Se o interesse pela Medicina refletia o exemplo materno (“sempre quis ser médica, me espelhava nela”), a opção pelo design casava com o hábito de desenhar, cultivado por conta de uma “piração em histórias em quadrinhos”, e pela vontade de desenvolver algo que fosse autoral. Surgiu, nessa decisão consciente, o embrião do seu estilo, que em 2013 ganharia as ruas do Recife nas ilustrações utilizadas no projeto de cenografia urbana e decoração do carnaval da cidade.
Ilustrações para grife de roupa infantil. Foto: Reprodução
O traço de Bel encontra matrizes diversas. Uma delas é a sobriedade cromática do design escandinavo – fã do coletivo Marimekko e da também finlandesa Sanna Anukka, ela menciona a escassez de cores como um trunfo a ser explorado. “É um design complexo, de paleta mais limitada, mas não por isso pobre, com espaço para simplicidade e repetição”, contextualiza.
Bel Andrade prefere usar poucas cores em cada padrão. Imagem: Reprodução
Pode-se dizer o mesmo daquilo que, hoje, ela admite ser sua “assinatura”. “Uso poucas cores, no máximo quatro; menos é sempre mais. Quando vou ilustrar, o desenho vai seguindo uma composição. Então, antes de qualquer coisa, faço quatro quadradinhos de cores, coloco lado a lado e vejo se dialogam”, conta Bel. Nas estampas, a lógica decorre da repetição: “Quando se repetem os elementos, tudo ganha outra dimensão, outros contornos, outra cara”.
Em sua atuação em design gráfico, trabalhou para a revista Bravo!. Imagem: Reprodução
Em uma escala maior, a própria vida, nada estanque, serve-lhe de inspiração. Entre 2005 e 2012, ela foi a Londres para estudar na Central Saint Martins College of Arts and Design; voltou ao Recife, trabalhou em dois estúdios de design e duas agências de publicidade, idealizou a estamparia de uma grife de pijamas infantis, foi para São Paulo, atuou na extinta revista Bravo!, fez diversas ilustrações para outros veículos da imprensa e, aos poucos, foi se sentindo “mais ilustradora do que designer”.
Primeiro trabalho da artista para a decoração do Carnaval recifense. Imagem: Reprodução
Nesse meio tempo, uma amizade via Instagram com a designer, ilustradora e artista visual Joana Lira rendeu-lhe o convite para substituí-la na equipe que decora o Recife para o reinado de Momo. “Sempre fui sua fã, achei uma honra, topei na hora.” Bel criou figuras e ícones que simbolizavam o percussionista Naná Vasconcelos, homenageado da festa em 2013, e ursos, passistas de maracatu, mulatas fogosas e outros tipos urbanos característicos da iconografia carnavalesca. Maximizados em totens de até 7m, serviam de suporte para as fotografias em preto e branco do outro homenageado, o fotógrafo Alcir Lacerda (1928-2012).
Foto: Reprodução
Explorando nuances de azul, rosa, marrom e branco, com força, expressividade e delicadeza figurativa, o traço de Bel sugere um parentesco armorial (ela é, afinal, sobrinha do pintor Romero de Andrade Lima) e revela ecos de Gilvan Samico, como no uso de cores intensas, porém delicadas, para aplacar o contraste entre preto e branco. A estreia no Carnaval lhe deu outra certeza: “Sinto vontade de construir algo meu. De virar artista mesmo”. Dúvidas? Existem, claro. Mas ela, agora radicada em São Paulo, continua a experimentar. Matriculou-se, recentemente, em um curso de bordado e vislumbra incursões por porcelana e cerâmica. Aguardemos, pois.
LUCIANA VERAS, repórter especial da revista Continente.