Para Tatto Medinni, convidado pelo diretor para interpretar Mariano, o texto se mostrou um desafio. “Como compor esse personagem sem escorregar pelo óbvio, pela alegoria, pelo clichê? Aceitei o papel pela possibilidade de superação, por tudo que Mariano pode me enriquecer como ator”, explica Medinni. Ele esteve em cartaz recentemente com o Coletivo Angu de Teatro em Ópera, texto de Newton Moreno, e com a Trupe Ensaia Aqui e Acolá, na peça O amor de Clotilde por um certo Leandro Dantas, que circulou o país ano passado, através do Palco Giratório, projeto do Sesc que promove festivais e a circulação de espetáculos em todos os estados.
A terceira atriz que compõe o elenco é Ana Cláudia Wanguestel. “O processo de trabalho de Eron Villar tem muita sensibilidade. A pesquisa que estamos fazendo, as referências trazidas, a preparação do ator, a forma como ele lida com a dramaturgia”, explica a atriz. “Vivenciamos um processo pleno de liberdade, sempre com a orientação do diretor, mas de forma coletiva e com autonomia para a criação do ator”, complementa Tatto Medinni. “A peça fala de amor: toca em questões importantes, mas sempre com uma delicadeza profunda. E Tia Augusta carrega uma dicotomia muito real: apesar de amorosa com o sobrinho, ela não se exime quando precisa ser dura, transforma-se no elo que os dois irmãos têm com a realidade”, analisa Ana Cláudia.
Embora essa não seja a temática central do espetáculo, o problema mental de Mariano ainda faz refletir sobre assuntos que muitas vezes são negados, escondidos, encobertos pelo preconceito que teima em ser maior do que o esclarecimento. Não há lições, moral da história, resultados prontos. Cada um tire as próprias conclusões, depois do que vir no palco. Mas não será um jogo no escuro: no elementar, no minimalismo e na subjetividade trazidos à tona por Mariano, irmão meu, o público logo deve se reconhecer.
No palco, alguns símbolos se desdobram e assumem múltiplas funcionalidades. A mala representa a espera, o desejo de ir embora, a ânsia pelo novo, pelo momento do reencontro. As portas trazem possibilidades que vão desde a fuga até a volta para casa. “São elementos-chave na encenação: as malas, as portas, os mapas. A luz segue a proposta da direção de arte e ambienta a poesia que já está presente no texto”, explica o diretor e iluminador.
O grupo tenta seguir o que diz Manoel de Barros, que fala de poesia, mas bem poderia ser de teatro também: “Para entender, nós temos dois caminhos: o da sensibilidade, que é o entendimento do corpo; e o da inteligência, que é o entendimento do espírito. Eu escrevo com o corpo. Poesia não é para compreender, mas para incorporar”.
POLLYANNA DINIZ, jornalista e organizadora do blog Satisfeita Yolanda?.