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A garça malferida

TEXTO LUZILÁ GONÇALVES FERREIRA
FOTOS EDUARDO QUEIROGA

01 de Novembro de 2011

Foto Eduardo Queiroga

Talvez um outro motivo daquela devassidão reinante no Recife fosse a falta de adaptação ao meio, que transparecia, entre outras coisas, nas vestimentas das pessoas – que se trajavam com roupas vindas da Holanda – e até na alimentação.

Às vezes, Andresa e Adriaen eram convidados a almoçar em casa de amigos e se espantavam com seus modos de conversar costumes da Holanda, sem empreender um mínimo esforço de aculturação. Jeuriaen e Marieta haviam sido um exemplo disso. Apesar do esforço evidente para se amoldarem aos usos culinários da terra onde pretendiam habitar definitivamente, continuavam a viver como na Holanda. Não comiam nunca a carne de bodes e carneiros do mercado, preferindo-lhes as carnes secas e salgadas que os navios traziam. Aos peixes frescos, cheirando a alga do mar, preferiam o bacalhau ressecado, o arenque defumado, o salmão rosado que os navios traziam no seu bojo. Preparavam tudo isso ao modo deles, cozidos em vinho da Espanha ou do Reno. Peixe cozido no leite de coco, como os escravos haviam ensinado a fazer os da terra, tão bom ao paladar, nem em sonhos comeria um holandês.



Marieta e Jeuriaen franziam o nariz ante o queijo de cabra da nova terra, lembrando que os do Reino e da Holanda eram infinitamente superiores. Ao coentro e à cebolinha nativos eles preferiam as alcaparras e azeitonas de além-mar. E as frutas frescas – com exceção da uvas de Itamaracá ou Olinda – eram substituídas por passas, figos secos, nozes e amêndoas. 

EDUARDO QUEIROGA, fotógrafo.

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