PROTAGONISMOS
Percebendo a ligação entre arte e política como uma tradição em Pernambuco e reconhecendo o contexto histórico de redemocratização do recorte da pesquisa, esses temas são recorrentes nas entrevistas e nas fotografias reunidas no livro. Uma das obras de destaque nesse contexto é agora tema do pós-doutorado de Joana D’arc, a série de arte-postal de Raúl Córdula intitulada O país da saudade, na qual ele enviava folhas de papel ofício pelo correio e esperava intervenções, dentro do tema que o título sugere, a serem devolvidas. Com o sentimento de urgência diminuído em relação às décadas passadas, a política começa a se apresentar mais como uma incorporação das obras e se afastar de estratégias mais panfletárias.
Três grupos são protagonizados e ganham destaque no livro: Carasparanambuco, Formiga Sabe que Roça Come e Quarta Zona de Arte. Eles são exemplos da criação de uma autonomia e independência profissional que possibilitavam a inserção no campo, e permitiam o caráter inovador e experimental que marcava os grupos. O primeiro foi fundado em 1986, por oito jovens artistas em início de carreira, a fim de se inserir no cenário das artes plásticas e fundar eventos relacionados ao assunto na cidade. O livro traz entrevistas com alguns dos integrantes, como Rinaldo Silva, Marcelo Silveira e Maurício Silva, este último fundador e apontado como líder do grupo.
O Formiga Sabe que Roça Come nega a categoria de “grupo”, uma vez que os integrantes se reuniram para a elaboração de um evento itinerante (em locais não convencionais, com a proposta de difundir a arte) e que previa várias exposições. Diferentemente do Carasparanambuco – que buscava um reconhecimento em lugares consolidados que garantissem o profissionalismo –, o Formiga buscava locais não institucionalizados. O Quarta Zona, ateliê coletivo e espaço cultural que ficava situado na Avenida Marquês de Olinda, tinha uma forte atitude política, fundando brigadas e discutindo Teoria da Arte.
Quando perguntada sobre as possíveis similitudes entre os coletivos da época, Joana D’Arc afirma: “O ponto em comum é que eram todos jovens, no Nordeste do Brasil – o que é importante –, que desejavam ser artistas legitimados e legitimadores. Eles produziram sua própria identidade e a levaram diretamente para a imprensa. Não havia essa mediação de hoje, de produção, assessoria de imprensa etc.”.
Embora esses agrupamentos ganhem destaque, o panorama é maior, desvendando a repercussão dos artistas locais nesse cenário, a relação com a imprensa e com a crítica, as influências de grandes nomes na produção recifense, e também o contrário. O olhar crítico, mais do que um simples relato, torna Cartografia das artes plásticas no Recife dos anos 1980: deslocamentos póeticos e experimentais um livro importante, não só como um resgate histórico, mas como fundamental aparato teórico para uma análise da produção, e seuslugares de inserção, realizada hoje.
PETHRUS TIBÚRCIO, estudante de Jornalismo e estagiário da Continente.