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Luigi Ghirri

Imagens do que supomos conhecer

TEXTO Priscilla Campos

01 de Julho de 2014

Meios tons e economia de elementos marcam fotografias de Ghirri

Meios tons e economia de elementos marcam fotografias de Ghirri

Foto Luigi Ghirri/Divulgação

"Sempre considerei que a fotografia fosse uma linguagem para ver – e não para transformar, ocultar, modificar – a realidade. Deixei que sua magia revelasse ao nosso olhar os espaços, os objetos, as paisagens que quero representar. Confiante em que um olhar livre de acrobacias formais, modos de coerção e elucubrações consiga achar um equilíbrio entre consciência e simplicidade”, escreve o italiano Luigi Ghirri, em A obra aberta, publicação na qual ele tenta explicar, com domínio literário, sua construção fotográfica.


O fotógrafo arranajava e rearranjava suas fotos em série. Estas apareceram em Kodachrome. Foto: Luigi Ghirri/Divulgação

Pouco conhecido para além das terras itálicas, Ghirri aparece, tardiamente, como uma descoberta gradual e curiosa aos olhos alheios. Curador, editor, crítico e fotógrafo, o artista reuniu, entre palavras e imagens, um grande acervo, que perpassa diferentes tópicos, mas converge em sua totalidade como ode à austeridade e à despretensão.


Boa parte do seu acervo foi realizado em viagens e férias, o que transparece nas situações registradas. Foto: Luigi Ghirri/Divulgação

Nascido durante o inverno de 1943, numa pequena cidade italiana chamada Fellegara, Ghirri conectou-se, ainda jovem, com a geografia e seus desdobramentos (poéticos e concretos). Em textos e biografias, autorais ou não, sempre é citada a sua paixão pela cartografia e pelas paisagens italianas, tanto as naturais quanto as urbanas. Em Módena, cidade onde viveu boa parte de sua vida, tornou-se agrimensor. Foi na década de 1960, durante uma viagem pela Europa, que o italiano empreendeu suas primeiras séries fotográficas. Num momento de crise para a fotografia, Ghirri apareceu como símbolo de renovação. Porém, ao invés de explorar, com despudor, experimentações e tecer críticas ácidas ao cenário que se apresentava, o italiano fez da perturbação motivo de debate pessoal.


Foto: Luigi Ghirri/Divulgação

Em toda sua obra, Ghirri parece repensar a fotografia ao mesmo tempo em que escolhe uma linguagem amadora para isso. A impressão é que o italiano procura montar na sala de sua casa, tranquilamente, um quebra-cabeça sem fim. Ele optou pelo desligamento da técnica, da busca pela perfeição e do uso de métodos clássicos como base para repensar a linguagem fotográfica.


Inserida entre imagens de Topografia-iconografia, a obra Mago de Braies pretendia "ver cada coisa que já foi vista como se a olhasse pela primeira vez", de acordo com Ghirri. 
Foto: Luigi Ghirri/Divulgação

De acordo com o especialista em História da Fotografia, Quentin Bajac, a escolha em nomear o livro com o conjunto dos trabalhos de Ghirri, realizados na década de 1970, de Kodachrome – procedimento banal de revelação na época – traz consigo a relevância de um manifesto. As imagens, que também fizeram parte da série Paisagens de papelão, procuravam investigar o conceito de realidade. Por meio de fotos da foto e ângulos nos quais o momento capturado parecia uma montagem feita através de colagens, o italiano evoca a atenção do olhar para o que é verdadeiro ou falso. Sobre esse conjunto, Ghirri afirmou: “Muitos, ao escrever sobre fotografia, disseram que ela mostra aquilo que já sabemos: o conhecido; eu acredito, ao contrário, que a afirmação mais correta seria a seguinte: a fotografia mostra sempre aquilo que acreditamos já conhecer (...)”.


Foto inserida em conjunto que busca refletir mais a percepção da Itália que sua descrição. Foto: Luigi Ghirri/Divulgação

Luigi foi também um esmerado explorador de seu país. A sua intenção era sempre distanciar a lente dos registros óbvios acerca de tópicos como cultura, cotidiano, arquitetura e geografia. Ainda nos anos 1970, viajou por diversas cidades italianas para apresentar a mostra Italia-Ailati, cujo título, um palíndromo, faz alusão ao constante foco de Ghirri nas coisas que estão “ao avesso”, situações tidas como pequenas e postas, muitas vezes, à margem de uma dominante linguagem fotográfica.


Da série Em escala, feita no parque Itália em Miniatura. Foto: Luigi Ghirri/Divulgação

O contraste entre o íntimo e o universal obtido pelo italiano é um dos pontos mais fascinantes de suas imagens. Assim como a inglesa Virginia Woolf o evidenciou com as palavras, Luigi Ghirri expôs, através de suas fotografias, a dualidade presente no real, nas situações corriqueiras, oferecendo ao cotidiano toda a atenção que se lhe possa dedicar. 

PRISCILLA CAMPOS, estudante de Jornalismo e estagiária da Continente.

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