Música

Canções de Natal parecem eternas, com ou sem neve

White Christmas, de Irving Berlin, é a música natalina mais regravada no mundo, mas nunca fez grande sucesso no Brasil em inglês ou na versão em português

TEXTO José Teles

17 de Dezembro de 2025

Irving Berlin compôs

Irving Berlin compôs "White Christmas" durante um verão na Califórnia, onde não havia, claro, neve caindo

Foto Domínio público

O compositor Irving Berlin chegou em casa com uma ideia de música na cabeça. Trancou-se no escritório, não muito tempo depois, foi até a secretária, e pediu-lhe que datilografasse uma letra, dizendo: “Acabei de compor a mais bela canção que já foi feita”. O título? “White Christmas”, claro. Curioso é que seus versos de abertura falam de neve caindo, e ele a criou no verão de Los Angeles, onde morava.

“White Christmas” vendeu 100 milhões de discos (50 milhões apenas com o cantor Bing Crosby). Ganha de “Yesterday” como a canção com mais regravações até hoje nas mais diversas línguas. E, aí, Irving Berlin tem o tempo a seu favor. Ele compôs “White Christmas” em 1942, ano em que Paul McCartney nasceu. Mais uma curiosidade: a canção popular mais cantada na grande festa cristã pelos americanos foi composta por um imigrante russo e judeu. O nome de batismo de Irving Berlin era Israel Isidore Beilin.

Se bem que, das duas canções tradicionais mais populares do Natal europeu, do Canadá e Estados Unidos, uma é austríaca, “Stille nacht”, e a outra francesa, “Cantique du Nöel” (1843). Esta segunda tem letra baseada em um poema de Placide Papeau, com melodia de Adolphe Adam. A primeira foi composta em 1818, por Franz Gruber e Joseph Mohr, em Obendorf, na região de Salzburg. Para usar um termo que, na época, não era usado com o significado atual: viralizou. Em relativamente pouco tempo, alcançavam vários países.

“Cantique du Nöel” chegou aos Estados Unidos, foi traduzida para o inglês e ganhou a primeira gravação, em 1905, com o título de “O holy night” (agora mais conhecida com Mariah Carey). “Stille nacht” teve o mesmo destino. Logo estava sendo cantada na Rússia, na corte do imperador da Áustria, na Prússia. Nos Estados Unidos, ganhou letra e título em inglês, Silent night. Já foi vertida para cerca de 300 idiomas.

Ressaltar canções natalinas americanas e europeias é tarefa quase impossível. A cada Natal, são lançados dezenas de álbuns com canções da época. É raro o artista, de qualquer gênero, que não grave seu álbum natalino. Elvis Presley, Frank Sinatra, The Beach Boys, The Beatles (restrito aos sócios do fã-clube oficial), alguns dos mais famosos deles.

NATAL TROPICAL
O Brasil é o único país em que uma das músicas mais detestadas é uma canção natalina. Sim, ela: “Então é natal/o que você fez?”. Os versos iniciais de "Então é Natal", versão de Cláudio Rabello para "Happy Xmas (War is over)", de John Lennon & Yoko Ono, lançada em 1971, creditada a Plastic Ono Band. Em 1995, Simone a incluiu no LP 25 de dezembro, o primeiro, na discografia brasileira, com repertório totalmente natalino. É provável que a música angariou tanta antipatia pela avalanche de execuções. O álbum vendeu mais de um 1 milhão de cópias.

Porém, a mais tocada no natal brasileiro aínda é "Noite feliz", versão da austríaca "Heilige nacht" (Noite silenciosa), de 1818, composta por Joseph Mohr e Franz Gruber. A versão cantada no Brasil é do frade alemão Pedro Sinzing (naturalizado brasileiro). E a que melhor traduz o Natal real do brasileiro é a marchinha "Boas festas", de Assis Valente, lançada em 1933, por Carlos Galhardo. Apesar da letra, que retrata o Natal de quem está à margem da festa, é uma das canções brasileiras de época mais regravadas. Tem regravação até para crianças, feita pelo palhaço Carequinha.

Outra brasileira que caiu nas graças do povo foi "Natal das crianças", de Otávio Henrique de Oliveira, mais conhecido como Blecaute, o general da banda, cantor de marchinhas. Há 70 anos, ele compôs e gravou uma valsinha natalina, das mais bem sucedidas feitas por artistas da música popular brasileira, com dezenas de regravações, incluindo uma de Simone, mas também de Silvio Santos e do palhaço Carequinha. Aliás, a primeira música natalina gravada no país, em 1913, tem o título de "Natal das crianças pobres", e foi lançada pela Banda do 10º Regimento de Infantaria do Exército em disco Odeon.

FORRÓ
A mais bem-sucedida das canções Natal na música popular, "White Christmas", de Irving Berlin, de 1942, nunca pegou no Brasil, por incompatibilidade de climas. A letra, que retrata um Natal em que a neve marca a paisagem, não se encaixa na época mais torridamente ensolarada de um país tropical, o mês de dezembro. A primeira versão da música no Brasil é de 1956, feita por Marino Pinto, e lançada por Nelson Gonçalves não aconteceu. Os versos iniciais esclarecem o motivo: “Lá fora a neve cai/ sinos festejam a noite de Natal/ os pinheiros brancos de neve/ são como torres de uma catedral”.

Agora transponham tal versão para o Nordeste. Embora o termo “caatinga” tenha origem no tupi-guarani, significando “mata branca”, soa no mínimo esquisito a mesma versão de Marino Pinto interpretada em ritmo de xote. Assim o fez o cantor Cesar Amaral, bem-acompanhado por Luizinho de Serra. A música está no CD Natal sanfonado (2008), um disco inteiro de canções natalinas adaptadas aos ritmos do forró. O disco é aberto com Santanna, O Cantador interpretando a mais bela das músicas natalinas nordestinas, "Cartão de Natal", de Zé Dantas e Luiz Gonzaga, que a lançou em 1954, embora sem o sucesso merecido. Do citado CD é o clássico natalino, "O velhinho", de Otávio Babo Filho, numa deliciosa versão de Dominguinhos.

Entre as canções natalinas brasileiras, a menos conhecida foi composta por um dos mais importantes autores da MPB. Intitula-se "Tão bom que foi o Natal", marchinha que Chico Buarque escreveu, em 1967, por encomenda da Clineu Rocha, imobiliária paulista, para ser doado de brinde. Só tocou na casa de quem recebeu o disquinho da empresa. Até agora não pegou nas mídias sociais.

Tem quase 70 anos de lançado o "novo hit" natalino na redes sociais "Jingle bell rock" (Joe Beal & Jim Boothe), lançada por Bobby Helms (1957). A música viralizou. É o maior sucesso para os festejos do Instagram no Brasil.

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