Nascida em Carpina, Zona da Mata Norte de Pernambuco, a artista de 31 anos é autodidata e desenha desde criança, mas há apenas três anos quis dedicar-se inteiramente à prática artística. Antes disso, Juliana fez faculdade de Direito, quase entrou na política – candidatou-se à vereadora na sua cidade natal em 2008 – e trabalhou com produção cinematográfica.
Em seu ateliê e casa, no Bairro de Casa Amarela, no Recife, trabalha em cinco ou seis obras ao mesmo tempo, permanecendo em constante “estado de desenho”, num processo em que coloca seu corpo em exaustão – como se o lápis fosse uma extensão dele. “O que eu procuro é não ter controle do traço, empurrá-lo contra parede, ir até o meu limite… Faço ‘desenhos de exaustão’, gosto de exaurir a técnica, até cansar a mão mesmo, de doer. Expandir o desenho, sem pegar atalhos. Busco a perda do controle, não me atenho a uma ideia preconcebida. Desenhar, para mim, é como ficar diante de um abismo”, conta a artista sobre seu processo. Com uma rotina disciplinada, Juliana chega a dedicar 10 horas diárias à prática do desenho e da pintura, começando ao nascer do sol.
A série em grafite Animal incomum – uma referência direta ao termo kaiju, gênero de filmes japoneses como Godzilla e Gamera – traz seres gigantes em cidades fantásticas, de personalidade própria, quase humanas. Símbolos e memórias afetivas dão vida a cidades-personagens, com inspiração no livro Cidades invisíveis, de Ítalo Calvino. A literatura é parte importante da vida da artista, que cresceu rodeada por livros do acervo pessoal de seu pai. Além de Calvino, o olhar sociológico de Gilberto Freyre e Josué de Castro também influi em suas obras. A giganta, o primeiro trabalho da série, teria sido cartaz do festival Janela Internacional de Cinema em 2015, mas foi considerado “obsceno” e “lascivo” por um dos patrocinadores e teve que ser substituído. O desenho acabou entrando para o catálogo do festival.
Na “escavação”, em pastel a óleo sobre madeira, Juliana encontrou um descanso para o trabalho pesado, “de mina de carvão”, que produz com o grafite. Na série Outros esquemas do corpo, as pinturas passam por uma espécie de processo arqueológico, riscando e “cavando” a madeira, num percurso intuitivo de investigação que revela os vestígios do que havia sido feito anteriormente.
Como parte do processo artístico e de autoconhecimento, a artista mantém diversos cadernos com anotações e desenhos, cada um com funções específicas. Ela, que conta nunca sair de casa sem um caderno, dedica um deles para o registro de seus sonhos. Florestas e matas são elementos que surgem constantemente em seus trabalhos e, para a ela, simbolizam a representação do seu inconsciente.
Isso começou com um episódio particular, após uma viagem à Amazônia. “Em certo momento, era noite e eu lembro estar lá dentro, no meio do mato. Era um lugar escuro, cheio de animais que me assustam, cheio de espinhos, plantas e possíveis ameaças à minha vida. É um lugar hostil e desconhecido, como o meu inconsciente. A floresta é como se fosse um campo interno meu, caótico, escuro e em que eu tenho medo de entrar.”