Teve uma primeira edição em 2013, sob coordenação editorial do Ponto de Cultura Interpoética, apoiada pela Secretaria de Cultura (e Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico — Fundarpe) do Estado de Pernambuco, contendo dois textos: o primeiro, de Pedro Américo de Farias, faz uma panorâmica da ficção escrita em Pernambuco entre os anos de 1847 e 2001; o segundo, de Cristhiano Aguiar, traz uma leitura crítica da primeira década do século XXI, alongada até 2011.
O presente volume constitui uma segunda edição, acrescida de um ensaio abordando aspectos da produção ficcional dos últimos 10 anos (2011–2020), a cargo de Socorro Nunes. Nesta edição, os ensaios componentes da primeira não sofrem qualquer alteração de conteúdo e se mantêm assinados, no final, por seus autores com as respectivas datas originais.
Além do acréscimo, fizeram-se necessárias duas mudanças:
Excluídos 20 das 48 páginas com ilustrações presentes na edição anterior, mantendo as mais representativas dos momentos literários e de seus autores mais significativos;
Também excluímos os três contos inseridos entre o primeiro e o segundo ensaios tomando por base a facilidade, hoje, de acesso a qualquer texto, via internet, além da ideia de que três pouco representam diante de centenas.
Agradecemos aos 10 protagonistas do terceiro ensaio, que trata da última geração (2011–2020) de ficcionistas, pela excelente contribuição de suas respostas à enquete proposta pela autora, o que facilitou a abordagem por ela pretendida. Seus nomes, por ordem de aparecimento em cena: Micheliny Verunschk, Thiago Corrêa, Nivaldo Tenório, Wellington de Melo, Raimundo de Moraes, Renata Santana, Rejane Gonçalves, Rejane Paschoal, José Alfredo Santos Abrão e André Balaio.
Também agradecemos ao professor Anco Márcio Tenório Vieira, da UFPE, por suas abalizadas respostas à referida enquete.
Estamos convictos de que esta edição está bem mais rica que a primeira e esperamos que o público leitor faça dela o melhor proveito.
Coordenação editorial
Ficção contemporânea: 2001–2011
A ficção 2.1
A prosa produzida em Pernambuco entre 2001 e 2011 reafirma o que foi apontado no ensaio de Pedro Américo de Farias, ao tratar da ficção a partir dos anos 1980: não possuir um rosto definido, a ponto de não ser possível mais falar de “escolas” ou “movimentos literários”. Nesse sentido, tanto a poesia, quanto a ficção, estão em sintonia com o que se pode observar na produção literária contemporânea brasileira — passado o tempo dos manifestos e dos engajamentos políticos de décadas atrás, os autores procuram construir suas obras trilhando um caminho cada vez mais particular, no qual o texto a ser produzido depende menos de projetos coletivos políticos e estéticos. Isso não significa que os escritores não dialoguem uns com os outros, não se articulem ao redor de eventos, causas políticas, revistas, sites ou outros projetos editoriais. A experiência coletiva, contudo, tem menos compromisso com a defesa de um plano estético e muito mais com a vontade de intervir e remodelar o próprio ambiente literário. Deste modo, assim como em São Paulo é difícil dizer que “projeto literário” era defendido pelo grupo de escritores publicados nas conhecidas antologias da Geração 90, o mesmo pode ser dito acerca das revistas, antologias e sites dos quais participaram os novos escritores pernambucanos de 2001 até a data presente.
Capa para As sombrias ruínas da alma (Raimundo Carreiro),
de Fê, sobre O homem (1978), de Siron Franco
Antes de continuar, duas precauções são inevitáveis. Primeiro, não custa lembrar que o rótulo “ficcionistas pernambucanos” não significa que estes autores carregam dentro de si uma alma literária pintada com as cores da bandeira do estado, porém apenas que, de um modo ou outro, Pernambuco se revelou uma instância importante no desenvolvimento de suas carreiras. Essa ressalva, sempre válida para pensarmos a literatura de qualquer cultura, se torna ainda mais importante no caso da literatura contemporânea, pois a procura de uma identidade regional não é mais pauta prioritária na obra desta Ficção 2.1. A segunda ressalva: o recorte apresentado nas páginas seguintes é somente uma possibilidade entre outras e não possui a ambição de definir um cânone a ser seguido. Do mesmo modo, alguns autores são comentados com mais informações do que outros: outra vez, não se trata de eleger os “melhores” escritores; os destaques dizem respeito às afinidades do crítico com os textos lidos e não com o intuito de realizar uma hierarquia.
De modo geral, os escritores contemporâneos em Pernambuco que conseguem, atualmente, maior projeção nacional passaram, a partir dos anos 1990, a publicar em editoras de médio e grande porte. Participam das mais diversas atividades vinculadas ao mercado editorial e têm participado como finalistas e/ou vencedores de importantes premiações literárias. É o caso de autores como Raimundo Carrero, Marcelino Freire, Fernando Monteiro, Ronaldo Correia de Brito, Luzilá Gonçalves Ferreira, entre outros.
A NOVÍSSIMA GERAÇÃO
Por outro lado, uma série de novos escritores, dedicados tanto à prosa, quanto à poesia, passa a despontar a partir de 2001 e os seus trabalhos aparecem em antologias, jornais literários e principalmente na internet, locus privilegiado de divulgação e elaboração de seus textos. Muitas vezes autopublicando-se, seja em papel ou nas páginas virtuais, estes escritores também procuram conferir visibilidade aos seus trabalhos editando revistas literárias — foi o caso recente das revistas Crispim (www.revistacrispim.com.br), U-carbureto (blogducarbureto.blogspot.com), Entretanto e Vacatussa (www.vacatussa.com) —, organizando saraus e festas literárias, tais como o Nós Pós e a Freeporto (freeporto.wordpress.com), ou criando seus próprios selos editoriais, como é o caso da editora Paés, da Livrinho de Papel Finíssimo (livrinhoeditora.blogspot.com) e da Moinhos de Vento (edicoesmoinhos.wordpress.com). Conforme destacado antes, essa articulação procura criar um espaço não apenas dentro do próprio estado pernambucano, como também no contexto geral da literatura brasileira.
Deste modo, Pernambuco é visto hoje como um lugar de efervescência literária, seja por causa da boa repercussão conferida aos projetos coletivos dos novos escritores (e, neste caso, o uso da internet se revela fundamental para que estes projetos sejam conhecidos fora do estado) ou pela qualidade dos livros escritos e lançados pelos ficcionistas pernambucanos. Caso o leitor deseje conhecer um pouco mais desta novíssima produção, tanto na prosa, quanto na poesia, além dos sites indicados no parágrafo anterior, vale a pena conferir os seguintes: Interpoética, Escritores & Tal, Portal do Escritor Pernambucano, NotaPE.
Além do mundo online, algumas publicações, praticamente todas fomentadas direta ou indiretamente com recursos públicos (há pouquíssimas iniciativas privadas no tocante à publicação e divulgação da literatura contemporânea em Pernambuco), também procuraram mapear a produção literária contemporânea no estado. É o caso das importantes antologias publicadas, na última década, pela Fundação de Cultura Cidade do Recife (que, além da ficção e da crônica, contemplaram também a poesia), assim como do espaço dado a novos autores no Pernambuco, suplemento literário do Governo do Estado, e na revista Continente. No caso do Pernambuco, há alguns anos (em 2008) foi publicada uma edição especial do jornal, uma antologia de prosa e verso com alguns nomes em destaque desta nova leva de escritores. Outra antologia com propósito semelhante foi Tudo aqui fora escrito — Tudo fora escrito ali, lançada durante a Freeporto 2009.
Capa da coletânea Tudo aqui fora escrito — Tudo fora escrito ali
Nos dois casos, foram publicadas tanto ficção quanto poesia. Por fim, vale também dar uma olhada não apenas nos sites das revistas literárias e selos editoriais citados antes, como também em suas versões impressas, porque muito do que publicaram em termos desta nova produção não está ainda disponível para download.
Com estas indicações, é possível ter uma noção, no “calor da hora”, da produção dos últimos 10 anos que ainda não chegou às grandes editoras — às vezes, a nenhuma editora — e que agrega diferentes percursos, dicções e idades. Se é certo afirmar que muito do que foi publicado não passará pelo crivo do tempo, por outro lado aí será gestada a nova face da ficção em Pernambuco. Como já acontece com os autores que conseguiram um público maior hoje em dia, esta produção em potência ajudará a compor não apenas a literatura do estado, como também a literatura brasileira como um todo.
A FICÇÃO EM PERNAMBUCO NO CONTEXTO DA LITERATURA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
Os últimos 10 anos se revelaram importantes à produção literária contemporânea brasileira. Pernambuco não ficou de fora deste processo. Beneficiados pela estabilidade democrática e econômica dos últimos 20 e poucos anos, pelo surgimento da internet e pelo barateamento dos meios de edição, novos espaços foram abertos a um número considerável de estreias literárias. Embora a distribuição, a demanda do mercado consumidor e a crítica pareçam não dar conta de tantos lançamentos — os motivos são diversos para que isso ocorra e sua discussão extrapola os limites deste texto —, há razões para uma avaliação otimista. Pequenas e médias editoras se consolidam neste contexto, assim como uma maior quantidade de escritores se profissionaliza. Aumenta o interesse pela participação em oficinas literárias, das quais a do escritor Raimundo Carrero é uma das pioneiras. Novos prêmios literários, festas, bienais, feiras do livro e antologias têm contribuído para a circulação, o debate e a divulgação da literatura, com destaque às suas expressões contemporâneas. Da mesma forma, pelo Brasil afora, dos anos 1990 até 2011, número considerável de revistas, sites e jornais literários foram lançados e praticamente todos se preocuparam em, de algum modo, fazer circular a literatura brasileira atual.
Capa para Angu de sangue (Marcelino Freire), de Silvana
Zandomeni, sobre fotos de Jobalo
No caso de Pernambuco, embora o mercado editorial interno não seja propício à literatura contemporânea, com pouca demanda de consumo e pouco investimento na área, os escritores que produzem a partir do estado também se beneficiaram desse contexto nacional favorável. Como apontamos antes, novos escritores foram revelados através das mais diferentes instâncias, dos blogs às megaeditoras. Eventos literários como a Fliporto: Festa Literária Internacional de Pernambuco, o A Letra e a Voz: Festival Recifense de Literatura, a Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, a Freeporto: Festa Literária do Recife e a Jornada Literária Portal do Sertão colocaram o estado, na última década, no calendário dos eventos nacionais na área da literatura.
A tendência de surgimento de revistas, jornais e sites também ocorreu no estado e desempenhou um papel importante.
FICÇÃO CONTEMPORÂNEA EM PERNAMBUCO: ALGUNS NOMES
Alguns nomes apontados no ensaio de Pedro Américo de Farias consolidaram as suas carreiras nos anos que se seguiram e não custa nada lembrar alguns deles. O primeiro que devemos citar é Raimundo Carrero. Logo após lançar Somos pedras que se consomem (1995), romance com o qual ganhou os prêmios Machado de Assis, da Biblioteca Nacional, e o APCA, Carrero lança aquele que provavelmente é o seu melhor livro, As sombrias ruínas da alma (1999), pelo qual recebe o Prêmio Jabuti. Em seguida, relança Sombra severa (2001), o inédito Ao redor do escorpião... Uma tarântula? (2003), e sua editora na época, a Iluminuras, relança seus primeiros três livros em uma edição chamada O delicado abismo da loucura (2005). Carrero lançou ainda dois romances, O amor não tem bons sentimentos (Iluminuras, 2007) e Minha alma é irmã de Deus (Record, 2009), com o qual ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura em 2010.
Percebe-se na ficção do autor características comuns. Trata-se de uma prosa densa, muitas vezes bastante experimental, como é o caso de Ao redor do escorpião... Uma tarântula?, em que a arquitetura de cada obra é pensada com rigor. Dificilmente Carrero repete a estrutura com a qual organiza seus romances. Embora a combinação sexo e violência seja frequente na nossa literatura contemporânea, em poucos casos ela é tratada como na obra de Carrero: aqui, essa mistura explosiva é o ponto de partida não apenas para o texto investigar extremos da experiência humana — a busca por Deus e a interrogação acerca do mal, por exemplo — como também um caminho que leva a linguagem da própria narrativa aos seus limites.
Citávamos, antes, a atuação do autor de Sombra severa em oficinas literárias e é provável que seu ex-aluno mais famoso seja Marcelino Freire, nascido em Sertânia e residindo há décadas em São Paulo. Freire, um dos principais divulgadores da literatura contemporânea, organizador de eventos, saraus e antologias, desponta com Angu de sangue (2000), publicado pela Ateliê Editorial. Foi um dos articuladores da já citada Geração 90, que reuniu, em duas antologias organizadas pelo escritor e crítico Nelson de Oliveira, uma série de novos escritores de todo o país. Após lançar Balé ralé (2003), recebe o Prêmio Jabuti por Contos negreiros (2005), publicado na editora Record, e em seguida lança Rasif (2008). São todos livros de narrativas curtas e construídas com um forte acento da linguagem falada no dia a dia. Alguns destes textos são praticamente monólogos teatrais, e isso explica em parte por que a obra de Freire tem sido adaptada com muito sucesso aos palcos. O flerte com a poesia, principalmente a poesia popular, também é importante, a ponto de alguns dos seus “contos-cantos” serem confundidos com poemas. Nas suas histórias, é abordado, de maneira às vezes polêmica, o cotidiano violento dos grandes centros urbanos e os seus personagens miúdos, quase picarescos em alguns casos, que tentam sobreviver em meio às ferocidades sociais. Mas a obra de Marcelino Freire também fala de amor, embora este amor geralmente não tenha, para parafrasearmos o título do romance de Carrero, “bons sentimentos”; alguns dos seus melhores contos são semelhantes aos boleros e aos bons bregas de antigamente, nos quais personagens de todos os gêneros, cores e orientações sexuais abrem o peito para paixões dilacerantes.
Capa para Galileia (Ronaldo Correia de Brito), de Mariana Newlands
Capa para Modos de macho e modinhas de fêmea
(Xico Sá), de Porto e Martinez, 2003
Se em Carrero temos uma obra do excesso, com linguagem barroca e coalhada, bem diferente é a linguagem do cearense, radicado no Recife, Ronaldo Correia de Brito, que após publicar As noites e os dias (1996), obtém um grande sucesso de crítica e público com os contos de Faca (2003) e Livro dos homens (2005), ambos publicados pela Cosac Naify. Sua linguagem sem gorduras lembra a concisão das obras de Graciliano Ramos e Juan Rulfo. Ronaldo Correia de Brito ainda lança o romance Galileia (2008) pela Objetiva/Alfaguara, obra vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura em 2009, e os contos de Retratos imorais (Alfaguara, 2010). Nos livros de contos publicados pela Cosac e no seu até o presente momento único romance, um dos elementos que chama atenção é que sua obra proporciona uma nova leitura de um espaço social muito frequentado pela nossa literatura e cinema, o Sertão, sem, contudo, se vincular a um projeto regionalista, em que o Sertão seria enxergado como um lugar de identidade “pura”, ou como uma espécie de baú do tesouro de nossa nacionalidade. Este é, por exemplo, um dos principais temas de Galileia. Tanto a cidade, quanto o mundo rural, porém, são palcos para que o autor possa encenar outros temas marcantes em sua ficção: a condição trágica da vida humana, a relação entre experiência contemporânea e mito, o fantástico, a memória e o enfrentamento entre modernidade e tradição.
O confronto entre modernidade e tradição é um dos temas do romance Roliúde, de Homero Fonseca, lançado em 2007 pela editora Record, que conta a história de Bibiu, um narrador picaresco cujo ganha-pão consiste em recontar os filmes que assiste nas telas do cinema. Entre um filme e outro, que são relidos, com bastante humor, por Bibiu aos olhos da cultura sertaneja, Fonseca nos conta também causos da vida do seu protagonista. Em muitas destas histórias, temos o relato do confronto entre tradição e modernidade, como acontece no capítulo O dia em que Bibiu experimentou a tal da Coca-Cola. Em 2010, Fonseca lança uma compilação das crônicas que publica em seu blog no livro Blogosfera (Caliban).
Capa de Matriuska (Sidney Rocha): fotografia de Elza Lima
Capa de O grau Graumman (Fernando Monteiro), da Inc.
Design Editorial, sobre foto de Cristina Câmara
Fernando Monteiro, por outro lado, manteve uma escrita bastante experimental. Após a publicação dos bem-sucedidos Aspades, ets, etc (1997) e A cabeça no fundo do entulho (1999), pelo qual ganhou o Prêmio Bravo! de Literatura, lançou o seu melhor romance, A múmia do rosto dourado do Rio de Janeiro (Editora Globo, 2001), os contos de Armada América (Francis, 2003) e o por enquanto projeto inacabado A trilogia Graumann, com os livros O grau Graumann (Globo, 2002) e As confissões de Lúcio (Francis, 2006). Em todos os seus romances, em que aparecem afinidades com autores como Nabokov e Ricardo Piglia, acontece uma série de jogos ficcionais, nos quais diferentes fragmentos, escritos nos mais diversos gêneros textuais, formam um quebra-cabeça que precisa ser reconstituído pelo leitor. Influenciadas pelo cinema, suas histórias em muitos casos nos apresentam biografias fictícias de personagens esquivos, como é o caso d’A Trilogia Graumann, que nos conta a vida de Lúcio Graumann, único escritor brasileiro a receber, no mundo ficcional criado por Monteiro, o Prêmio Nobel de Literatura. Nestes jogos metaficcionais, não é raro que surjam reflexões sobre o próprio ato de escrever e o atual status da cultura contemporânea no Brasil e no mundo.
Experimentalismo também é a marca do último escritor que destacamos, o cearense, radicado no Recife tal qual Ronaldo Correia de Brito, Sidney Rocha, autor do romance Sofia (publicado em 2005 pela Ateliê Editorial e relançado em 2010 pela Iluminuras) e dos livros de contos Matriuska (Iluminuras, 2009) e O destino das metáforas (2011). No seu romance, um monólogo movido por uma memória afetiva fraturada, encontramos uma linguagem poética que flerta de maneira discreta com o fantástico; os seus contos, por outro lado, deixam um pouco de lado o lirismo e a introspecção e voltam seus olhares para uma série de personagens imersas em um mundo marcado pela crueldade e a angústia. O naturalismo, contudo, é afastado, porque, além da poesia ainda estar presente, embora com uma textura mais áspera do que no romance, a busca pela invenção na linguagem e a ênfase nos dramas individuais dos personagens afasta o risco destas histórias se transformarem em um mero “retrato” social; em O destino das metáforas, percebe-se uma aproximação maior com as tradições da literatura fantástica, da escrita alegórica e do realismo mágico; elementos que contribuem para o inventário da hipermodernidade que parece ser o atual projeto ficcional de Rocha.
Capa de Eis o mundo de fora, de Adrienne Myrtes, 2011
Capa de Essa febre que não passa, de Dulce Lôbo e
Germana Freire, 2006
Por fim, importante destacar ainda os seguintes escritores: Luzilá Gonçalves Ferreira, que lançou pela Rocco uma série de bons romances, entre eles Rios turvos (1993), Voltar a Palermo (2002) e No tempo frágil das horas (2003); Walther Moreira Santos, vencedor de diversos prêmios literários, entre eles o José Mindlin e o Cidade de Curitiba, com o romance O ciclista (Agir, 2008); Adrienne Myrtes, que publicou o livro de contos A mulher e o cavalo e outros contos (Alaúde, 2006) e, em 2011, pela Ateliê Editorial, o romance Eis o mundo de fora; Luce Pereira, com o livro de contos Essa febre que não passa (Comunigraf, 2006); Fernando Farias (fernandofarias7.blogspot.com), escritor independente cujas obras flertam com a literatura fantástica e o universo de Jorge Luis Borges; e as divertidas crônicas de Xico Sá publicadas pela Record em Modas de macho e modinhas de fêmea (2003) e Chabadaba (2010).
Dignos de atenção são, também, os lançamentos de Umbelina e sua grande rival (Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2001), de Cícero Belmar; A costureira e o cangaceiro (Nova Fronteira, 2010), de Frances de Pontes Peebles, e a ficção da poeta Gerusa Leal, infelizmente ainda dispersa em antologias e sites da internet; outro autor mais conhecido como poeta, Wilson Freire, acaba também de estrear no romance, com A mulher que queria ser Micheliny Verunschk (Edith, 2011).
Como pode ser visto, a produção literária da última década surpreende em termos de maturidade e diversidade. Ela se mostra em sintonia com a renovação em curso na própria literatura brasileira e os leitores podem encontrar, dentro e fora dos limites do estado, uma série de bons autores que, neste exato momento, estão escrevendo obras sobre as quais é possível fazer boas apostas e realizar instigantes leituras.
São Paulo, 2011.
CRISTHIANO AGUIAR é escritor, crítico literário e professor. Autor do livro de contos Na outra margem, o Leviatã e do livro teórico Narrativas e espaços ficcionais: uma introdução.
Os outros autores
PEDRO AMÉRICO DE FARIAS nasceu em Pernambuco, mora em São João del-Rei (MG). Licenciado em Letras, escreve e diz poesia, ensaia prosa crítica e ficcional.
SOCORRO NUNES, cearense, radicada em Minas Gerais, é professora da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Pesquisadora do CNPq na área de alfabetização, letramento e cultura escrita.