor, mas não tínhamos definido o formato”, detalha Pedrosa, que optou por estruturar o livro com artigos que tratassem do processo criativo de cada um dos artistas. A obra reflete a pluralidade da produção pernambucana contemporânea, trazendoobras mais formais junto a outras mais experimentais, sem qualquer hierarquia entre elas. Esse desejo de não valorar, de não dar mais importância a um que a outro artista, fica claro na opção de organizá-los em ordem alfabética, com a mesma quantidade de imagens, e com espaços similares. Assim, o consagrado Gil Vicente é tratado da mesma forma que o jovem Aslan Cabral.

A análise da obra dos 33 artistas foi dividida entre os participantes, de forma igualitária, seguindo critérios de afinidade. Ao final, por demandas individuais, a divisão inicial foi refeita. Alguns assinam apenas um texto, outros participaram mais ativamente, como a professora Madalena Zaccara, que escreveu sobre 10 artistas. “Recebemos críticas que diziam que o livro não tinha um equilíbrio neste sentido, mas isso não importa, essa foi a dinâmica possível”, justifica Pedrosa.

A primeira parte da publicação traz os artigos críticos que se debruçam sobre o processo criativo dos artistas, sem esquecer de apresentar um pouco da sua biografia. A produção contemporânea pernambucana é contextualizada e, muitas vezes, relacionada com movimentos e personagens de outras épocas, lugares e países. Essas referências abrem espaço para uma reflexão mais profunda sobre a própria arte, sua história e o momento que se vive hoje. Todas as referências bibliográficas utilizadas estão à disposição dos leitores, para um maior aprofundamento nos temas trabalhados. “Não gostaríamos de fazer um livro prescritivo, como um livro didático, com um ‘faça assim’, ‘leia assim’. A gente não acredita nessa forma”, explica o organizador, pontuando que a publicação não pretende dar todas as respostas, mas apenas trazer um recorte da obra dos artistas. Pensando nisso, o design do livro oferece muitos espaços em branco que, segundo Pedrosa, estão ali para que o professor possa fazer anotações, rabiscar.

A segunda parte, intitulada Pensando na sala de aula, traz três artigos voltados para tópicos importantes da arte-educação, todos assinados por Sebastião Pedrosa. Há também um glossário, em que estão reunidos os principais verbetes do universo artístico que aparecem na obra e um DVD com cinco imagens de cada artista para serem utilizadas na sala de aula. O livro está sendo distribuído gratuitamente, além de ser disponibilizado nas bibliotecas públicas estaduais e em centros culturais.

Apesar de ser voltada para professores de ensino fundamental e médio, a obra pode também atrair o público leigo e estudantes de graduação que desejem conhecer um pouco mais sobre o processo criativo de artistas díspares, mas que seguem produzindo intensamente em Pernambuco. 

MARIANA OLIVEIRA, repórter especial da revista Continente.

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