O São Luiz é a maior diversão
Inaugurado há mais de sete décadas, o histórico cinema de rua do Centro do Recife faz parte da memória afetiva dos seus frequentadores e tornou-se cenário e personagem de filmes
TEXTO Cleodon Coelho
25 de Setembro de 2025
Foto Morgana Narjara/Secult-PE/Divulgação
A trajetória do filme O agente secreto não poderia começar melhor. Depois de Aquarius (em 2016) e de Bacurau (2019, codirigido por Juliano Dornelles), o novo longa-metragem do cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho foi aclamado durante 12 minutos em sua estreia première no Festival de Cannes, o mais importante do mundo, e o que é melhor: concorrendo à Palma de Ouro. Isso tudo em um ano que nem bem começou e já consagrou O último azul, de Gabriel Mascaro, com o Urso de Prata no Festival de Berlim, e Ainda estou aqui, de Walter Salles, com o Oscar de Melhor Filme Internacional. Marianna Brennand, diretora do filme Manas, também estará na Riviera Francesa para receber o prêmio Women in Motion Emerging Talent, dedicado a novos talentos do cinema, no Festival de Cannes 2025.
Kleber começou a trabalhar nesse projeto em 2020, em meio à pandemia. Durante as filmagens, entre junho e agosto de 2024, o Recife entrou no túnel do tempo e ganhou ares setentistas para contar a história de Marcelo (Wagner Moura), que tem um passado misterioso e que volta à cidade em busca de paz. Mas o ideal de tranquilidade está bem longe da realidade que ele encontra.
“Trabalhei quase oito meses na montagem e, no final do processo, chegou esse convite para a competição em Cannes”, conta Kleber, que conquistou a Palma de Ouro de Melhor Direção. “É um momento de alegria, de ansiedade, de nervosismo. É um pouco como entrar em uma montanha-russa porque (o festival) é uma concentração muito grande de mídia e um espaço fantástico para um filme brasileiro. E é um bom pontapé inicial para a carreira internacional do filme e, claro, para ele chegar ao Brasil, pois, afinal de contas, eu quero que ele seja muito visto aqui no nosso país.”
Além de Wagner Moura, o elenco traz nomes como Maria Fernanda Cândido, Gabriel Leone, Hermila Guedes, Luciano Chirolli, Tânia Maria, Alice Carvalho, Thomás Aquino, Isabél Zuaa e Udo Kier, entre muitos outros. No meio de toda essa gente, um pernambucano que dedicou boa parte da vida ao cinema, como programador de salas como o São Luiz, faz uma ponta bastante significativa. É que sua cena foi filmada exatamente no local em que sua trajetória profissional ganhou impulso.
Memória afetiva e descaso
Pedro Pinheiro foi um dos ex-funcionários da sala septuagenária homenageados por Kleber em participações afetivas. Na tarde de 20 de julho do ano passado, ele vestiu a velha farda da equipe nos anos 1970 (a história se passa em 1977) e gravou uma cena ao lado do astro Wagner Moura, protagonista da história. “Depois de aposentado, voltei à minha velha casa para trabalhar novamente”, brinca ele. “Minha história profissional com esse cinema começou em 1982, quando li um anúncio de uma agência de emprego no jornal, oferecendo uma vaga de auxiliar de escritório na Empresa Cinemas São Luiz Ltda.”, recorda. “Como já frequentava as salas da época como espectador, fiquei muito interessado. Fiz os testes e, apesar da grande concorrência, consegui passar. Em setembro daquele ano, aos 20 de idade, tive a minha carteira assinada.”
Quando Pedro nasceu, em 1962, o São Luiz tinha apenas 10 anos. Erguida onde antes existia a Capela Anglicana do Recife, a grande sala com balcão e mais de mil poltronas já estava prevista no projeto original do Edifício Duarte Coelho. O salão de entrada, com um grande painel de Lula Cardoso Ayres, não deixava dúvidas de que estava nascendo para fazer história. Estrelado por Gregory Peck e Virginia Mayo, o longa O falcão dos mares foi o escolhido para a grande noite de abertura, só para convidados, em 6 de setembro de 1952.

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