“O meu nome é Mãe, até tenho outro de pia, como tantas se chamam Maria, que é santa e tem romaria, me deram de chamar Mãe sem ser Maria” – apresenta-se a protagonista, e única personagem sem nome da peça (interpretada pela experiente atriz Auricéia Fraga), afinal, como afirma o dito popular: “Mãe é tudo igual, só muda o endereço”. E igual, no caso específico deste espetáculo, significa a similaridade do amor incondicional ao filho, que faz uma mulher comum se tornar líder social e/ou ativista política. Sua nobre causa? Abraçar a causa do amado filho. Mesmo sem entender direito os porquês implícitos, as razões da luta, ela peleja incansavelmente.
Distâncias geográficas e temporais à parte, a mãe do operário russo do início do século 20 da obra de Gorki – que se envolve nas manifestações revolucionárias – é igual à mãe nordestina do trabalhador de engenho de açúcar que se torna líder sindical, na época da ditadura militar brasileira, criada por Carlos Carvalho.
Com um enredo local e global ao mesmo tempo, A peleja da mãe nas terras do senhor do açúcar evidencia o papel das mães na construção da história. As mães da Praça de Maio, dos revolucionários russos e de tantas outras nacionalidades, as mães dos soldados mortos em combate, dos presos políticos, as mães dos mártires, as mães dos grandes líderes... todas estão ali representadas na força e dedicação dessa personagem abnegada, que sequer possui nome próprio.
“Nós, gente do povo, sentimos tudo, mas não sabemos nos exprimir. Temos vergonha, porque compreendemos, mas não sabemos dizer o que compreendemos. E, muitas vezes, por causa desse embaraço, revoltamo-nos contra os nossos pensamentos. A vida bate-nos, tortura-nos de todas as maneiras e feitios, queremos descansar, mas os pensamentos não nos largam.”
Esse trecho do livro de Gorki retrata a vida cinzenta da época, o ar pesado do ambiente das manifestações populares dos operários. Mas, ao contrário do tom duro presente nos momentos mais trágicos do romance, a versão de Carlos Carvalho mescla a espontaneidade típica dos brincantes e a disciplina das técnicas teatrais, costurados pela sua condução precisa e detalhista das cenas.
Resultado: drama e comédia se misturam, fazendo – como afirma um dos integrantes do elenco, o ator Flávio Renovatto – “o equilíbrio acontecer no palco, fazendo um teatro reflexivo, provocador, crítico, mas também divertido e muito festivo”.
CHRISTIANNE GALDINO, jornalista, professora e mestre em Comunicação Rural.