FOTOS EUVALDO MACEDO FILHO
05 de Abril de 2018
Lavadeira na beira do Rio São Francisco
Foto Euvaldo Macedo Filho
Onde eu nasci passa um rio
e o tempo voa como um passarinho
antes havia a via-sacra
cantando na noite
do tempo
que a gente era guri
com Chiquinho maluco pedindo a deus por todos nós.
Quando ainda se ouvia
a via sacra
dobrando a esquina
do tempo
as notas dissonantes
de um violão
uma VOZ
e uma canção
iluminaram a noite tecida de cirandas.
Era a bossa-nova
Era João.
Euvaldo Macedo Filho
O trecho de poesia que nos serve de epígrafe já diz um pouco sobre o trabalho de Euvaldo Mendes de Macedo Filho. Confessional, arredio à métrica, conectado com a geração concretista que lhe precedera, o poema faz parte de uma busca pelo próprio espaço de expressão da palavra escrita, errante em meio à página.
Poeta, fotógrafo, cineasta da geração do super-8, o artista baiano de Juazeiro, nascido em 1952, passou fugaz por entre as esferas celestes da cena artística dos anos 1970 e 1980, tendo deixado, quando de sua morte, um volumoso acervo de imagens e escritos diversos que cintilam até hoje, como a luz dos astros emitidas de galáxias distantes são capazes de nos tocar no momento presente.
Quando Euvaldo começou a produzir sua obra, o país vivia os anos mais agitados de consolidação da ditadura militar, marcados pelos famosos e pretensiosos projetos de desenvolvimento, como a construção de rodovias de grande envergadura, de barragens hidrelétricas, de modernização do meio rural e, paradoxalmente, de expressiva produção artística, que, a seu modo, resistia desencantada à censura e ao cerceamento político.
Em Salvador, o jovem juazeirense entrou em contato com a movimentação cultural que ali ocorria desde as Bienais de Arte dos anos 1960 – que traziam as questões do Modernismo e do Tropicalismo para as artes plásticas e que foram perseguidas pelo regime –, até as jornadas de cinema, já nos anos 1970, que articulavam a produção baiana e colocavam em pauta o que se entendia por representação da cultura local. Ao retornar à sua cidade de origem, em 1974, Euvaldo Macedo encontra Juazeiro saindo do tempo das vias-sacras e dos passarinhos, e logo toma parte nos grupos de arte formados por jovens que promoviam saraus poéticos, festivais de música e de teatro estudantis. Em pouco tempo, o poeta aprende a fotografar em casa, manejando a câmera do pai junto com o irmão, no que seria o início de uma série de processos criativos, marcados pela paixão para com a captura das imagens e pela busca de referências artísticas e de temas para a fotografia.
*A Continente pode ser encontrada ainda na plataforma de revistas GoRead e nas principais bancas do Recife e em livrarias especializadas do país.
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