André Balaio
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Eu quero chorar em um multiplex. Quero histórias plausíveis de seres humanos que tenham angústias, dúvidas, frustrações e crises iguais às minhas. Ou até um pouco maiores. Mas só encontro nas telas os casais abestalhados das comédias românticas, os vampiros sarados do terror adolescente (que em nada lembram o Drácula de Christopher Lee), os super-heróis das enésimas adaptações dos quadrinhos, os garotos ansiosos por perder a virgindade nas comédias teens (embora eu ache Superbad genial), além de ETs, agentes secretos, policiais, videntes e cantores. Não existe mais drama no cinema comercial. E, por drama, entenda-se o sentido vindo do teatro, da representação da vida comum. Porque homem comum só existe para Hollywood se fizer algo espetacular que o torne um herói. Não se encontram mais jovens sofridas como a que Lillian Gish interpretou no clássico mudo Lírio partido (Broken blossoms), do pioneiro D. W. Griffith. Nem dor igual à do jovem casal vivido por Ali McGraw e Ryan O’Neal em Love story – Uma história de amor, condenado ao triste fim pelas diferenças sociais e pelo câncer.
Ainda hoje, seguidas gerações vibram e choram com E o vento levou e Casablanca. O repertório hollywoodiano clássico é recheado de personagens com perfil psicológico bem-desenhado, problemas e dilemas morais. Os filmes de Howard Hawks, William Wyler, John Huston, Billy Wilder, Elia Kazan e mesmo os westerns de John Ford, as comédias humanistas de Frank Capra e os melodramas de Douglas Sirk sempre aprofundaram os seus personagens a ponto de torná-los próximos do espectador. Na Hollywood atual – como no poema de Fernando Pessoa –, todos têm sido campeões em tudo. O que se oferece e se consome é o puro escapismo, a fuga da realidade.
É difícil estabelecer quando essa tendência começou. Até arrisco dizer que está relacionada à nova ordem pós-11 de setembro. Mas uma coisa é certa: ela representa uma sociedade cada vez mais apegada a sensações superficiais e descartáveis. Claro que ainda existe humanidade nas telas, só que em obras de diretores que não seguem a cartilha dos grandes estúdios. É o caso de Lars Von Trier e Terrence Malick, que recentemente nos tocaram com seus respectivos Melancolia e A árvore da vida. Porém, o público que eles alcançam é pequeno e seleto, bem distante da alegre massa que se farta com osblockbusters em salas barulhentas e festivas. Porque chorar em multiplex, hoje em dia, só se for de raiva.
ANDRÉ BALAIO, músico e fã de Billy Wilder e John Ford.