“Quando eu comecei com ilustrações para os mercados de moda e publicidade, procurei afastar o que fazia nessa área da minha pesquisa pessoal. Mas não dá para fugir totalmente do teu traço, um acaba contaminando o outro. Lembro-me de criar e logo descartar, porque tinha muito do meu trabalho pessoal naquelas linhas.” A separação consciente do que fazia como profissional e como artista rendeu suas primeiras exposições – e a experiência foi tão boa, que encheu Nestor de desgosto pela ideia de continuar a trabalhar com briefing, sob a aprovação de terceiros. Insatisfeito, largou a indústria.
Ele mantém a rotina de trabalho de oito horas diárias no seu ateliê, montado em sua casa em Florianópolis, e é representado por galerias da Bahia, São Paulo e de seu estado natal. O artista diz que seu retorno financeiro, apesar da insegurança da inconstância, é maior do que quando trabalhava como ilustrador. Ultimamente, conta, tem refletido mais que produzido. “Ando revendo a minha forma de ver, viver e lidar com meu trabalho”. Fazer o balanço e repensar a própria poética trouxe a experimentação: após uma década utilizando apenas a aquarela, apareceram os trabalhos em xilogravura, metal, acrílica, além de instalações, vídeos e fotografias. “A minha intenção é ampliar o meu trabalho sem limite de suportes ou técnicas.”
A nudez aparece tanto de forma inocente e inatural como em
intensidade erótica. Imagem: Reprodução
Independentemente do meio utilizado, a temática que permeia sua obra se manifesta com clareza, fato que ele descreve como “uma repetição, uma insistência de representações”. Estão ali a nudez inocente e natural, mas também erótica, os rostos marcados por uma beleza assimétrica, a fusão dos seres com a natureza. Sua maior inspiração visual é o período renascentista, além de artistas como Gustave Courbet, Cícero Dias e Franklin Cascaes. Já a vontade de criar foi impulsionada pelo cinema, em especial pelos filmes marginais de Júlio Bressane e pelos dilemas de Almodóvar. Mas Nestor diz que seus temas mais queridos estão presentes desde a infância.
Os corpos nus entrelaçados e retorcidos remetem às pinturas de Egon Schiele. À direita, produção em aquarela, técnica que é destaque em suas criações. Imagens: Reprodução
“A primeira imagem que tenho do corpo nu, e que me incomodava num certo sentido, era a nudez da minha mãe em casa. Desde muito criança, o corpo nu e o sexo me atraíram muito, visualmente. Meus pais tinham uma bíblia imensa, ilustrada com imagens renascentistas, e eu adorava aquele livro, com esses corpos nus muito expressivos. Era uma fixação.”
Aos seis anos, ele passou a desenhar corpos semelhantes. Nas figuras de suas obras é possível encontrar certa familiaridade: algumas, ele explica, são pessoas importantes em sua vida – outros são crias aleatórias, que acabam reaparecendo enquanto produz.
“Dessa nudez doméstica, a da minha mãe, guardo a corpulência de uma mulher com descendência italiana. Todas as mulheres que eu represento guardam essas características corpóreas, a imagem feminina que me agrada. A assimetria é uma coisa que me causa uma comoção maluca também. O estranho e o feio, para mim, têm uma força gigantesca que sempre me instigou”.
LAÍS ARAÚJO, estudante de Jornalismo e estagiária da Continente.