Ao mesmo tempo, é um texto aberto em possibilidades ao encenador, principalmente se esse quiser investir nos recursos do teatro contemporâneo, como a tecnologia, por exemplo. A Cênicas Cia. de Repertório decidiu não trilhar esse caminho. A prioridade para o grupo é o texto; e, diante dessa prerrogativa, as atrizes são as responsáveis por alavancar a montagem. Bruna Castiel, Manuela Costa e Sônia Carvalho se revezam entre as personagens e mostram maturidade e domínio das possibilidades interpretativas em cena.
Não estão em papéis confortáveis. O texto se desenvolve a partir de nove pequenos monólogos e não há uma interação, pelo menos em relação aos diálogos, entre as atrizes. Se elas são, obviamente, um trio em cena, e trocam energia o tempo inteiro, também estão sós, com aquela história, com o público sentado logo adiante. O palco, em cada momento da encenação, tem a sua dona. Bruna Castiel, em especial, é uma daquelas atrizes que podemos chamar de promessa da sua geração. Tem o magnetismo das grandes intérpretes, a presença no palco, o domínio da técnica, da expressão, da voz.
O diretor Antonio Rodrigues não se permite experimentações ou divagações. Trilhou o caminho do simples, mas isso de forma alguma desmerece a montagem. Há uma referência bastante explícita, trazida pelo próprio texto, ao universo de Garcia Lorca. Essas mulheres de dores profundas usam xales e saias sobrepostas e a encenação tem muitas vezes a cor vermelha terracota e a força da prece. No palco, são montados três pequenos camarins, que podem ser deslocados durante a encenação, também em cor escura.
Na penumbra, as memórias vão se transformando em palavras, e a narrativa ganha corpo, proporções. Há o conteúdo concreto das palavras, mas há também o puro fato de falar, que pode ser libertador. Quando as palavras não conseguem mais expressar, é a vez dos silêncios e das pausas, que também são linguagem e possibilidade criativa para a Cênicas Cia. de Repertório.
POLLYANNA DINIZ, jornalista.