Ao longo da semana, as discussões pareciam simples, os candidatos mais fortes destacavam-se, os mais fracos eram descartados com certa facilidade. Dias depois, alguns filmes voltaram e outros mais fortes pareciam perder energia.
Com o afunilamento do processo e a realidade de ter que escolher apenas seis filmes, as discussões tornam-se mais difíceis, nesse caso, nunca no sentido de ver os relacionamentos entre os membros do grupo deteriorar, mas pela simples matemática das escolhas e dos argumentos.
Não se trata de tentar encaixar 15 filmes em seis buracos, mas a coisa fica realmente difícil quando há oito filmes importantes para seis espaços. Para cada argumentação, há uma contra-argumentação, e logo o grupo tem a clara sensação de que tenta trocar seis por meia-dúzia. A tarde inteira.
Como as decisões irão impactar os realizadores e seus filmes? Como ficam os membros da comissão que têm algum tipo de relação pessoal ou social com produtores e realizadores? Como os filmes serão valorizados no atual momento histórico do cinema brasileiro? Como os filmes rejeitados serão prejudicados? Será que, na contagem geral, eles serão realmente prejudicados? Provavelmente, sim.
Uma das verdades mais doloridas do cinema é a de que não importa a qualidade final de um filme, seu sucesso ou fracasso, o cinema dá uma quantidade sobrenatural de trabalho aos que fazem cinema. Esse trabalho é notável em cada bela cena que se desdobra, e em cada sequência medíocre ali vista. Se uma cena é “bela” ou “medíocre”, abre-se o debate e, muitas vezes, não há respostas certas ou erradas.
Curiosamente, a cada noite, de volta ao quarto, eu via na CNN o desenrolar do julgamento de um segurança americano, George Zimmerman, que matou com um tiro, numa vizinhança da Flórida, o adolescente Trayvon Martin. Esse julgamento abalou a sociedade americana. O segurança suspeitou que Trayvon era um ladrão, aparentemente pelo fato de o rapaz ser negro e usar um moleton com capuz cobrindo sua cabeça. Os seis jurados terminaram chegando a um veredicto que chacoalhou a ideia de raça na América: Zimmerman foi declarado inocente.
KLEBER MENDONÇA FILHO, crítico e cineasta.