Lima Barreto já havia lançado Recordações do Escrivão Isaías Caminha (1909), quando, pouco antes de fazer 30 anos de idade, escreveu Triste Fim de Policarpo Quaresma, para publicação em folhetim no Jornal do Comércio do RJ, em 1911. Quatro anos depois, finalmente, a narrativa saiu em livro. Ótimos contos como A nova Califórnia e O homem que sabia javanês, hoje apreciados, constavam em um apêndice da edição, a qual – fato que diz muito sobre o senso comum cultural brasileiro – foi recebida com indiferença. Em vida, Lima nunca foi muito considerado pela crítica e pelos colegas. De trajetória sofrida, marcada por alcoolismo e internações no hospício, tentou entrar duas vezes na Academia Brasileira de Letras, mas não conseguiu. Só após sua morte, nos anos 1920, sua obra começou a ser mais lida e valorizada, pelas mãos do grupo modernista, defensor de uma literatura coloquial e voltada ao cotidiano brasileiro, como a dele.
Observador arguto do país, Lima foi um autor revoltado com o Brasil feito nenhum outro depois. Na geração atual de escritores, não tem “herdeiro”. Aliás, a ausência, nessa geração, de uma “agenda” política é uma das razões por que a crítica a tem saudado. A despreocupação em debater a sociedade brasileira é vista como sinal de maturidade. Sim, é bom mesmo haver mais diversidade, sutileza e fuga do mero panfleto. Mas umas cutucadas literárias bem-dadas no país, como as que Lima deu e como as que, por exemplo, autores americanos contemporâneos dão nos EUA, às vezes fazem falta por aqui. Motivos para cutucar proliferam. Lima sabia disso, seu personagem centenário termina sabendo, e os brasileiros, enfim desiludidos, agora também sabem. De novo.
LUCAS COLOMBO, jornalista gaúcho, editor do site Mínimo Múltiplo.